Logo Folha de Pernambuco
Direito e Saúde

Planos de saúde: ANS cria regras para atendimento mais eficaz e humano

Freepik

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) publicou no fim de 2024 a Resolução Normativa nº 623, uma mudança de paradigma no relacionamento entre operadoras de plano de saúde e seus beneficiários. A nova norma revoga a antiga RN 395/2016 e entrou em vigor integralmente em 1.º de julho de 2025, com o propósito de garantir mais transparência, rastreabilidade, celeridade e resolutividade às demandas dos usuários. Mas o que muda, afinal? 

1. Atendimento sem barreiras e com várias portas de entrada

A ANS agora exige que as operadoras ofereçam canais de atendimento eficientes e acessíveis, como telefone, aplicativo, site e presença física — ao menos nas capitais ou regiões com mais de 20 mil beneficiários. Para operadoras de grande porte, o atendimento telefônico deverá funcionar 24h por dia, todos os dias da semana, e com atendimento humano disponível integralmente. Já para as demais, é obrigatório atendimento em horário comercial, com canal específico 24h para urgência e emergência.
Com isso, os usuários não ficam mais presos a caminhos obscuros e burocráticos. A resposta precisa estar ao alcance de um clique — ou de uma ligação com retorno garantido.

2. Protocolo de atendimento com CPF e RG: é rastreável ou não é atendimento

A nova norma também determina que todas as demandas recebidas devem gerar, no ato, um número de protocolo padronizado. E mais: esse histórico precisa ser guardado por até cinco anos. Nada de respostas vagas ou promessas sem registro. Agora, os beneficiários podem acompanhar cada etapa do seu pedido on-line, evitando sumiços ou esquecimentos intencionais.

3. Chega de esperar 21 dias: os prazos encurtaram

Os prazos para resposta às demandas assistenciais foram reduzidos de forma significativa. Confira:
•    Urgência/emergência: resposta imediata;
•    Consultas, exames simples, tratamentos ambulatoriais: até 5 dias úteis;
•    Procedimentos de alta complexidade ou internações eletivas: até 10 dias úteis;
•    Demandas não assistenciais: 7 dias úteis.

Não são mais admitidas respostas genéricas como "em análise" ou "em auditoria". O usuário tem direito a saber, com clareza e justificativa, por que seu pedido foi ou não atendido.

4. Negou? Explique. E o beneficiário pode pedir reanálise

Se houver negativa, a operadora é obrigada a apresentar justificativa por escrito, com citação expressa da cláusula contratual ou do fundamento legal da recusa. Esse documento deve estar disponível para download.

Além disso, o consumidor pode solicitar reavaliação do pedido à Ouvidoria da operadora, que terá até 7 dias úteis para responder, sem exigir nova documentação ou burocracia.

5. Reclamou muito? Vai doer no bolso da operadora

A ANS agora vincula a qualidade do atendimento ao Índice Geral de Reclamações (IGR). Operadoras que mantiverem o índice baixo ganham descontos de até 80% nas penalidades administrativas. Já aquelas com desempenho ruim passam a ser mais vigiadas e penalizadas com multas maiores. O consumidor insatisfeito deixou de ser invisível e passou a pesar diretamente nos resultados financeiros das empresas.

6. Multa nova no catálogo: até R$ 30 mil por descumprimento

Além das sanções já conhecidas, as operadoras passam a correr o risco de multa de até R$ 30 mil exclusivamente por descumprimento das regras de atendimento fixadas pela nova resolução. Um recado claro da ANS: atendimento ruim também é infração grave.

Por que isso importa?

A nova RN 623/2024 pode representar uma virada no tratamento que os planos de saúde dispensam aos seus clientes. Ao garantir protocolos formais, reanálise interna das negativas, prazos objetivos e canais eficazes, a norma combate diretamente as causas mais comuns da judicialização em saúde suplementar.

Para o Judiciário, os impactos também serão visíveis: maior facilidade na prova do descumprimento contratual e parâmetros mais claros para fixação de indenizações. Para os beneficiários, a esperança de que, ao menos no campo regulatório, sua voz finalmente será ouvida e registrada.

Assim, a norma da ANS é mais que uma mudança de regras; é um avanço regulatório que tenta humanizar o atendimento em um cenário cada vez mais dominado por robôs, chats automatizados e inteligência artificial. A modernidade trouxe inúmeras facilidades, mas também impôs desafios emocionais e éticos. O beneficiário que busca ajuda para resolver um problema de saúde não pode ser tratado como um número ou empurrado de um atendente virtual para outro sem escuta real.

O sentimento de abandono, a frustração por não conseguir falar com um ser humano e a angústia de ver seu problema ser engolido por uma máquina são cada vez mais comuns. Por isso, a exigência da presença humana em atendimentos críticos e a revalorização da escuta ativa representam uma tentativa de devolver sensibilidade ao setor.

A nova resolução sinaliza um novo tempo em que a tecnologia deve ser aliada — e não substituta — da empatia. Um atendimento eficiente não é apenas aquele que responde rápido, mas aquele que entende que do outro lado da linha há alguém em sofrimento, buscando acolhimento, solução e respeito.

Veja também

Newsletter