A importância da genética no tratamento do câncer

João Bosco de Oliveira Filho é médico-cientista com mais de 15 anos de experiência em genética e imunologia - Arquivo pessoal

A oncologia moderna exige uma avaliação abrangente do paciente, incluindo a coleta de informações clínicas, laboratoriais, radiológicas, histopatológicas e, mais recentemente, genéticas. Sabe-se hoje que cada tumor é único, e que ter a informação sobre a estrutura genética daquele tumor, naquele paciente, é de suma importância para determinar o tratamento potencialmente mais eficaz. Para uma grande parte dos cânceres, a era de quimioterapia igual para todo mundo ficou pra trás. Fazer o tratamento certo, no tempo certo, pra pessoa certa, é o que chamamos de Medicina Personalizada. 

Nos tumores de pulmão, por exemplo, recomenda-se o estudo de pelo menos 8 genes diferentes, no material de biópsia do tumor. Ter mutação em um gene chamado EGFR indica que o tumor pode responder a uma categoria de drogas chamada inibidores de tirosina-quinase, como gefitinibe e erlotinibe. Já apresentar alterações em outro gene, chamado ALK, indica o uso de remédios como o crizotinibe. Em tumores de intestino com metástase, não se planeja o tratamento sem antes saber se há mutação nos genes NRAS ou KRAS. Nos melanomas, a decisão é tomada após o estudo do gene BRAF. E a lista dos chamados alvos moleculares e suas drogas correspondentes só cresce. 

Esses medicamentos especiais para tratamento do câncer, baseados nas alterações genéticas, são muitas vezes bem mais eficazes que a quimioterapia tradicional, tem menos efeitos colaterais graves e podem ser usados até por via oral, não necessitando de punção venosa. Claro que há variações e especificidades para cada droga, bem conhecidas dos profissionais que fazem uso desses remédios. 
Além da definição da terapia, a genética também pode ser usada para entender a causa do tumor. Cerca de 10% das mulheres com câncer de mama, por exemplo, nascem com alterações de DNA que as deixam muito mais susceptíveis a esse e outros tipos de tumor do que a população geral. Mulheres com mutação no gene BRCA1, como Angelina Jolie, tem uma chance de até 80% de ter um câncer de mama durante sua vida, em contraste com cerca de 10% de chance para uma mulher sem a mutação. 

Fazer o estudo e saber do risco genético precocemente pode mudar radicalmente a forma como a mulher faz a prevenção do câncer de mama. Nos casos de alteração nos genes BRCA1 ou BRCA2, a mulher começa a fazer consultas de rotina com o mastologista aos 18 anos, e começa a fazer ressonância magnética das mamas anualmente aos 25 anos de idade. Aos 30, inicia-se a mamografia anual, além da ressonância, entre outras medidas especiais. Esse seguimento intensivo ou a realização de cirurgias para redução do risco de câncer sabidamente reduzem a mortalidade dessas pacientes. 

Em suma, a genética está hoje intimamente ligada à oncologia, trazendo claros benefícios para o paciente. Deixamos para trás o tempo de aplicar cegamente a mesma terapia para todos e ver quem responde ou não.  Pra nossa felicidade, a era da Medicina Personalizada chegou. 

*Natural de Arcoverde, interior de Pernambuco, João Bosco de Oliveira Filho é médico-cientista com mais de 15 anos de experiência em genética e imunologia, formado em medicina pela Universidade de Pernambuco (UPE). Fez residência em clínica médica pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e especialização e pós-doutorado em imunologia clínica e laboratorial pelo National Institutes of Health, nos EUA. Também tem doutorado em patologia clínica pela Universidade de São Paulo (USP) e Ph.D. em imunologia experimental pela Universidade de Amsterdã. Foi ainda codiretor do setor de Genética e Imunologia do departamento de medicina laboratorial do National Institutes of Health, nos EUA. Tem vasta experiência no uso das novas tecnologias de sequenciamento genético para uso diagnóstico e para a descoberta das causas genéticas das doenças raras e hereditárias. Em 2013, fundou no Recife um dos laboratórios pioneiros na área de genética de alta complexidade no Brasil, a Genomika Diagnósticos, hoje Laboratório Genomika-Einstein, com unidades em vários estados brasileiros.  

 

Veja também

Argentina pede prisão de ministro iraniano por atentado contra Amia
Ataque de 1994

Argentina pede prisão de ministro iraniano por atentado contra Amia

Mega-Sena acumula e vai pagar R$ 6 milhões
Loterias

Mega-Sena acumula e vai pagar R$ 6 milhões

Newsletter