Logo Folha de Pernambuco
Uma Série de Coisas

“The Residence”: Shonda Rhimes transforma a Casa Branca num circo e acerta na bagunça

Com detetive irônica e 157 suspeitos, a nova série da Netflix é divertida e deliciosamente caótica

"The Residence" é a nova série da Netflix com parceria da produtora Shondaland"The Residence" é a nova série da Netflix com parceria da produtora Shondaland - Divulgação/Netflix

“The Residence”, a nova aposta da produtora Shondaland para a Netflix, é de deixar o público preso no sofá. Criada por Shonda Rhimes, a produção se apresenta como um whodunit — aquele tipo clássico de mistério de assassinato com vários suspeitos e uma detetive no centro de tudo — mas, na prática, se comporta como uma novela disfarçada de série policial.

Dirigida por Paul William Davies e com produção da mesma equipe que já sabe contar histórias que prendem a audiência (“Grey’s Anatomy”, “Scandal”, “Bridgerton”), “The Residence” aposta alto. A começar pela premissa: o Chefe do Pessoal da Casa Branca (vivido por Giancarlo Esposito) aparece morto durante um Jantar de Estado, e a consultora excêntrica da polícia, Cordelia Cupp (Uzo Aduba), entra em cena para interrogar nada menos que 157 suspeitos

Uzo Aduba ("Orange Is The New Black"), como Cordelia, é o centro desse furacão de gente nervosa e ambientes chiques. Ela interpreta a detetive com uma ironia divertida, como se estivesse sempre um passo à frente dos homens engravatados. Randall Park ("Veep"), como o agente do FBI que precisa acompanhar (ou pelo menos tentar entender) os métodos pouco ortodoxos da protagonista, é seu melhor contraponto. A química entre os dois dá ritmo à trama e garante que, mesmo nos momentos de puro exagero, a série continue irresistivelmente divertida.

A câmera não para, os personagens gritam, a tensão é artificial — e é justamente aí que mora o charme. A série não tenta disfarçar sua veia melodramática. Ela assume o drama como ferramenta narrativa, flerta com o absurdo e muitas vezes abraça o ridículo. O mistério tem algo de Agatha Christie, o crime não parece fazer sentido, mas no fim funciona.

As escolhas de direção — como filmar uma cena inteira do ponto de vista de um falcão — mostram que o exagero aqui é método. A Casa Branca vira um palco de caos, literalmente. Isso porque a atração principal durante o jantar é um show da cantora australiana Kylie Minogue (e até nisso a série acerta). 

O elenco de apoio é outro trunfo. Ken Marino, Susan Kelechi, Edwina Findley e Giancarlo Esposito são grandes destaques, mesmo esse último entrando no lugar do falecido Andre Braugher, que já havia gravado parte da temporada.

“The Residence” é feita para maratonar, comentar com amigos e rir de si mesma. E no meio da confusão, ela ainda encontra espaço para apontar o dedo para o machismo, o elitismo e as pequenas vaidades que conduzem a máquina do poder. Não é uma obra que pede para ser levada a sério, mas merece ser assistida com atenção. Porque, entre uma reviravolta e outra, ela sabe cutucar feridas reais com um sorrisinho no canto da boca.

Shonda Rhimes entrega aqui uma série policial na Casa Branca com cara de novela americana – não seria a primeira, vindo de uma boa entrega com “Scandal”. E no fim das contas, é isso que torna “The Residence” tão boa de assistir: ela não tem vergonha de ser novela.

*Fernando Martins é jornalista e grande entusiasta de produções televisivas. Criador do Uma Série de Coisas, escreve semanalmente neste espaço. Instagram: @umaseriedecoisas.

*A Folha de Pernambuco não se responsabiliza pelo conteúdo das colunas.

Veja também

Newsletter