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100 anos de Federico Fellini

Dono de clássicos do tamanho de "A Doce Vida", o cineasta italiano fez história ao apresentar uma nova forma de fazer a sétima arte

A Doce Vida A Doce Vida  - Foto: Divulgação

Federico Fellini completaria 100 anos nesta segunda-feira (20), se não fosse o ataque cardíaco que tirou sua vida em outubro de 1993. Quase três décadas após a morte do cineasta italiano, sua obra segue como referência para os amantes da sétima arte. Não é à toa que o termo "felliniano" entrou para o dicionário dos cinéfilos como um adjetivo que evoca uma estética barroca, exuberante e popular, que passou a ser a marca registrada do diretor.

Nascido e criado na cidade de Rimini, na Itália, Fellini foi cartunista antes de enveredar pela arte cinematográfica. Em 1948, chegou a atuar em um filme de Roberto Rossellini, chamado "Il Miracolo", mas logo abraçou a direção com "Mulheres e Luzes", de 1950, co-dirigido pelo diretor Alberto Lattuada. Apesar do fracasso dessa primeira experiência, que deixou o cineasta repleto de dívidas, o reconhecimento não demorou a chegar. Ao longo da vida, ele ganhou quatro estatuetas do Oscar na categoria de melhor filme estrangeiro e uma Palma de Ouro no Festival de Cannes.

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"É inegável que Fellini faz parte do primeiro time do cinema mundial. Falo daqueles cineastas que não só fizeram filmes muito bons, mas que mudaram a linguagem cinematográfica e formularam novas soluções para o cinema. Há quem diga - e eu concordo - que ele está entre os que criaram o cinema moderno, esse que veio após a Segunda Guerra e ao qual continuamos ligados de alguma maneira", comenta o professor Paulo Cunha, curador do Cinema da UFPE.

Para Paulo Cunha, é possível dividir o conjunto da obra em dois momentos distintos. O primeiro - que corresponde às produções em preto e branco - expõe, ainda, um pouco de alinhamento com o neorrealismo italiano, movimento cultural que denunciava as mazelas do pós-guerra. A crítica social e política, assim como a defesa do oprimido, são vistas em filmes como "A Estrada da Vida" (1954), "Noites de Cabíria" (1957) e até mesmo o clássico "A Doce Vida" (1960).

Embora tenha sido um dos roteiristas e também diretor-assistente de "Roma, cidade aberta", marco inicial do neorrealismo, Fellini nunca foi filiado à escola italiana de fato. Contudo, os críticos não o pouparam da acusação de traidor do movimento. "Fellini criou sua própria escola de cinema. Os filmes dele são para quem gosta de criatividade, porque não seguem uma postura tradicional do cinema italiano. Com isso, ele conseguiu expandir e popularizar a cultura cinematográfica italiana no resto do mundo", defende Cristina Presbítero, diretora do Instituto de Cultura Brasil-Itália (ICBI).

Uma nova maneira de pensar o cinema foi sendo moldada aos poucos no trabalho de Fellini, eclodindo de uma vez por todas em "Julieta dos Espíritos" (1965), seu primeiro longa-metragem colorido. A partir dessa obra, que embaralha realidade e imaginação, o diretor aperfeiçoou seu caráter onírico e circense. "O que unifica essas duas fases é uma leitura poética do mundo. Tá tudo muito dentro do imaginário de Fellini. Ele consegue fazer com que o cinema, ao mesmo tempo, discuta questões importantes e apresente uma poesia alegre", afirma Paulo Cunha.

De acordo com o crítico de cinema Alexandre Figueirôa, as marcas do cinema de Fellini são facilmente identificáveis em todos os filmes que carregam sua assinatura. "Embora tenha iniciado sua carreira próximo ao neorrealismo italiano, desde os primeiros filmes já desponta na suas narrativas e elaboração estética uma poética pessoal marcada por um olhar afetivo que introduz a fantasia no horizonte dos fatos reais", diz.

Não é difícil encontrar traços da influência "felliniana" em grandes cineastas contemporâneos, como Woddy Allen e David Lynch. "Um Pedro Almodóvar (diretor espanhol) seria inconcebível sem Fellini. A pegada do jogo de corpo, os personagens aparentemente fora do padrão: isso tudo foi colocado no cinema mundial por meio de Fellini", diz Paulo. No cinema brasileiro, o professor arrisca apontar referências ao diretor italiano nas comédias populares de Guel Arraes ("O auto da Compadecida", "Lisbela e o prisioneiro") e Halder Gomes ("Cine Holliúdy" e "Shaolin do Sertão").

Onde assistir

Para celebrar o centenário de Fellini, o canal de TV pago Telecine Cult exibirá três clássicos do diretor nesta segunda (20): "Noites de Cabíria" (1955), às 16h45, "A Doce Vida" (1960), às 18h55, e "8½" (1963), às 22h. Já o cine clube do ICBI, que está em manutenção no mês de janeiro, vai apresentar ao longo do ano diferentes obras do cineasta. "Roma de Fellini" (1972), "Ginger e Fred" (1986) e "Julieta dos espíritos" (1965) estão entre os filmes previstos na programação, ainda sem datas confirmadas.

 

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