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Aldir Blanc tem coleção reeditada

Um dos maiores letristas da MPB lança uma obra com textos sobre jazz e literatura, além de outra com crônicas para o Pasquim

Deputado federal Tadeu Alencar (PSB-PE)Deputado federal Tadeu Alencar (PSB-PE) - Foto: Arthur de Souza/Folha de Pernambuco

 

O título “O Gabinete do Dr. Blanc”, para uma reunião de textos sobre jazz e literatura, vai além da brincadeira com o fato de Aldir Blanc ser médico. Quem conhece o escritório do letrista e escritor, abarrotado de livros e discos, sabe como são amplos seus gostos e sua erudição.

O volume será lançado no próximo sábado juntamente com a nova edição de “Rua dos Artistas e Arredores”, primeira compilação de crônicas do autor, publicada em 1978. É o início da coleção Aldir 70, da editora Mórula, alusão ao aniversário comemorado em 2 de setembro.

Os 43 artigos de “O Gabinete do Dr. Blanc” foram escritos para o site jornalístico No. (fala-se “no ponto”), que durou de 2000 a 2002. Paulo Roberto Pires e Arthur Dapieve, editores da seção cultural do site (a Babel) e que já tinham visitado muitas vezes a biblioteca/discoteca do artista, acertaram que ele escreveria sobre o que nunca havia escrito. “Foi muito importante para mim”, diz Blanc. “Escrevi, mesmo com alguma insegurança, sobre jazz, literatura policial, outros gêneros literários. Só tremi quando o Pires me ofereceu um livro do Philip Roth no original para resenhar. Como meu inglês é ‘Praça Mauá’ [onde desembarcam marinheiros estrangeiros no Rio de Janeiro], declinei o convite.”

Fase difícil
A resposta à reportagem foi dada por e-mail. Equilibrando-se emocionalmente numa fase difícil, Blanc, após dar algumas entrevistas por ocasião dos 70 anos, preferiu se recolher outra vez.

Em seu apartamento na Tijuca, na região norte do Rio, atravessa os dias lendo de psicanálise a histórias da Segunda Guerra, de biografias a romances policiais. Tem há duas décadas um projeto de livro policial que interrompe com frequência. Cita nomes que admira no gênero: Manuel Vázquez Montalbán –a quem entrevistou para o No.–, Rex Stout, Georges Simenon, Ed McBain, Henning Mankell, Fred Vargas, Ian Rankin, Lawrence Block e Luiz Alfredo Garcia-Roza.

Como letrista, produziu algumas das obras mais conhecidas da música brasileira, tais como “O Bêbado e a Equilibrista”, “O Mestre-sala dos Mares”, “De Frente pro Crime”, “Dois pra Lá, Dois pra Cá” (parcerias com João Bosco) e “Resposta ao Tempo” (com Cristovão Bastos). Já escreveu letras citando o contrabaixista Charles Mingus e o trompetista Miles Davis. Mas, até o convite de Pires e Dapieve, nunca demonstrara publicamente sua paixão pelo jazz, nascida no início da adolescência.

Foi a época em que começou a tocar bateria. “Escutar a beleza dos improvisos e até cantarolar umas letras malucas em cima deles dá grande agilidade para o letrista. Ele tem de ser como o contista ideal do Dalton Trevisan: escutar atrás da porta, ler bula de remédio, ouvir de tudo entre Manezinho Araújo e Stravinsky e batucar muito”, receita.

Hoje em dia, mesmo tendo parado de beber (ou por causa disso), não consegue escutar música sem se emocionar demais. “Ouço o Paulinho da Viola cantando o “Hino Nacional” e choro de assustar a família.” Sua maneira de tratar o jazz é como trata qualquer assunto. Possui, como Pires destaca no prefácio, “a habilidade em aproximar referências de mundos díspares, níveis diferentes de cultura, os chamados ‘bom’ e ‘mau’ gosto”.

Como exemplo, um trecho no qual imagina o saxofonista John Coltrane, que morreu aos 40, chegando aos 70 anos: “Parabéns, Trane Train, com 70 velinhas em bolo confeitado, cascata de camarão, tio fanho contando piada de papagaio, desquitada que fuma recebendo santo quando passam a mão na bunda dela. Muitos anos de vida.”

Memórias
Esse estilo transborda em “Rua dos Artistas e Arredores”, 52 capítulos com as crônicas que Blanc escreveu (quase todas) para o jornal “O Pasquim”. São memórias, recriadas em tom hiperbólico, de seus tempos de criança em Vila Isabel (Zona Norte do Rio de Janeiro).

“Para mim, que vivi o período intensamente, todas aquelas histórias estão vivas.”Mais crônicas foram reunidas no livro “Porta de Tinturaria” (1981). Em 2006, a editora Agir juntou os dois volumes num só (“Rua dos Artistas e Transversais”), acrescentando textos posteriores. A Mórula voltou a separá-los. E pretende lançar também o esgotado “Vila Isabel - Inventário da Infância” (1996).

 

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