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Cinemas de rua lutam para não seguirem apenas na memória

Ocupação do Cine Olinda por manifestantes reacende discussão em torno dos cinemas de rua de Pernambuco que estão abandonados

Cena de Nasce uma EstrelaCena de Nasce uma Estrela - Foto: Divulgação

Em uma das cenas de "Aquarius", filme do pernambucano Kleber Mendonça Filho, a personagem Clara (Sonia Braga), aponta para uma loja de móveis no Centro do Recife e diz, com saudade e tristeza, que ali era um cinema de rua (o Moderno). Enquanto o audiovisual do Estado vem alcançando uma trajetória vitoriosa, com obras como "A História da Eternidade", de Camilo Cavalcante, e "Boi Neon", de Gabriel Mascaro, as salas de cinema pernambucanas seguem um caminho oposto: o do esquecimento.

 

Enquanto o São Luiz, inaugurado em 1952 e tombado em 2008 como monumento histórico pelo Governo do Estado, hoje é celebrado por resistir, com arquitetura art déco e equipamento de última geração, outras salas permanecem apenas na memória. O circuito de cinema de rua perdeu, entre outros, o Pathé (primeira sala, inaugurada em 1909), o Art Palácio / Trianon (1940) e o Cine Glória (1926); locais que ampliavam o potencial intelectual do circuito e movimentavam o Centro do Recife, aumentando o fluxo de pessoas ocupando espaços urbanos.

Em outros países, como na Europa, o movimento foi semelhante. Primeiro, surgiram os complexos de cinemas. Mais recentemente, foi a vez dos multiplexes, que se instalaram em bairros nobres do Recife, em shoppings de Boa Viagem e Casa Forte. "O cinema sempre teve um papel social importante. Tirar os cinemas do Centro das cidades foi uma forma de matar os dois", disse Marin Karmitz, distribuidor romeno, em entrevista ao jornal Público. "Foi isso que aconteceu na França. O primeiro multiplex surgiu em Toulon, fora da cidade, e os cinemas no Centro fecharam. As lojas também. E o centro da cidade tornou-se um lugar sem lei, de medo, de angústia", reflete. O que também, infelizmente, também ocorre na capital pernambucana, com a decadência dos endereços para moradia no Centro e os seus "cinemas-fantasmas".

Cine Olinda, Carmo (Olinda)

Duas salas de cinema em Olinda seguem fechadas: o Cine Duarte Coelho e o Cine Olinda. Este último é um caso delicado. Inaugurado em 1911, o espaço fechou em 1965. O Governo do Estado, através da Fundarpe, avisou que tem R$ 2 milhões destinados para a reforma. "Houve uma conversa com a Prefeitura [de Olinda], que fez a sugestão de que os recursos que já existiam do Estado e estavam disponíveis para Prefeitura para o PAC das Cidades Históricas fosse destinado para concluir as obras. Então, o recurso foi transferido", detalha Márcia Souto, presidente da Fundarpe, que irá executar a requalificação. Segundo ela, falta concluir o termo de referência da licitação, apontando o que falta ser feito na obra. "A Secretaria de Patrimônio e Cultura de Olinda precisa enxugar o orçamento, para caber no orçamento da Fundarpe", explica Renata Borba, superintendente do Iphan em Pernambuco. A construtora responsável, até então, fez apenas 40% das obras, mas ocorreu um destrato.

Como forma de cobrar a reabertura do equipamento, o movimento #OcupeCineOlinda promoveu, no dia 30 de setembro, um encontro com representantes da Fundarpe, da Prefeitura de Olinda e do Iphan, além de cerca de 300 espectadores. Durante o debate, incomodados com a ausência de metas e prazos, participantes (não ligados aos organizadores) derrubaram tapumes, invadiram o lugar e passaram a ocupar a sala, onde já exibiram mais de 10 filmes, entre longas e curtas-metragens.

"A nossa primeira pauta é reabertura do cinema em no máximo um ano. A segunda é que, durante a obra, fiscalizada por um comitê popular, a gente já possa ocupar o cinema. Ele está pronto. Precisa de pouco para abrir e nós já estamos usando", diz Pethrus Tiburcio, integrante do movimento #OcupeCineOlinda. "Estamos realizando exibições, fazendo assembleias e oficinas, além de negociar com o poder público", detalha.

Cine Duarte Coelho (Varadouro, Sítio Histórico de Olinda)

Segundo a Prefeitura de Olinda, o projeto de restauração do Cine Duarte Coelho - que foi inaugurado em 1942 e encerrou suas atividades em 1980 - foi aprovado junto ao PAC das Cidades Históricas. "A gestão municipal aguarda liberação de recursos federais para realização de processo licitatório e início das obras", explicou nota da Secretaria de Comunicação de Olinda.

Cine Teatro do Parque (rua do Hospício, 81, Boa Vista)

Fundado em 1915, foi fechado em 2010. "Três anos depois, em 2013, a atual gestão fez um levantamento do que era necessário ser restaurado e reformado. Em 2014, por meio do Gabinete de Projetos Especiais, foi elaborado projeto de restauração e reforma do Teatro do Parque, realizada a licitação da obra que, naquele mesmo ano, foi iniciada", explica o Gabinete.

"A primeira etapa, já realizada, sanou os problemas encontrados na estrutura da edificação, como infiltrações que comprometiam o prédio. Custou R$ 1 milhão e foi executada com recursos próprios. Foram trocados madeiramento, telha, calhas. As paredes estavam estufadas, já que as antigas instalações elétricas estavam enferrujadas. Por isso, toda a tubulação foi substituída, além das instalações hidrossanitárias. Foi revisada a drenagem de todo o equipamento", detalha.

A segunda fase das obras está em processo de licitação e o valor da intervenção será de R$ 12 milhões. "O prazo para o término do restauro e reforma é de um ano e meio", ressalta.

Cine AIP (avenida Dantas Barreto, 576, Santo Antônio)

Inaugurado na década de 1960, ocupa o 13º andar do edifício da Associação de Imprensa de Pernambuco (AIP), na Dantas Barreto. Na última visita feita pela Folha de Pernambuco, em 2014, o ambiente estava com instalações em péssimo estado. O imóvel foi desapropriado em 2010 e segue inativo desde o início de 2000. "A gente conseguiu uma emenda parlamentar de R$ 250 mil. Dava para fazer a parte elétrica. Como o dinheiro tinha que vir através do Estado, a Secretaria de Turismo passou dois anos para corrigir o projeto. E não o fez. O valor foi devolvido para a União, em maio", diz Múcio Aguiar, presidente da Associação.

Segundo Múcio, a rede elétrica é mais urgente. "Se tivermos entre R$ 500 e R$ 700 mil, poderemos reinaugurar no final de 2017", destaca. "Os deputados têm até o dia 20 para apresentar suas emendas. Conversei sobre a importância do Cinema AIP. Edilson Silva e Cadoca se mostraram receptivos", explica Múcio. 

Museu da Imagem e do Som de Pernambuco - Mispe (Rua da Aurora, 463/469, Boa Vista)

O objetivo do Museu da Imagem e do Som de Pernambuco (Mispe) era documentar e divulgar a memória cultural do Estado. Fundado em 1970, está fechado para reformas desde 2008. Ainda não há data de reabertura, mas Márcia Souto adianta que já estão "com o projeto concluído". "Estamos, inclusive, com o orçamento fechado. Hoje ele está orçado em R$ 3 milhões e 199 mil, só que isso ainda será atualizado quando formos para a licitação", destaca a presidente da Fundarpe. O recurso, que ainda não está garantido.

*Na edição desta segunda-feira (10), o caderno Diversão&arte apresentará uma matéria detalhando o momento atual do Museu da Imagem e do Som (Mispe).

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