Com mais gente em casa, cresce acesso irregular à TV a cabo
Diretor do Grupo Globo alerta para riscos de aparelhos 'zumbis'
A pirataria no audiovisual aumentou de “forma absolutamente extraordinária com a internet”, diz Marcelo Bechara, diretor de Relações Institucionais e Regulação do Grupo Globo.
Antes, lembra, para ver um filme pirata era preciso comprar a cópia no camelô. Hoje, a pirataria é feita de forma escalonada, dentro da casa das pessoas, independentemente de classe e renda.
Segundo ele, 27,4% dos acessos à TV paga são feitos por meios ilegais. Em 2019, as perdas chegaram a R$ 16 bilhões, com redução de R$ 2 bilhões de receita tributária e contribuições para o Ecad (de direito autoral).
— Se a pirataria fosse uma operadora, seria a maior TV a cabo do país — diz Bechara.
Na avaliação de Ygor Valerio, sócio do Cesnik, Quintino, Salinas, Fittipaldi & Valerio Advogados, há um agravante no combate ao mercado ilegal no setor audiovisual: a qualidade dos produtos falsificados.
— É uma cópia perfeita do produto lícito, o que raramente ajuda na luta contra a pirataria. Na pandemia, esse tipo de mercadoria ficou mais disponível, e a demanda aumentou. A pirataria surfou na onda do conteúdo digital, chegando com mais força à casa das pessoas — afirma Valerio.
As caixinhas que conseguem roubar sinal do satélite e acessar ilegalmente os canais por assinatura se popularizaram. Recentemente, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) considerou que todos os aparelhos que não forem homologados por ela são considerados piratas, o que afeta as tais caixinhas. Mas, ainda assim, elas são vendidas em marketplaces na internet.
— Estão colocando dentro da casa um terminal zumbi, que vai armazenando dados da sua máquina, até imagens de pornografia infantil, fazendo mineração de criptomoeda, usando o computador para ataques em rede. Você está dando a chave do cofre para o bandido — alerta Bechara.
O diretor do Grupo Globo cita iniciativas que vêm dando certo em outros países como Portugal, onde já se consegue bloquear o sinal do aparelho, seja caixinha para TV, aplicativo ou site, num movimento que uniu canais de esporte e ligas de futebol.
É um modelo que vem sendo copiado pela Inglaterra e Espanha. Na Indonésia, segundo Bechara, houve uma inversão de curva no consumo entre ilegal e lícito.
Valerio também cita avanços em relação à conscientização da população e a marcos regulatórios. A propagação de notícias falsas, diz, veio como um “resultado incômodo” do “enorme desrespeito à propriedade intelectual”, o que acabou mudando a percepção das pessoas sobre a necessidade de regulação da web:
— Houve uma mudança nessa visão sobre a internet, em razão do que vem acontecendo com a disseminação das fake news.
E as gigantes de tecnologia começam a ser obrigadas a remunerar os produtores de conteúdo pelas notícias que reproduzem, segundo a diretiva europeia de 2019, lembra Valerio:
— Estamos, no momento, indo dessa visão de liberdade absoluta na internet e para uma regulação mais inteligente.