Crítica: efeitos de 'Projeto Gemini' agradam, mas roteiro é fraco
No filme dirigido por Ang Lee, que estreia no Brasil nesta quinta-feira, personagem de Will Smith é perseguido por sua versão 27 anos mais jovem
Projeto Gemini (Gemini Man, 2019) vem sendo desenvolvido há alguns anos, e passou pelas mãos de diversos estúdios até parar na produtora Skydance e da Paramount Pictures, que tem abraçado algumas ideias bem diferentes do que o mercado cinematográfico tem apostado recentemente. O próprio filme em si já vem de uma ideia datada: o roteiro foi desenvolvido no início dos anos 2000 e nomes como Sylvester Stallone, Arnold Schwarzenegger, Harrison Ford, Brad Pitt, Tom Cruise e Nicolas Cage foram cotados para viver o protagonista em duas idades diferentes, até chegar em Will Smith. Mas, claro, a tecnologia na época não permitia que um assassino que tem que enfrentar outra versão de si mesmo fosse parar nas telas, mas agora, que rejuvenescer atores e criar avatar totalmente digitais são tarefas quase que rotineiras na indústria cinematográfica, o filme pode ser lançado.
A trama acompanha o infalível assassino de aluguel Henry Brogan (Will Smith), que enfim considera a aposentadoria após anos de matança. Porém, após receber informações confidenciais de um amigo, ele vira alvo de sua antiga agência, a Gemini, com um perseguidor que é seu clone. Dessa forma, Henry contará com a ajuda da agente Danny (Mary Elizabeth Winstead) e seu colega Baron (Benedict Wong) para descobrir os mistérios que estão por trás do plano da Gemini.
Novamente apostando no High Frame Rate, modo de exibição que troca os 24FPS por 120FPS (mas que só será exibido no Brasil em 60FPS, devido à capacidade técnica), o cineasta Ang Lee e o diretor de fotografia Dion Beebe captura grandes imagens graças ao troca-troca de paisagem da narrativa, e que ganham mais nitidez e fluidez graças à imagem mais “acelerada”. É um efeito triplicado nas cenas de ação, especialmente na ótima perseguição de motos em que Henry é perseguido por seu clone, e que ganha mais fôlego e intensidade graças ao frame rate, e também ao uso eficiente de 3D.
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O que nos leva ao outro grande atrativo técnico de Projeto Gemini: o Will Smith digital. É mais um avanço na tecnologia de criar rostos fotorrealistas, com uma criação completamente CGI do rosto de Smith, que atuou com captura de performance. A criação funciona na maior parte do tempo, especialmente em cenas mais escuras, mas é difícil não notar que estamos diante de um boneco “irreal”, especialmente nos movimentos da boca, área mais difícil para animadores.
Porém, Lee mostra-se limitado em cenas de luta corporal gravadas e enquadradas da mesma forma, e que inexplicavelmente limitam-se a planos fechados e sem qualquer decupagem mais criativa, e que empalidecem diante daquela ágil perseguição. E a coreografia acaba aproximando o espectador graças à velocidade do HFR. Assim, a tecnologia 3D+ que Projeto Gemini entrega realmente se mostra eficaz para ajudar o espectador a se sentir e fazer parte do filme, e ainda tentar curtir a experiência visual que o longa oferece.
Mas o maior problema de Projeto Gemini está no roteiro. Parece que os produtores focaram tanto em desenvolver os efeitos visuais que esqueceram de trabalhar no roteiro que deixa muito a desejar. Escrito em três mãos pelos roteiristas David Benioff, da série de sucesso Game Of Thrones, Billy Ray que trabalhou no Operação Overload, e por Darren Lemke de Goosebumps: Monstros e Arrepios, o texto de Projeto Gemini não se sustenta como um longa de ação, e nem como um drama mais consistente. O ritmo dos acontecimentos deixa a desejar e o roteiro é derivativo, pouco empolgante, resultando num clímax pouco inspirado e tem uma conclusão totalmente insatisfatória.
Brogan, Danny e Baron, o trio formado para desvendar os mistérios da trama, não tem interação real ou carismática, e então fica evidente que os personagens são realmente rasos e sem personalidade alguma. Com a entrada do clone na história, todo o conflito se resolve na pancadaria e é completamente desperdiçado por soluções fáceis e viradas de chave na motivação dos personagens - que estão sempre atrás de frases óbvias como “eu não aguento mais enfrentar os fantasmas do passado” ou “eu não consigo me olhar no espelho”. Com a exceção de Clive Owen como o vilão Clay Verris, o elenco não tem tanta atenção. O chefe da Gemini é cruel e impiedoso, mas, ao mesmo tempo, tem um laço paternal com o clone, que rende momentos interessantes, mas ainda é pouco comparado ao que o subestimado Owen consegue fazer.
Projeto Gemini não é a premissa mais original de Hollywood, que sofre pela escrita e execução do texto creditado a Darren Lemke, David Benioff e Billy Ray. É o tipo de história que soa datada e que falha em suas tentativas frustradas de aprofundar conceitos de ficção científica ou as relações mais básicas entre seus personagens.