Documentário mostra inquietações de estudantes às vésperas do Enem
Filmado em 2018, 'Atravessa a Vida' mostra a rotina dos alunos de uma escola pública em Sergipe
Em meio a pedidos de novo adiamento, a edição de 2020 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) começa a ser aplicada a partir deste domingo. Principal porta de entrada para o ensino superior do Brasil, a avaliação representa um momento crucial na vida de milhares de jovens. É o que mostra o documentário “Atravessa a Vida”, do diretor João Jardim, que estará disponível a partir de fevereiro no catálogo do Globoplay.
Responsável por filmes como “Getúlio”, “Janela da Alma” e “Lixo Extraordinário”, o cineasta acompanhou a rotina de uma turma do 3º ano do ensino médio em 2018, antes da pandemia de Covid-19 impor o ensino a distância. Os protagonistas são os estudantes do Centro de Excelência Dr. Milton Dortas, localizado em Simão Dias, cidade de 40 mil habitantes no interior de Sergipe.
A temática escolar não é uma novidade no trabalho de João Jardim. Com o documentário “Pro Dia Nascer Feliz” (2005), o cineasta já havia mostrado as diferentes realidades em colégios públicos e particulares de três estados. Agora, a câmera se volta para os últimos meses dos alunos dentro da instituição de ensino, na transição entre a adolescência e a fase adulta.
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“Esse filme nasceu da junção entre a vontade de voltar a fazer um trabalho no ambiente de uma escola e a percepção do quanto o Enem é relevante na vida das pessoas hoje em dia. Ele é a perspectiva real de que os jovens do interior brasileiro, ou até das periferias, conseguiriam entrar na faculdade. Há também o aspecto subjetivo do amadurecimento. Os alunos saem do colégio e, a partir daí, é outra etapa da vida que começa. Acho que esse momento é muito rico emocionalmente”, aponta.
Com cerca de mil estudantes matriculados, a escola que serve de cenário para o longa-metragem e vista por João como um recorte da realidade do sistema de educação brasileiro. “É uma escola que tem as mesmas dificuldades de todas as escolas públicas do Brasil, com toda a sua precariedade. Mas, ao mesmo tempo, é um lugar rico de professores que querem acertar e alunos que querem progredir. Conheci jovens com muito potencial e vontade de crescer”, comenta.
Usando como principal referência o longa norte-americano "High School" (1968), de Frederick Wiseman, “Atravessa a Vida” abraça a proposta do cinema direto, que prega a mínima interferência possível do diretor na cena. Desta forma, o filme acompanha os problemas resolvidos pela diretora, a interação entre os alunos no horário de intervalo e os debates levantados pelos professores em sala de aula, trazendo à tona assuntos como pena de morte, aborto, suicídio e Ditadura Militar.
Ao longo de três meses, o diretor e sua equipe filmaram na escola em semanas intercaladas. A recepção inicial de alunos e funcionários, segundo João, foi com muita desconfiança. “Eles se perguntavam o que é que a gente estava fazendo filmando o tempo todo. Com o tempo, fomos ganhando a confiança deles. Eles foram se revelando, começaram até a se divertir com a gente e a interagir mais. Mas nada que está no filme foi encenado para a câmera. Tudo o que registramos foi o que eles quiseram realmente compartilhar com a gente”, afirma.
Às vésperas de uma prova que pode determinar seus futuros, os adolescentes expõem aflições, inseguranças, sonhos e conquistas. Há apenas três entrevistas no longa, embora a equipe tenha ouvido 12 alunos no total. A ausência do pai nas famílias é um tema presente em todas as conversas. “Não era a ideia inicial inserir as entrevistas no documentário, mas fomos vendo que era importante destacar que aqueles alunos estavam ali perseverando e sendo criados pelas mães. Era necessário ter esse aspecto da vida familiar deles, porque de alguma maneira isso influencia muito na preparação para o Enem e até na visão que eles têm da escola”, defende.
Produção da Copacabana Filmes e Fogo Azul Filmes, “Atravessa a Vida” teve sua estreia mundial no 25º Festival É Tudo Verdade, no ano passado. O longa já está em cartaz em algumas salas de cinema espalhadas pelo País desde a última quinta-feira, mas ainda não há previsão de lançamento no Recife. Além de passar pelo streaming, a obra também será exibida na TV, pela GloboNews, em data ainda a ser divulgada.