Ter, 09 de Dezembro

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Concentração de riqueza no mundo é a maior em 30 anos

Dez porcento mais ricos têm 75%, e metade mais pobre fica com 2%

Desigualdade cresce no mundo nos últimos trinta anos Desigualdade cresce no mundo nos últimos trinta anos  - Foto: Pixabay

A desigualdade de riqueza no mundo atingiu o maior nível em três décadas. Os 10% mais ricos da população detêm hoje 75% de toda a riqueza global, enquanto a metade mais pobre fica com apenas 2%.

Quanto mais se sobe na pirâmide, a concentração é maior: menos de 60 mil pessoas — um grupo seleto que pertence ao 0,001% mais ricos, que caberia dentro de um estádio de futebol — têm três vezes mais riqueza do que 2,8 bilhões de pessoas.

É o que apontam os dados da terceira edição do Relatório Mundial sobre a Desigualdade 2026, elaborado por um grupo de pesquisadores da rede World Inequality Lab, liderado pelo economista francês Thomas Piketty.

O estudo considera riqueza como o patrimônio líquido das pessoas. Isso inclui a soma de ativos financeiros, como ações e títulos, e não financeiros, como imóveis e terras, já descontadas as dívidas.

A concentração também aparece quando se observa apenas a renda, e não o patrimônio. Nesse caso, os 10% mais ricos do mundo ficam com 53% da renda global, enquanto a metade mais pobre recebe apenas 8%. Já os 40% do meio detêm 23% da riqueza e 38% da renda global.

Concentração acelera entre os muito ricos
O relatório mostra que, nos últimos 30 anos, a riqueza cresceu em ritmo muito mais acelerado entre aqueles que já estavam no topo. A parcela da riqueza pessoal detida pelo 0,001% mais rico aumentou de 3,8% em 1995 para 6,1% em 2025.

A fatia dos 50% mais pobres, por sua vez, teve um leve avanço no fim dos anos 1990, mas está estagnada desde o início dos anos 2000 em torno de 2%.

Os economistas também analisaram como as políticas públicas podem reduzir a desigualdade, e identificaram que a tributação progressiva, mas especialmente as transferências de renda, tiveram papel pra minimizar parte da desigualdade considerando dos anos 1980 até hoje.

Efeito da tributação e políticas sociais
Na Europa, América do Norte e Oceania, impostos e programas redistributivos reduziram a desigualdade em mais de 30%. Na América Latina, políticas adotadas após os anos 1990 também provocaram avanços.

Segundo o estudo, na Europa, América do Norte e Oceania, impostos e programas de transferências reduziram consistentemente as disparidades de renda em mais de 30%. Na América Latina, as políticas redistributivas introduzidas após a década de 1990 também provocaram avanços.

Mas o efeito tem limites, conforme aponta o estudo. As políticas redistributivas não conseguiram compensar o aumento acelerado da riqueza no topo da pirâmide, aonde a tributação não chega.

Ultrarricos escapam da progressividade
O relatório mostra que, na prática, os bilionários e centimilionários pagam proporcionalmente menos impostos do que famílias com rendas muito inferiores. As alíquotas efetivas sobem para a maior parte da população, mas despencam entre os ultrarricos.

“Esse padrão regressivo priva os Estados de recursos para investimentos essenciais em educação, saúde e ação climática. Também prejudica a justiça e a coesão social, diminuindo a confiança no sistema tributário”, dizem os autores.

Em conversa com jornalistas, Piketty alertou para a piora da desigualdade nos próximos anos, especialmente no Sul Global. Ele lembrou que muitos países pobres gastam mais com juros da dívida do que com educação e saúde somadas. E, tanto países ricos quanto emergentes, têm evitado aumentar a tributação sobre os grupos mais ricos.

— Precisamos fazer com que os grupos mais ricos contribuam, particularmente no Norte, mas também no Sul, onde temos contribuintes bastante ricos no Brasil, na África do Sul e na Índia que também precisam contribuir. Essa é a única solução — avaliou.

O economistas francês observou que algumas iniciativas vindas do Sul Global tentaram chamar atenção para o tema. Ele lembrou que o Brasil, sob a presidência do G20 no ano passado, pressionou por um imposto mínimo global sobre a riqueza, enquanto a África do Sul sugeriu a criação de um painel internacional sobre desigualdade.

— E a realidade é que os países europeus não responderam de fato. Certamente havia alguns menos hostis do que Donald Trump, o que é uma boa notícia, mas, no fim das contas, tanto a Europa quanto os EUA simplesmente ignoram essa demanda vinda do Sul Global — destacou.

Imposto de 3% sobre bilionários levantaria US$ 750 bi por ano

O relatório apresenta três propostas de tributação global sobre altas fortunas. A mais moderada, que prevê um imposto anual de 3% sobre cerca de 100 mil bilionários e milionários, calcula que poderia ser arrecadado US$ 750 bilhões por ano, valor equivalente a todo o orçamento global de educação de países de baixa e média renda.

Num cenário mais modesto, um imposto de 2% sobre patrimônios acima de US$ 100 milhões já seria capaz de trazer uma receita de US$ 503 bilhões por ano, o equivalente a 0,45% do PIB mundial, destacam os economistas.

Já uma tributação de 5% arrecadaria, por ano, US$ 1,3 trilhão, o que representa 1,11% do PIB mundial.

Segundo os autores, tributar uma parte das fortunas daria aos governos mais capacidade fiscal para enfrentar desafios estruturais — seja da educação, saúde ou até transição climática —, sem aumentar o ônus sobre a classe média ou os mais pobres.

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