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Entenda por que disputa pela Warner continua mesmo após anúncio da compra por Netflix

Gigante do streaming havia superado oferta das rivais, mas a Paramount resolveu contra-atacar

A Netflix comunicou que "nada muda" após comprar WarnerA Netflix comunicou que "nada muda" após comprar Warner - Foto: Patrick T. Fallon/AFP

Três dias depois de a Netflix anunciar a compra da Warner Bros.Discovery por US$ 82,7 bilhões (incluindo a dívida), houve um novo plot twist no mercado de mídia. A Paramount, do bilionário David Ellison, considerado próximo do presidente dos EUA, Donald Trump, fez uma oferta hostil de US$ 108,4 bilhões (considerando injeção de recursos e dívida) pela empresa.

Uma oferta hostil significa um lance não solicitado, que não tem apoio da diretoria ou do Conselho de Administração da companhia alvo da proposta. Agora, os acionistas da Warner terão até 8 de janeiro para avaliar se aceitam ou não.

Existem diferenças substanciais entre as propostas. A Netflix se dispôs a comprar o estúdio de cinema e a divisão de streaming, a HBO Max. Para que a operação seja concluída, a Warner teria até o terceiro trimestre de 2026 para se dividir em duas empresas. Uma parte dela ficaria de fora do negócio e reuniria ativos como os canais de TV a cabo CNN e TNT. Já a proposta da Paramount engloba a empresa como um todo.

Seja qual for o caminho escolhido pelos acionistas, a operação será submetida ao aval de órgãos reguladores. No caso da proposta da Netflix, as preocupações giram em torno da concentração no mercado de streaming. A Netflix é a maior plataforma em volume de assinantes, com mais de 300 milhões globalmente. A HBO Max conta com 128 milhões. Uma união com a Paramount neste cenário representa uma concentração de mercado menor, já que seu serviço de streaming tem 79,1 milhões de usuários.

Na proposta da Paramount, porém, há outros fatores que serão alvo do escrutínio de reguladores: o negócio combinaria dois grandes estúdios de cinema de Hollywood, duas empresas de TV a cabo e duas redes de notícia (CNN da Warner e CBS News da Paramount).

Era esperado, diz Netflix
A perspectiva de uma guerra de ofertas pela companhia afetou as ações da Netflix, que caíram 3,4% ontem. Já os papéis da Paramount subiram 9%, enquanto os da Warner avançaram mais de 4%. Executivos da Netflix vieram a público assegurar investidores de que avaliam que sairão vencedores da disputa. Ted Sarandos e Greg Peters, co-CEOs da Netflix, disseram que estão “extremamente confiantes” de que o negócio será aprovado.

E acrescentaram que o contra-ataque da Paramount era “completamente esperado”, mas que a Netflix sairia à frente na visão dos reguladores. Eles também reiteraram o compromisso de manter os lançamentos de filmes da Warner nos cinemas.

“Temos um acordo fechado e estamos incrivelmente felizes com o acordo. Ele é ótimo para os acionistas. Ótimo para os consumidores. Avaliamos que é um ótimo meio de criar e proteger empregos na indústria do entretenimento”, disse Sarandos.

A oferta da plataforma foi recebida com críticas e ceticismo entre roteiristas, diretores, produtores e atores de Hollywood. O estúdio da Warner responde por 25% da bilheteria nos cinemas. Embora a Netflix já tenha lançado filmes nos cinemas, essa não é considerada uma parte central de sua estratégia, mais focada em aumentar as horas que espectadores passam no serviço de streaming.

Em suas declarações, Ellison procurou tirar partido da rejeição de integrantes da indústria de Hollywood ao negócio.

“Acreditamos que nossa oferta criará uma Hollywood mais forte”, disse Ellison, CEO da Paramount, em comunicado. “Está no melhor interesse da comunidade criativa, dos consumidores e da indústria de cinema.”

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Pouco antes de a Netflix anunciar que havia fechado um acordo, a Paramount enviou uma carta a David Zaslav, CEO da Warner Bros. Discovery, segundo o New York Times, alegando que a empresa conduziu um processo de venda “míope” que “favorece um único comprador”.

A Warner Bros. Discovery respondeu dizendo que cumpriu “total e rigorosamente” suas obrigações com os acionistas. A empresa conduziu um processo de licitação de semanas que também atraiu interesse da Comcast, a companhia de cabo dona da NBCUniversal.

Em teleconferência ontem, Ellison disse que a Paramount decidiu levar sua oferta diretamente aos acionistas depois que a Warner não respondeu a suas manifestações anteriores. O bilionário criticou as chances de a oferta da Netflix ser aprovada:

“Dizer que streaming não é mercado é como olhar para o segmento de bebidas e dizer que Coca-Cola e Pepsi podem se fundir porque Budweiser é um substituto”, afirmou.

Fator casa branca
Se a oferta da Netflix fracassar por falta de aval de órgãos reguladores, a Netflix precisa pagar uma multa de US$ 5,8 bilhões à Warner. Se a Warner aceitar uma oferta da Paramount ou de qualquer outro concorrente, terá de pagar US$ 2,8 bilhões à Netflix.

Além da análise sobre concentração de mercado, o negócio deverá levar em conta ainda o fator Trump. O presidente dos EUA, que durante anos se especializou em jogar rivais uns contra os outros no programa O Aprendiz, tenta dissimular qual lado favorece na operação.

“Nenhum deles é exatamente um grande amigo meu”, disse a repórteres na Casa Branca ontem. “Quero fazer o que é certo. É muito importante fazer o que é certo”.

Em evento no domingo, Trump fez elogios a Sarandos, da Netflix, mas alertou que uma vitória da plataforma “poderia ser um problema”. O mandatário manifestou preocupação de que o acordo poderia criar uma participação de mercado desproporcional para a Netflix, ecoando os argumentos que a Paramount já tornou públicos.

Ontem, porém, aproveitou para criticar a Paramount a respeito do programa “60 Minutes”, da CBS, que exibiu uma entrevista com uma parlamentar republicana.

“Eles não são melhores do que os donos anteriores”, escreveu Trump em sua rede social sobre o acordo que viabilizou a compra da CBS pela Paramount. “Desde que compraram, o 60 Minutes ficou ainda PIOR!”, escreveu Trump, recorrendo ao já tradicional expediente de postar mensagens com palavras em maiúsculas.

Reportagem do New York Times publicada após a oferta da Netflix afirmou que parte dos empregados da CNN temia mudanças na linha editorial caso a rede fosse adquirida pela Paramount, dona da CBS e da CBS News. A combinação das redes de notícias era considerada uma saída lógica se a oferta de Ellison prevalecesse.

Ellison, junto com seu pai, o fundador da Oracle, Larry Ellison, mantém uma relação amigável com o Trump, que os elogiou repetidamente neste ano. Os Ellison também demonstraram abertura para usar seus ativos de mídia para impulsionar alguns dos interesses de Trump; recentemente, a Paramount mostrou interesse em um acordo de distribuição para um novo filme da franquia “A Hora do Rush”, um dos favoritos do presidente.

Árabes e genro de Trump
Enquanto a oferta da Netflix envolve um empréstimo de US$ 59 bilhões, a oferta da Paramount é garantida pela família Ellison e pela RedBird Capital, além de apoio a financiamento via Bank of America, Citi e Apollo Global Management.

Além disso, conta com a perspectiva de apoio financeiro dos fundos soberanos da Arábia Saudita, Abu Dhabi e Catar, além da Affinity Partners, firma de private equity (compra de participações) do investidor Jared Kushner, genro de Trump. Todos os grupos teriam concordado em renunciar a direitos de voto, segundo a Paramount, o que poderia facilitar o caminho para um acordo em Washington.

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