Guerra do delivery continua: entenda a nova "treta" do iFood, dessa vez com restaurantes
Queixas vão de taxas para processar pagamento ao direcionamento de pedidos para entregadores exclusivos
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) acionou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra o iFood, alegando que a plataforma executa práticas anticompetitivas.
No pedido, a entidade alega que o iFood deixou de ser um app de entregas para se tornar um “ecossistema digital fechado”, onde utiliza da participação de 80% no mercado de delivery para “impor seus próprios serviços de pagamentos, logística, crédito e, mais recentemente, soluções para o atendimento presencial nos salões dos restaurantes”.
A denúncia ao Cade foi feita no dia 25. A principal queixa da associação diz respeito às taxas por transação no app, o que impacta o caixa de bares e restaurantes. A Abrasel defende que o iFood faz venda casada ao obrigar que estabelecimentos comerciais usem sua solução de processamento de pagamentos com cartão nos pedidos feitos na plataforma. Ou seja, a cada vez que o usuário passa o cartão em um pedido no app, o processamento do pagamento gera taxa que é paga pelo restaurante.
— O iFood cria uma barreira que impede a concorrência, o que permite que cobrem taxas de até 3,5%, valor muito superior à média de mercado, que segundo o Banco Central é de 2,28% para transações de crédito — afirma o presidente da Abrasel, Paulo Solmucci Jr.
iFood diz que cumpre a lei
Procurado pelo Globo, o iFood informou que não foi notificado e reafirmou que cumpre integralmente a legislação antitruste. “Como empresa brasileira, seguimos com o compromisso de desenvolver o setor de delivery e oferecer a melhor plataforma para entregadores, consumidores e restaurantes, além de oferecer o melhor serviço em todas as suas verticais de operação”, completou a empresa.
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Outras queixas da Abrasel se referem ao domínio da logística de entregas e da expansão para o atendimento físico dos estabelecimentos. A entidade alega que o iFood usa recursos de inteligência artificial que direcionam pedidos a entregadores exclusivos, o que, na visão da associação, consolida o domínio da plataforma sobre a oferta de entregadores e cria barreiras para a entrada de concorrentes.
— Um entregador que quer trabalhar em outras plataformas e no iFood acaba ganhando menos que um exclusivo. Isso afasta os entregadores de outros apps, já que eles acabam preferindo ficar só no iFood por causa da dominância da plataforma — reclama Solmucci Jr.
Na denúncia ao Cade, a Abrasel questiona supostas barreiras tecnológicas criadas pelo app. Hoje, estabelecimentos que vendem através de plataformas de delivery precisam de sistemas de software para a gestão dos pedidos. A associação alega que, diferente de outras plataformas, a conexão com o sistema do iFood exige desses softwares “linguagem” própria (os chamados APIs, que fazem a comunicação entre sistemas).
O problema é que tornar os softwares capazes de “falar mais de uma linguagem” — permitir que os estabelecimentos recebam pedidos s em mais de um app de entregas — é caro, e pressiona os custos do negócio. Na visão do presidente da Abrasel, isso dificulta a conexão com outros sistemas, o que reforça a dependência em relação ao iFood:
— Se você adota um software com linguagem só sua, você obriga que todo o mercado aprenda a sua linguagem, e não outras. Como dominam o mercado, os estabelecimentos acabam tendo que se adequar.
Outra queixa da Abrasel é sobre a expansão do iFood dentro dos restaurantes por meio do “iFood Salão”. Ele funciona com totens de autoatendimento no local. A ideia é otimizar pedidos e reduzir filas em horários de pico. Mas a Abrasel argumenta que os totens coletam dados do atendimento presencial e que os dados são usadas para redirecionar consumidores a estabelecimentos cadastrados como exclusivos da plataforma.
Na ação, a Abrasel solicitou ao Cade a abertura de processo administrativo contra a plataforma p ara investigar e cessar as condutas, aplicando as sanções cabíveis. A autarquia não comentou.
Em fevereiro de 2023, o iFood firmou termo de compromisso de cessação (TCC) com o Cade que limitou contratos de exclusividade da plataforma com restaurantes, que previam que a operação via app dos estabelecimentos fosse apenas com o iFood. O acordo tem vigência de 54 meses, expirando em agosto de 2027.
As investigações do Cade apontaram indícios de que o iFood estaria abusando de sua posição dominante, por meio da imposição de compromissos de exclusividade aos restaurantes e de outras práticas com o mesmo fim. As condutas, segundo a entidade, estariam elevando barreiras à entrada de novos concorrentes.
O acordo vedou o compromisso de exclusividade com redes cuja marca congregue 30 restaurantes ou mais. Para marcas menores, o TCC definiu limites para a celebração de acordos de exclusividade.

