Economia

Pauta econômica da crise preocupa STF, e ministros têm até aula de contas públicas

Os magistrados têm se antecipado a possíveis julgamentos e passaram a dar mais atenção às coletivas do governo e às votações no Congresso

Dias ToffoliDias Toffoli - Foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil

A sucessão de anúncios de medidas para atenuar as consequências econômicas da crise do novo coronavírus levou os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) a estudarem mais a fundo as contas públicas do país.

Os magistrados têm se antecipado a possíveis julgamentos e passaram a dar mais atenção às coletivas do governo e às votações no Congresso.

O presidente da corte, Dias Toffoli, inclusive, organizou três reuniões fechadas por videoconferência dos ministros com economistas para entenderem melhor o cenário fiscal brasileiro e mundial.

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Na semana passada, o plenário da corte entrou na pauta econômica da crise ao julgar a MP (medida provisória) do governo que libera empresas a fazerem acordo individual para cortar salários e jornada de trabalho dos empregados.

Ficou clara a preocupação em comum dos ministros com o agravamento da crise e o consequente aumento do desemprego.

A MP foi declarada constitucional com o voto de sete ministros e a divergência de três deles. Um não votou.

Outro temor de integrantes do Supremo é que os desentendimentos do Executivo com o Legislativo obriguem a corte a arbitrar a disputa entre os Poderes.

Um exemplo é o debate em torno do projeto de socorro aos estados e município em meio à pandemia.

Na avaliação dos ministros, esta é a primeira vez nos últimos anos que há uma divergência mais substancial entre Congresso e Palácio do Planalto do ponto de vista macroeconômico.

Isso porque, independentemente das brigas políticas entre o presidente Jair Bolsonaro e congressistas ou até mesmo do enfraquecimento do ex-presidente Michel Temer (MDB) após as denúncias por corrupção, havia um alinhamento mínimo de que a implementação de reformas liberais era a solução para recuperar a economia brasileira.

Agora, os Poderes estão em dissintonia sobre o remédio a ser usado para evitar o agravamento da crise.

O principal ponto de discordância diz respeito ao tamanho da ajuda a estados e municípios e sobre qual a contrapartida a ser oferecida pelos entes da federação para receberem o socorro da União.

A Câmara e o governo discordam até sobre os números das contas públicas envolvidos no projeto.

Em entrevista à revista Veja, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), chegou a afirmar que o ministro da Economia, Paulo Guedes, "não é sério" e passa informações falsas à sociedade sobre a crise enfrentada por governadores e prefeitos.

O texto da Câmara prevê que a União irá recompor as perdas de estados e municípios com ICMS (imposto estadual) e ISS (imposto municipal), que são, respectivamente, as principais fontes de arrecadação dos entes da federação.

Mesmo depois dos recuos, uma vez que inicialmente a previsão era também suspender as dívidas com a União e ampliar a capacidade de contração de empréstimos junto ao Tesouro Nacional, a briga entre Guedes e Maia não arrefeceu.

Pelos cálculos da Câmara, o projeto aprovado deve representar custar R$ 89,6 bilhões. O governo, porém, sustenta que a proposta é um cheque em branco, que poderia custar mais de R$ 200 bilhões.

A equipe de Guedes propõe um socorro com impacto nas contas públicas de R$ 77,4 bilhões.

Do montante, apenas R$ 40 bilhões seriam repassados diretamente aos entes da federação; R$ 14,8 bilhões seriam via suspensão de dívidas com bancos públicos por seis meses; e R$ 22,6 bilhões com suspensão das dívidas com a União por seis meses –a maioria delas já foi suspensa pelo STF.

O governo busca um acordo de meio-termo no Senado. Com sua proposta, Guedes articula, e já tem apoio de senadores, para que estados e municípios não deem reajuste salarial por dois anos nem façam concurso público.

Diante da guerra de versões sobre a crise e do acúmulo de medidas econômicas sujeitas a questionamento no STF, Toffoli organizou videoconferências dos ministros com economistas.

Uma delas foi com Marcos Lisboa, professor do Insper e colunista da Folha de S. Paulo.

Depois, foi a vez de os ministros se reunirem online com o diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), Roberto Azevêdo.

Ele apresentou um panorama internacional, uma vez que comanda uma das maiores entidades econômicas do mundo, mas também foi discutida a realidade brasileira.

Por fim, os ministros tiveram uma videoconferência com Paulo Hartung.

Além de conhecer as contas públicas por ser ex-governador do Espírito Santo, ex-senador e ex-deputado, também é economista de formação e apresentou seu diagnóstico da crise aos ministros.

A preocupação dos ministros com o tema é percebida nos votos dados em julgamentos recentes e nas videoconferências abertas que têm participado com investidores.

Recentemente, Gilmar Mendes fez duras críticas ao Ministério da Economia. Para ele, o governo errou ao juntar diversas pastas importantes em um superministério e isso prejudicou a gestão das áreas que estão sob o comando de Guedes.

Em alguns casos, os ministros têm atuado de maneira coordenada, como ocorreu nas diversas decisões monocráticas dadas no mesmo sentido para suspender o pagamento das dívidas dos estados com a União.

Em outros, no entanto, a convergência entre eles não é tão grande.

O julgamento que discutiu se empresas poderiam cortar salários e jornada de trabalho dos empregados mediante acordo individual foi uma mostra disso.

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