Bancos centrais do G7 preparam reação a risco de recessão causado por Trump
Reação de autoridades monetárias à instabilidade provocada pelos EUA marca semana decisiva para juros; veja quais as tendências em diferentes países
Os bancos centrais do G7, grupo que reúne as sete maiores economias do mundo, se preparam para as primeiras decisões de juros desde o início da nova etapa de guerra comercial dos EUA. A crise deflagrada por Donald Trump provocou turbulência nos mercados e deve gerar reações diferentes na Europa e na América do Norte.
Enquanto autoridades do Banco do Canadá, na quarta-feira, podem manter os juros inalterados para conter o possível impacto inflacionário da atual batalha tarifária com os EUA, espera-se amplamente que o Banco Central Europeu reduza os juros no dia seguinte.
A próxima decisão do Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos, está prevista apenas para 7 de maio. Até lá, cabe aos formuladores de política monetária em Frankfurt (Banco Central Europeu) e Ottawa (Banco do Canadá) a tarefa de acalmar os mercados e avaliar os impactos econômicos da nova ofensiva do governo Trump.
Nos últimos dias, o presidente dos Estados Unidos suspendeu boa parte das tarifas mais pesadas que havia prometido, com exceção das medidas contra a China. Ainda assim, a volatilidade nos mercados e a incerteza generalizada preocupam.
A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, alertou na sexta-feira que a nova onda de incertezas representa um risco para a economia. Ela afirmou que o BCE acompanha de perto os desdobramentos da crise comercial e está pronto para agir, caso necessário. Lagarde também destacou que manter a estabilidade dos preços depende diretamente da estabilidade do sistema financeiro.
É a segunda vez em pouco mais de dois anos que Lagarde e o BCE enfrentam uma decisão importante sobre juros em meio a uma crise vinda dos Estados Unidos — e antes de qualquer posicionamento do Federal Reserve, o BC americano. Em 2023, após o colapso do Silicon Valley Bank, o Banco Central Europeu manteve sua estratégia e subiu os juros em 0,5 ponto percentual, apesar da turbulência nos mercados.
Desta vez, a decisão do BCE pode ser mais direta. As tarifas dos EUA devem enfraquecer a economia europeia, e como a União Europeia ainda não adotou medidas de retaliação que possam pressionar os preços, a expectativa é de um corte de 0,25 ponto percentual nos juros.
O Canadá, por outro lado, tem mais elementos a ponderar. Embora as tarifas de Trump já estejam afetando o investimento empresarial e o consumo, as expectativas de inflação estão em alta. Os dados de inflação ao consumidor, que saem na terça-feira, podem ser decisivos.
“A próxima decisão de juros do BCE, em 17 de abril, está se tornando mais fácil de ser tomada. Além do possível impacto direto das tarifas dos EUA sobre a economia da zona do euro, o Conselho do BCE também terá de considerar o impacto de uma moeda mais forte.” avaliam David Powell e Simona della Chiaie, economistas da Bloomberg Economics.
Em outras partes do mundo, decisões de juros da Coreia do Sul à Turquia, dados do PIB da China e relatórios de inflação do Reino Unido ao Japão estão entre os destaques.
Economia dos EUA
Com os rendimentos dos títulos do Tesouro Americano em alta, dólar mais fraco e ações em queda devido à política comercial dos EUA, os investidores estarão atentos aos sinais do Fed sobre eventual corte de juros.
O presidente do Fed, Jerome Powell, fará um discurso sobre a economia na quarta-feira, em evento em Chicago. No mesmo dia, os presidentes regionais do Fed, Jeff Schmid e Lorie Logan, discutirão economia e setor bancário.
Na quarta-feira, espera-se que as vendas no varejo de março apresentem forte aumento, à medida que consumidores correram para antecipar tarifas sobre veículos importados e autopeças. A mediana das projeções de economistas consultados pela Bloomberg aponta para um salto de 1,4%, o maior avanço mensal desde o início de 2023.
Dados da indústria apontam que as vendas de veículos subiram para o ritmo anualizado de 17,77 milhões — melhor desempenho mensal em quase quatro anos, segundo a Ward’s Intelligence. Trump elevou para 25% as tarifas sobre automóveis e autopeças importadas, em vigor desde 3 de abril.
Excluindo veículos, gasolina, materiais de construção e serviços de alimentação — o chamado grupo de controle, que acompanha de perto os gastos com bens no PIB — as vendas devem registrar um bom desempenho e encerrar um trimestre morno para o consumo.
Também na quarta, os dados de produção industrial devem mostrar queda de 0,2% em março, com temperaturas amenas limitando a geração de energia e arrefecimento na manufatura. Dados do governo na quinta devem indicar queda nos lançamentos de novas moradias, com construtoras focadas em reduzir estoques.
Ásia
Dados da China, o principal alvo das tarifas de Trump, podem mostrar perda de fôlego mesmo antes da imposição das taxas.
A expectativa é que os dados sobre exportação, a serem divulgados na segunda-feira, indiquem desaceleração em março. Já o PIB do primeiro trimestre, na quarta, deve evidenciar uma economia em enfraquecimento. Um relatório divulgado na quinta mostra deflação ao consumidor pelo segundo mês consecutivo.
Apesar da pressão, Pequim não recuou na disputa com os EUA. Na sexta-feira, a China retaliou as tarifas de Trump aumentando taxas sobre todos os produtos americanos, classificando as ações da administração do republicano como “piada”. O país, no entanto, indicou que não iria mais tarifas.
Uma decisão de juros é esperada na segunda pelo órgão monetário de Singapura, e a Bloomberg Economics projeta afrouxamento da política de juros. Na quinta-feira, o banco central da Coreia do Sul deve manter os juros.
Países que divulgarão dados de inflação na semana incluem: Índia (terça), Nova Zelândia (quinta) e Japão (sexta).
Europa, Oriente Médio e África
No Reino Unido, os dados devem atrair atenção dos investidores, com foco na persistência das pressões inflacionárias.O relatório do mercado de trabalho, que será divulgado na terça-feira, pode mostrar que os salários continuam crescendo em ritmo acelerado. Já os dados de inflação, esperados para o dia seguinte, devem apontar uma desaceleração tanto no índice geral quanto no núcleo da inflação — embora ambos ainda permaneçam acima da meta de 2% do Banco da Inglaterra.
Nenhum dos relatórios, no entanto, deve oferecer segurança suficiente ao banco para acelerar a flexibilização monetária, especialmente após os dados de sexta-feira mostrarem uma alta inesperada no crescimento da economia britânica em fevereiro.
Na zona do euro, relatórios secundários podem ajudar a guiar a decisão do Banco Central Europeu. A produção industrial de fevereiro será divulgada na terça, assim como o índice ZEW, que indica o sentimento dos investidores na Alemanha.
No mesmo dia, a inflação anual de Israel pode desacelerar para 3,2% em março — ainda acima da meta de 1% a 3%. Isso pode levar o banco central a adiar o início de cortes nos juros, apesar da economia pressionada pela guerra.
Outras decisões de política monetária na região:
Namíbia (quarta): deve manter a taxa básica em 6,75%, alinhada à decisão da África do Sul no mês passado. O dólar namibiano é atrelado ao rand.
Botsuana (quinta): deve manter juros em 1,9% pela quarta reunião seguida para conter a inflação no maior nível em seis meses.
Turquia (quinta): primeira reunião após turbulência causada pela prisão do opositor Ekrem Imamoglu. A maioria dos analistas prevê estabilidade nos juros, mas o Goldman Sachs aposta em alta.
Egito (quinta): pode iniciar ciclo de cortes, com inflação em desaceleração. A taxa real está em torno de 15%, uma das mais altas do mundo. Mas a fuga de capitais por causa das tarifas dos EUA pode adiar a decisão.
América Latina
No primeiro ano de mandato, o presidente Javier Milei entregou um superávit fiscal — o primeiro da Argentina em mais de uma década — equivalente a 1,8% do PIB (0,3% após os juros). Os dados de março, divulgados na quarta, devem confirmar o 14º superávit mensal desde 2023. Na sexta, o país fechou um acordo histórico de US$ 20 bilhões com o FMI, após Milei implementar mudanças drásticas no controle cambial do país.
Já a economia peruana cresceu acima das expectativas por sete meses seguidos. O ministro da Fazenda, Jose Salardi, prevê expansão de até 4% neste ano e 5% no próximo.Analistas ouvidos pela Bloomberg estimam crescimento de 3% neste ano, ante 2,8% em dezembro, impulsionado pelos preços dos metais. O país é o terceiro maior produtor de cobre do mundo e um dos principais exportadores de ouro.
Após perder fôlego no fim de 2024, a economia colombiana retomou o ritmo em janeiro, com juros mais baixos e salários reais maiores. Os indicadores desta semana devem reforçar o consenso de que o PIB subirá pelo terceiro ano consecutivo.