Novelas

Metáfora política e social do País, sucesso "Roque Santeiro" completa 40 anos de exibição

Sinhozinho Malta e viúva Porcina foram eternizados pelo público 

Novela "Roque Santeiro" completa 40 anos da exibição - TV Globo/Divulgação

Tudo na história de “Roque Santeiro” é superlativo. Exibida há exatos 40 anos pela Globo, a novela tem até hoje o status de maior sucesso do horário das oito, com seus 67 pontos de audiência e share médio de 80%, trilha sonora com mais de 1,3 milhão cópias vendidas e comercializações internacionais que ultrapassam 60 países.

“Virou uma referência de brasilidade. A emissora estava apostando tudo em tramas mais urbanas. A ideia do Dias Gomes, que sempre escrevia dessa forma para o horário das 22 horas, acabou levando o que existia de mais brasileiro para a faixa mais importante da grade”, analisa Aguinaldo Silva, que dividiu a feitura dos capítulos com o autor da história.

Censura
Baseada na peça “O Berço do Herói”, escrita por Dias Gomes no início dos anos 1960, a novela deveria ter sido exibida em 1975. No entanto, a censura da época alegou que o folhetim feria a moral e os bons costumes e era uma agressão à igreja católica.

Com cerca de 30 capítulos gravados, a novela foi proibida na data de sua estreia e foi substituída por uma versão condensada de “Selva de Pedra”, original de 1972 de Janete Clair, autora que era casada com Dias Gomes.

Uma década depois da proibição, o Brasil passava por um período de abertura política e comportamental, época perfeita para retomar a história ambientada na fictícia Asa Branca, onde a bravura do jovem coroinha Luís Roque, ou Roque Santeiro, de José Wilker, acabou o transformando em mito ao morrer defendendo a cidade do bando do perigoso Navalhada, de Oswaldo Loureiro. Tudo seria perfeito se a história fosse realmente verdade.

Críticas
Em cima da beatificação popular de Roque, a cidade se destacou e os poderosos enriqueceram. E tudo é posto a perder quando, 17 anos depois, Roque retorna à Asa Branca.

“Basicamente, tudo girava em torno da cegueira da população em querer acreditar em algo. E muita gente se beneficiava por isso. A novela e seu tom ingênuo conseguia se revelar um retrato do Brasil. Nesse caldeirão, entravam questionamentos religiosos, políticos e, principalmente, sociais”, analisa Marcílio Moraes, colaborador da equipe de autores.

Além de Roque, outros dois personagens completavam o protagonismo da trama: o corrupto e carismático Sinhozinho Malta, de Lima Duarte, e a exagerada e excêntrica Porcina, de Regina Duarte, que ganhou fama se dizendo viúva de Roque, sem nunca sequer ter sido casada com ele. Colecionador de perucas e desafetos, Malta, a princípio, queria se casar com a Viúva Porcina apenas para aumentar seu prestígio na cidade. 

No entanto, entre beijos e cenas pitorescas, a paixão floresceu e os dois personagens terminaram juntos. “O personagem na versão de 1975 seria mais sério. Acho que foi o humor do Sinhozinho que conquistou o público. E, claro, a sintonia entre ele e a Porcina foi fundamental e é lembrada até hoje. Uma dupla que marcou muito a minha carreira e a da Regina”, analisa Lima.

Elenco
Gravada entre os estúdios da Globo e a cidade cenográfica construída na região de Guaratiba, Zona Oeste do Rio de Janeiro, Asa Branca tentava emular cidades interioranas que vivem em torno da fé, como Aparecida do Norte, em São Paulo, e Juazeiro do Norte, no Ceará.

Em seus 206 capítulos, “Roque Santeiro” teve muitos nomes de destaque, como os falecidos Armando Bógus, Cláudio Cavalcanti e Paulo Gracindo, figuras novatas à época como Claudia Raia, Alexandre Frota e Patrícia Pillar, e atrizes que se afastaram da televisão, casos de Eloísa Mafalda e Lídia Brondi. 

E, por fim, atores que ainda estão na labuta até hoje e sentem orgulho de participar de uma trama tão icônica, como Lucinha Lins e Ary Fontoura. “O Dias Gomes era um autor formidável. Ele sabia exatamente como usar as metáforas para falar do país. E em termos de corrupção e extremismo religioso, a história contada em ‘Roque Santeiro’ ainda se mostra atual”, acredita Ary.