OMS: solidão afeta 1 a cada 6 pessoas e está ligada a 871 mil mortes por ano
Taxas são maiores entre adolescentes e indivíduos de baixa renda, revela novo relatório
Cerca de 1 a cada 6 pessoas no mundo (16%) relata sentir solidão. É o que mostra um novo relatório global da comissão da Organização Mundial da Saúde ( OMS) sobre Conexão Social, divulgado nesta semana. O documento destaca os impactos “significativos na saúde e no bem-estar” e associa a solidão e o isolamento social a mais de 871 mil mortes por ano, 100 a cada hora.
Para Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, “nesta era em que as possibilidades de se conectar são infinitas, cada vez mais pessoas estão se sentindo isoladas e solitárias”. “Além do impacto que isso causa em indivíduos, famílias e comunidades, se não for enfrentada, a solidão e o isolamento social continuarão a custar bilhões à sociedade em termos de saúde, educação e emprego”, diz em nota.
A OMS define conexão social como as maneiras pelas quais as pessoas se relacionam e interagem umas com as outras. Ter poucas conexões é definido como isolamento social. Já a solidão é descrita como um sentimento doloroso que surge de uma lacuna entre as conexões sociais desejadas e as reais.
“Neste relatório, puxamos a cortina sobre a solidão e o isolamento como um dos grandes desafios do nosso tempo. Nossa Comissão apresenta um roteiro de como podemos construir vidas mais conectadas e destaca o profundo impacto que isso pode ter na saúde, na educação e nos resultados econômicos”, afirma Vivek Murthy, copresidente da comissão da OMS e ex-cirurgião-geral dos Estados Unidos, autoridade máxima de saúde pública do país.
Segundo o novo documento, a solidão afeta pessoas de todas as idades e regiões do mundo, porém de forma mais significativa jovens e moradores de países de média e baixa renda. 20,9% dos indivíduos entre 13 e 17 anos, e 17,4% dos entre 18 a 29, relatam se sentir solitários. Na outra ponta, apenas 11,8% dos maiores de 60 anos manifestam solidão.
“Mesmo em um mundo digitalmente conectado, muitos jovens se sentem sozinhos. À medida que a tecnologia transforma nossas vidas, devemos garantir que ela fortaleça — e não enfraqueça — a conexão humana. Nosso relatório mostra que a conexão social deve ser integrada a todas as políticas — do acesso digital à saúde, educação e emprego”, defende Chido Mpemba, copresidente da comissão da OMS e assessora do presidente da União Africana.
Entre as regiões da OMS, os maiores percentuais de solidão foram observados na africana (24,3%) e na do Mediterrâneo Oriental (21%). Nas Américas, 13,6% relataram se sentir solitários. A menor proporção foi registrada na região europeia, 10,1%. As estimativas da organização também apontam que os países de baixa renda têm a maior prevalência (24,3%), enquanto os de renda alta têm a menor (10,6%), menos da metade.
Já em relação ao isolamento social, a OMS afirma que os dados são mais limitados, porém estima que afete 1 a cada 3 idosos e 1 a cada 4 adolescentes, ou seja, embora os jovens tenham mais conexões em números, sentem-se mais sozinhos do que os mais velhos.
Além disso, o documento pontua que populações marginalizadas, como pessoas com deficiências, LGBTQIAP+, migrantes e refugiados, minorias étnicas e raciais e povos indígenas, têm maior probabilidade de enfrentar discriminação ou barreiras adicionais que dificultem a conexão social.
A OMS afirma ainda que há causas que podem ser atribuídas à solidão e ao isolamento social, entre elas problemas de saúde; baixa renda e escolaridade; viver sozinho; infraestrutura comunitária inadequada; políticas públicas ineficientes e o avanço de tecnologias digitais.
Sobre os dispositivos eletrônicos, os responsáveis pelo novo relatório defendem ser preciso atenção aos efeitos do tempo excessivo de tela ou das interações negativas online sobre a saúde mental e o bem-estar dos jovens.
'Não vou ter filhos, mas vou ter animais de estimação': Por que as pessoas estão cada vez mais tomando essa decisão?
Efeitos na saúde
Segundo a OMS, conexões sociais protegem a saúde ao longo da vida, reduzindo inflamações, o risco de problemas de saúde e promovendo saúde mental. Por outro lado, o isolamento e a solidão elevam o risco de depressão, acidente vascular cerebral (AVC), diabetes, declínio cognitivo e morte precoce.
“Os impactos se estendem à aprendizagem e ao emprego. Adolescentes que se sentiam solitários tinham 22% mais probabilidade de obter notas ou qualificações mais baixas. Adultos solitários podem ter mais dificuldade para conseguir ou manter um emprego e podem ganhar menos ao longo do tempo”, afirma a organização em nota.
O relatório sugere a implementação de medidas que vão desde a maior conscientização sobre o tema até mudança de políticas públicas, fortalecimento da infraestrutura social, como pela construção de parques, bibliotecas, cafés, e oferta de intervenções psicológicas.
“A maioria das pessoas sabe como é se sentir só. E cada pessoa pode fazer a diferença por meio de atitudes simples e cotidianas — como entrar em contato com um amigo que precisa, guardar o celular para estar presente numa conversa, cumprimentar um vizinho, participar de um grupo local ou fazer trabalho voluntário. Se o problema for mais sério, é importante buscar apoio e serviços disponíveis para pessoas que se sentem solitárias”, recomenda a OMS.
Em maio deste ano, a Assembleia Mundial da Saúde (AMS) adotou a primeira resolução sobre conexão social demandando que os Estados-membros desenvolvam políticas, programas e estratégias baseadas em evidências para aumentar a conscientização e promover conexões sociais positivas para a saúde mental e física.