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Empresários paulistas procuram Tarcísio e Alckmin para reverter tarifaço de Trump

Aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro teve encontro com representante da Embaixada dos EUA, nesta sexta

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou tarifaço contra o Brasil - Nicolas Tucat / AFP

Tanto o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), quanto o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), rivais políticos de momento, têm sido procurados pelo empresariado paulista diante do prejuízo estimado com a tarifa de 50% anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, aos produtos exportados pelo Brasil.

O discurso em parte dos produtores rurais e donos de indústrias é de que os dois podem diminuir a temperatura e encaminhar uma solução negociada ao impasse, ainda que a responsabilidade formal recaia sobre o Itamaraty.

O Globo apurou que figuras influentes e representantes de entidades e associações têm procurado a gestão estadual e encaminhado relatórios estimando o prejuízo econômico do “tarifaço”, de forma a municiar a articulação de Tarcísio com autoridades americanas — e eventualmente também com o ex-presidente Jair Bolsonaro ( PL), de quem uma manifestação pública, na visão de alguns interlocutores do governador de São Paulo, poderia ser benéfico para demover Trump da ideia. Tarcísio e Bolsonaro se encontraram ontem e hoje em Brasília.

Tarcísio permaneceu na capital federal nesta sexta-feira, 11, para uma reunião com Gabriel Escobar, encarregado de negócios da embaixada americana, o principal nome hoje do governo Trump no Brasil. O governador divulgou publicamente a agenda, realizada no escritório do governo paulista em Brasília.

Alguns aliados de Bolsonaro reclamaram da postura nos bastidores, considerada um “tiro no pé” ao jogar no colo do grupo a fatura. Já o setor empresarial se divide entre aqueles que consideram o político como uma força relevante na mesa de negociações e outros que criticam o encontro por politizar ainda mais o assunto.

– Ele foi pressionado por causa (da foto) do boné do Trump e está tentando assumir um protagonismo que não é dele. Com isso, ele passa a impressão equivocada de que é uma questão política e que está sob o poder do bolsonarismo resolver. Quem tem que resolver é o governo, é o STF. A função do Tarcísio deveria ser a de reduzir os tributos de São Paulo, uma promessa da campanha de 2022, não ir para Brasília hoje e assumir um compromisso que não é dele. Depois falam que o governador já é candidato a presidente e ele fica bravo. Ele errou e vai ser cobrado por isso — declarou um bolsonarista com mandato, sob condição de anonimato.

O economista Roberto Giannetti da Fonseca, ex-secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex) e ex-diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), avalia que a atitude de Tarcísio foi inadequada, pois contamina o debate público ainda mais com disputas pré-eleitorais sem a possibilidade de colher resultados efetivos.

– O principal agora é a negociação que ocorrerá entre os dois países, algo bem planejado, estratégico, que consiga de fato trazer interlocução de nível e focar em minimizar os problemas não só do Brasil, como dos Estados Unidos. Os empresários paulistas não precisam do Tarcísio para levar suas demandas. Eles podem levá-las direto ao Geraldo Alckmin, que é quem vai liderar a questão. O Tarcísio não tem poder para negociar. Não queremos politizar a negociação. Não pode ser um confronto Lula x Bolsonaro. Não é isso. É um problema Brasil com Estados Unidos. Envolver o Tarcísio nisso é entrar em campanha desde já.

Por outro lado, o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp), Tirso Meirelles, acredita que toda articulação política baseada em critérios técnicos e isenta de radicalismos pode contribuir para uma solução negociada.

Ele afirma que Tarcísio, por governar um estado com Produto Interno Bruto (PIB) superior ao da Argentina, tem credenciais para influenciar o governo americano, mas ao mesmo tempo pede ao governo federal, com histórico de boa diplomacia, que procure um caminho alternativo ao confronto.

A diretoria da entidade discute o encaminhamento de um ofício ao vice-presidente Geraldo Alckmin e ao Itamaraty nesse sentido.

— O Tarcísio tem, vamos dizer, uma força para que possa nos ajudar, junto com o empresariado, a conseguir essa aproximação com o presidente Trump. Agora, sem dúvida nenhuma, e isso é importante, eu acredito que o governo Lula está pensando nisso. Não acredito que ele queira confrontar, pelo que conheço do Alckmin. Eles também devem estar tentando arrumar um caminho — disse. — A política econômica é quase como uma política de guerra. Se fosse para fazer um paralelo, também é um negócio violento, porque destrói as cadeias produtivas.

Alinhado com a agenda do governador, o secretário estadual de Agricultura, Guilherme Piai, diz que a melhor estratégia nesse momento é demonstrar que os Estados Unidos, apesar da robustez econômica, podem ser impactados com o encarecimento de produtos largamente importados pelo país, como o suco de laranja.

São Paulo é o principal estado produtor e o Brasil exporta 37% da safra aos americanos, de acordo com análise da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos. A produção de carne bovina e de café, entre outras commodities, também deve sofrer com as novas taxas.

— O tarifaço prejudica o agronegócio, diminui competitividade, vai sobrar produto no mercado interno, diminuir o preço e gerar desemprego, mas esse aumento prejudica também o povo americano. É isso que o governador está se esforçando agora para mostrar, de forma técnica, com dados, e de forma contundente, sem ideologia, que essa tarifa imposta pelo Trump não é boa para nenhum dos países. Vai elevar muito o preço do suco de laranja, da carne, do etanol e piorar a inflação dos EUA. Eles com certeza estão analisando o "perde-perde" dessa tarifa — afirma Piai.

Um dos presentes na reunião com o representante da embaixada americana, que pediu para não ser identificado, afirmou que a ideia do governador não é propriamente abrir um campo de negociação paralelo, e sim para se posicionar como um defensor dos interesses de São Paulo. Ele tem sido fustigado por opositores depois de comemorar a eleição de Trump e vestir o boné do movimento "Maga", acrônimo para o lema "Make America Great Again", pouco depois da posse do americano.

– Não estamos fazendo negociação, estamos abrindo um canal de diálogo com as empresas e o governo americano. Não entramos na questão política. Estamos preocupados com as empresas, os empregos. Estamos tentando separar as coisas. A briga é de Bolsonaro, Lula e Trump. Até porque o governo americano ainda não foi procurado pelo brasileiro. É claro que a competência de negociação é do Ministério das Relações Exteriores, mas o governador tem legitimidade para sentar na mesa. Tarcísio está defendendo os interesses das empresas paulistas que, aliás, estão bem perdidas. Ele vai continuar usufruindo da entrada que a direita tem no governo americano — disse.

Uma queda de braço com Trump, ativando a Lei de Reciprocidade Econômica, seria uma medida ruim neste momento, na avaliação de representantes do empresariado paulista ouvidos pelo Globo, porque as cadeias produtivas seriam ainda mais prejudicadas com o acréscimo no preço de insumos, a exemplo de químicos e sementes, no caso do agronegócio.

Ontem, o presidente Lula afirmou em entrevista ao “Jornal Nacional”, da TV Globo, que pretende adotar a medida como resposta a Trump caso uma solução não seja encontrada até 1º de agosto, data em que a tarifa geral passaria a vigorar.

Parte do setor apresenta como medida para amenizar o prejuízo a isenção de ICMS para cadeias gravemente afetadas, mas o Palácio dos Bandeirantes ainda não analisou o assunto por meio da Secretaria da Fazenda.

O titular da pasta, Samuel Kinoshita, não atendeu ao pedido de entrevista. Documento anexado à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), em maio, apontou incertezas sobre os efeitos da política de tarifas dos EUA sob a gestão Trump, com a visão à época “de menor atividade global, maior protecionismo e mudanças nos fluxos de mercadorias”.

O material manifestava preocupações para a economia do estado e as contas públicas a partir da “elevada volatilidade” do mercado externo.

“Esse terreno movediço da geopolítica e da economia mundial produz um ambiente de elevada volatilidade e incertezas que cobram o seu preço nos custos de produção, transporte e, consequentemente, na inflação, além de inibir um crescimento mais sustentado da economia global. Embora o ICMS não incida nas exportações para o exterior, a atividade exportadora movimenta toda a cadeia de suprimentos, além de gerar o aumento da massa salarial e de lucros advindas da atividade exportadora. Também é crescente a utilização de insumos importados pela indústria e, portanto, a dinâmica de preços industriais está cada vez mais associada ao mercado externo”, aponta a Fazenda no documento.