CRIME

Caso Alícia: especialista explica como estatuto prevê aplicação da lei em relação a adolescentes

Não foi revelada a idade dos envolvidos na morte da menina Alícia. Segundo informações da família, ao menos um dos responsáveis teria entre 13 e 14 anos

Menina de 11 anos morreu após ser espancada dentro de escola no Sertão de Pernambuco - Prefeitura de Belém de São Francisco/Reprodução

A morte da menina Alícia Valentina, de apenas 11 anos, após ter sido espancada dentro da escola municipal onde estudava, em Belém de São Francisco, no Sertão de Pernambuco, reacendeu o debate sobre a responsabilização de adolescentes que cometem atos infracionais.

O Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) define como crianças aquelas que têm até 12 anos incompletos. A partir dos 12 até os 18 anos são considerados como adolescentes. Não foi revelada a idade dos envolvidos na morte da menina Alícia. Segundo informações preliminares da família, ao menos um dos responsáveis pelas agressões teria entre 13 e 14 anos. 

 

A professora de direito processual penal da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e advogada criminalista, Manuela Abath, conversou com a Folha de Pernambuco sobre como o ECA prevê a aplicação da lei em relação aos adolescentes que praticam atos infracionais.

De acordo com a especialista, o estatuto prevê aos adolescentes medidas socioeducativas, que são medidas de responsabilização pensadas de modo específico para quem tem de 12 a 18 anos, a depender do ato infracional.
 

Manuela Abath é professora de direito processual penal da UFPE e advogada criminalista. Foto: Cortesia

“Podem ser medidas como internação, que equivalem à pena de prisão, pode ser a colocação no sistema de semiliberdade, que é como se fosse uma espécie de prisão em semiaberto, mas também podem ser medidas em meio aberto, como a liberdade assistida, a prestação de serviço comunitário ou uma advertência”, explicou. 

A advogada criminalista conta que os tipos de medidas que podem ser aplicadas para responsabilizar um adolescente são chamados de ato infracional, sendo este análogo a um crime. Por isso, quando se trata de adolescentes, o termo utilizado é diferente, por exemplo, crime de homicídio é ato infracional de homicídio, o crime de tráfico é ato infracional de tráfico. 

Segundo a especialista, diferente dos adolescentes, para os quais são pensadas as medidas socioeducativas, não há como pensar a responsabilização por parte de uma criança, uma vez que esta não tem nível de discernimento. Por isso, não tem uma resposta punitiva, mas sim uma medida de proteção. 

“A medida de proteção é uma coisa bem ampla, então você pode - se a criança estiver, por exemplo, em um lar violento - levá-la para um lar substituto, integrar a criança em políticas de educação, de assistência, de saúde, integrar a família, entender esse contexto familiar como um todo”, afirmou. 

Intransferível
Manuela Abath é categórica ao informar que a responsabilidade pela prática de um crime penal não é transferível. Não se transfere entre adultos, e se o adolescente pratica o ato infracional também não vai transferir para os pais ou responsáveis. 

“O que uma família, de um adolescente ou de uma criança que comete algum tipo de ato, que gera dano a outra, pode sofrer é uma espécie de responsabilização e de reparação cível. Uma indenização é uma reparação pelos danos que foram provocados por aquela conduta, mas você não pode passar a pena da pessoa que cometeu para seus familiares. Isso é um princípio constitucional da intranscendência da pena”, detalhou.

Sob a perspectiva da advogada criminalista, é importante olhar o contexto, o nível de envolvimento das pessoas da escola, se existiam medidas que poderiam ser tomadas para prevenir o que ocorreu. “O sistema de responsabilização do adolescente existe e é aplicado. Agora, para uma criança, vai ter que ser por outro caminho, outra saída, para tentar entender como que quatro crianças podem ter sido tão violentas ", lamentou.