MEIO AMBIENTE

Moradores do Ibura se unem para resgatar animais de canal após suposto vazamento de combustível

Segundo os moradores, o vazamento seria oriundo do Aeroporto Internacional dos Guararapes e teria provocado a morte de diversos animais

Animais foram retirados sem vida do canal - Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

Moradores da Rua Tenente Portela, no bairro do Ibura, na Zona Sul do Recife, se uniram em uma força-tarefa para resgatar cágados e peixes do córrego que corta a comunidade após um suposto vazamento de combustível contaminar a água.

De acordo com a denúncia feita pelos populares, o vazamento seria oriundo do Aeroporto Internacional dos Guararapes e teria provocado a morte de diversos animais.

Alguns, inclusive, chegaram a ser resgatados pela população deste o último sábado (1º). Nesta terça-feira (4), uma equipe do Ibama Recife esteve no local para cuidar da situação.

A aposentada Auxiliadora Cabral, de 57 anos, uma das pessoas que está na linha de frente dos resgates, reforça que a principal preocupação, neste momento, é com a vida dos animais e a saúde dos moradores. 

Auxiliadora Cabral ajudou a retirar animais do canal | Foto: Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

 

Profissionais do Ibama Recife atuaram na situação | Foto: Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

Resgate

“A gente tem que se juntar nessa força, porque se a gente não tirar eles daqui amanhã ou depois estão mortos. E também seria ainda mais prejudicial para nossa saúde. Porque os animais mortos gerariam outro mau cheiro forte, e já tem pessoas doentes”, afirmou a moradora.

Além disso, a população afirma que diversas pessoas foram socorridas devido ao forte cheiro do que alegam ser querosene, o principal combustível para aviões e helicópteros com motores a turbina, como jatos e turboélices.

“Eu, particularmente, sou alérgica mas estou aqui mesmo 'morrendo', dando essa força para resgatar os bichinhos porque é uma vida, né?”, completou Auxiliadora. 

Segundo Luciana Albuquerque (53), que mora no local há 35 anos, o cheiro da substância começou a incomodar os moradores no final da tarde da última sexta-feira (31). 

“O cheiro começou a subir por volta das 17h e, no sábado, já estava insuportável. Ninguém conseguia ficar dentro de casa. Muitas pessoas, assim como eu, passaram mal. Está diminuindo, mas tem hora que o cheiro ainda sobe forte, acho que por causa do vento”, contou a moradora. 

Ainda de acordo com Luciana, os moradores passaram o final de semana tentando entrar em contato com órgãos estatais que pudessem ajudá-los, mas somente obtiveram êxito na segunda-feira (3).

Animais foram retirados do canal por moradores | Foto: Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

A artesã Goretti Barbosa, de 66 anos, foi quem conseguiu acionar um desses órgãos, o Ibama, através de um telefone do Distrito Federal. 

“Quem me atendeu foi o Ibama nacional, de Brasília. Foi aberto um processo, com um prazo de investigação de 20 dias e me deram um número de protocolo, para que eu fosse acompanhando. Hoje, acionado pelo nacional, o Ibama Recife esteve aqui”, relatou a artesã. 

Goretti Barbosa é moradora do local e foi ela quem entrou em contato com o Ibama | Foto: Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco


Cheiro forte
Preocupada com a saúde dela e dos outros moradores, Goretti ainda pontuou que a comunidade está bastante aflita sobre como deve agir, principalmente com relação ao odor da substância. 

“Vamos supor que seja um crime ambiental, precisa-se orientar os moradores para que se protejam, usem máscara, se pode estar respirando esse cheiro, porque tem pessoas aqui sendo socorridas. Nós estamos respirando algo que pode ser até um produto cancerígeno, mas nós não sabemos”, lamentou a moradora com preocupação. 

 
 Wellington Luiz Barbosa | Foto: Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

O lanterneiro Wellington Luiz Barbosa, que mora no local há cerca de 10 anos, relatou que sempre percebeu o cheiro e a presença de resíduos, supostamente vindos do aeroporto, no canal. 

“Às vezes, fica um cheiro de urina muito forte, acredito que possam ser os despejos dos aviões, sempre foi assim. Porém, essa foi a pior porque a população, principalmente quem mora nas casas da frente, como eu, não consegue dormir, não consegue almoçar, não consegue sobreviver e fazer o básico com esse cheiro forte de querosene”, contou o morador. 

No local, é possível observar que foram instalados filtros por toda a extensão do canal na Rua Tenente Portela. Ainda segundo os moradores, o Ibama também teria feito uma espécie de filtragem por sucção.

“Depois que o Ibama veio e tentou sugar um pouco dessa situação deu uma melhorada, mas continua do mesmo jeito. O cheiro diminuiu um pouco, mas mesmo assim quem passa por aqui já sente logo o odor” concluiu Wellington.

Combustível
Procurada pela reportagem da Folha de Pernambuco, a Aena, que administra o Aeroporto Internacional dos Guararapes, informou que detectou a presença de combustível de aviação no local no último sábado (1º) e que as causas do possível vazamento já estão sendo investigadas.

Óleo na água do canal é visível, e o cheiro no local é forte | Foto: Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

A concessionária também se colocou à disposição das autoridades.

“No último sábado (1º), foi detectada a presença de combustível de aviação na rede de águas pluviais e a Aena acionou, para providências, o pool de empresas responsável por gerenciar o abastecimento de aeronaves no Aeroporto do Recife. As causas do vazamento estão sendo investigadas. A Aena está à disposição das autoridades”, diz a empresa.

A Prefeitura do Recife informou que realizou uma fiscalização no local, por meio da Secretaria Executiva de Controle Ambiental e Fiscalização, e que o caso está sendo apurado para a eventual adoção das medidas cabíveis. Caso seja comprovado o despejo irregular de material poluente, a infração é passível de multa que pode chegar a R$ 500 mil. 

“A Secretaria Executiva de Controle Ambiental e Fiscalização informa que uma equipe de fiscalização esteve no local ainda durante o domingo (2) e que o caso está sendo apurado para a eventual adoção das medidas cabíveis. De acordo com o decreto municipal 30.324/2017 (que regulamenta a lei 18.211/2016), o despejo irregular de material poluente em cursos d´água é infração passível de multa que vai de R$ 200 a R$ 500 mil”, explica a gestão. 

 

Em nota, a Agência Estadual de Meio Ambiente – CPRH informou que duas equipes técnicas do órgão estiveram no bairro do Ipsep, Zona Sul do Recife, para verificar a ocorrência de despejo irregular de combustível no Córrego da Malária.

Os técnicos constataram o derramamento de um material compatível com querosene de aviação, que provavelmente vazou do Aeroporto Internacional do Recife. No córrego, os fiscais da CPRH recolheram 47 animais – nove já estavam mortos e 38 debilitados. Os animais resgatados com vida foram encaminhados ao Centro de Triagem e Reabilitação de Animais Silvestres – Cetras Tangara, na Zona Norte do Recife, para cuidados clínicos. 

Os agentes de fiscalização da Agência também vistoriaram o córrego no trecho que corta a área do complexo aeroportuário, bem como os tanques de combustíveis e caixas de passagens do “Pool de combustíveis” operado pelas empresas Raizen, Air BP Brasil e Vibra Energia. No local, foram encontrados resquícios do produto na saída da estação elevatória, além da constatação do “odor” de material parecido com o do bairro do Ipsep.  

Nesta quarta-feira (5), uma equipe do laboratório da Agência CPRH vai realizar a coleta de material nos locais (córrego e aeroporto) para análise. A Aena Brasil – administradora do Complexo Aeroportuário do Recife – não soube informar a origem do vazamento  – se de um dos tanques ou de algum caminhão de abastecimento. A empresa já foi intimada pela Agência Estadual de Meio Ambiente para apresentar esclarecimentos e informou que acionou o plano de ação para emergências ambientais com barreiras químicas, sucção do material, contenção e limpeza. 

A Aena informou que está preparando um relatório com as possíveis causas do incidente. A empresa vai ser autuada pela CPRH por contaminação do corpo hídrico e degradação contra fauna. Outras medidas serão avaliadas após o resultado da análise da água bem como a contagem final dos animais resgatados, mortos e recuperados.