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Acordo UE-Mercosul falha em critérios de sustentabilidade, diz estudo

Um dos pontos mais sensíveis é a falta de transparência nas cadeias produtivas

MercosulMercosul - Foto: Divulgação

 Apesar de citar diretrizes ambientais, o texto do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul falha ao não prever mecanismos de transparência, sanção e inclusão de comunidades locais. Os três pontos-chave são fruto da análise de 22 pesquisadores internacionais de universidades como Oxford (Reino Unido), Louvain (Bélgica) e Columbia (Estados Unidos).

O grupo, que inclui dois pesquisadores brasileiros, analisou o documento, que aguarda por votação no parlamento europeu, apontando as deficiências do acordo para a sustentabilidade das cadeias produtivas negociadas entre os blocos e também recomendando mecanismos com exemplos já usados em acordos comerciais.

Um dos pontos mais sensíveis é a falta de transparência nas cadeias produtivas. O acordo adota o princípio da precaução e estabelece que "o aumento do comércio não deve ocorrer às custas do meio ambiente ou das condições de trabalho". No entanto, "faltam informações sobre como os padrões de sustentabilidade ambiental e social serão aplicados", afirma a análise, liderada pela doutora em ecologia Laura Kehoe, que pesquisa cadeias ligadas a desmatamento pela Universidade de Oxford.

Para garantir que o comércio entre os blocos não estimule o desmatamento e as violações de direitos humanos, o estudo sugere a adoção de um mecanismo de rastreamento a partir de ferramentas já existentes, como monitoramento por satélite e bancos de dados públicos.

Um exemplo citado pelos pesquisadores é a iniciativa Trase, que cruza dados de desmatamento e de exportação. Neste ano, o levantamento revelou um descompasso entre as regiões que concentram o desmatamento e aquelas que lideram as exportações.

Por exemplo, a região do Matopiba (que fica entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) exportou apenas 7% da soja que chegou à União Europeia em 2018, mas respondeu por 61% do risco de desmatamento nas importações da commodity para os europeus. O rastreamento permitiria, por exemplo, selecionar fornecedores elegíveis para o acordo.

A falta de sanção no caso de descumprimento de compromissos internacionais citados no documento, como a obrigatoriedade de implementação do Acordo de Paris de combate às mudanças climáticas, é outra falha apontada pelos pesquisadores.

O estudo sugere a previsão de embargos temporários para a importação de bens e serviços que não estejam cumprindo critérios legais e de sustentabilidade em linha com tratados internacionais. "Esta é uma opção política particularmente poderosa, dada a falta de mecanismos para fazer cumprir acordos internacionais como o Acordo de Paris", afirma o estudo, que também sugere a renegociação dos termos do acordo ou aumento de tarifas e impostos de fronteira até que o cumprimento dos critérios previstos seja alcançado.

Já o terceiro pilar da crítica dos cientistas aponta uma falha irreversível: a exclusão de comunidades locais, indígenas e outros povos tradicionais na construção do acordo. "O acordo precisaria ser refeito", afirma o brasileiro Tiago Reis, um dos autores do estudo e doutorando em sustentabilidade de cadeias produtivas pela universidade de Louvain (Bélgica).

"Mas se não puder ser refeito, pode-se criar uma espécie de ouvidoria, para receber queixas de populações que se sintam impactadas pela cadeia ligada ao acordo, com poderes reais de acolher a demanda, investigar com imparcialidade, tomar decisão e impor sanções", completa Reis.

Segundo o pesquisador, a análise se baseou em experiências de outros acordos comerciais e procurou por recomendações que podem ser incluídas na fase de regulamentação do acordo, o que ajudaria a viabilizar a sustentabilidade do acordo.

Os autores da análise pertencem ao grupo de 607 cientistas que haviam publicado uma carta na revista científica Science, ainda no ano passado, expressando preocupação com a possibilidade do acordo comercial aumentar o desmatamento na Amazônia.

Segundo Reis, o grupo de pesquisadores tem sido consultado por parlamentares europeus sobre as implicações ambientais do acordo, que tem gerado crescente preocupação no bloco e já conta com posicionamentos contrários de países como Irlanda, Bélgica e França.

No último mês, a chanceler alemã, Angela Merkel, que defendia a votação do acordo no parlamento europeu, também passou a expressar receios, declarando ter "sérias dúvidas" sobre o futuro do acordo comercial.

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