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Damares anuncia que não dará continuidade ao memorial da Anistia em MG

A previsão era de que o memorial, criado por decreto em 2009, fosse finalizado até 2014

A ministra da mulher, da família e dos direitos humanos, Damares AlvesA ministra da mulher, da família e dos direitos humanos, Damares Alves - Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

A ministra da mulher, da família e dos direitos humanos, Damares Alves, anunciou nesta terça-feira (13) que o governo não dará continuidade ao projeto do Memorial da Anistia Política do Brasil, em Belo Horizonte.

A previsão era de que o memorial, criado por decreto em 2009, fosse finalizado até 2014. Ele consta na sentença do caso Gomes Lund, na Corte Interamericana de Direitos Humanos, como uma das ações que o Estado brasileiro estaria adotando para reparar as violações cometidas durante o período da ditadura militar (1964-1985). O Brasil foi condenado pela detenção, tortura e desaparecimento de guerrilheiros no Araguaia.

"Não vai ser um memorial. Nós podemos encontrar um outro destino para esse prédio, mas não para o memorial. Não temos recurso para isso", disse ela a jornalistas.



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O memorial deveria ocupar o prédio do "Coleginho", onde funcionou a Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG (Fafich), tombado pela Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte. O local era um dos pontos de manifestações contra o regime militar na capital mineira e vários de seus estudantes foram vítimas da repressão.

Problemas na fundação do prédio, porém, fizeram com que o projeto fosse revisto e um novo prédio de quatro andares começasse a ser construído no terreno - prevendo uma sala para abrigar a comissão de anistia. A obra foi suspensa em setembro de 2016.

Segundo Damares, a museografia projetada para o espaço está preservada e terá uma destinação ainda a ser definida. Ela defendeu que o memorial, espaço para abrigar memória e história, não é o que os anistiados buscam agora.

Damares afirmou que a comissão vai priorizar dar uma resposta aos mais de 7.000 requerimentos submetidos para análise de concessão de indenizações. Quanto aos mais de 1.300 pedidos rejeitados pela comissão só em 2019, a ministra diz que apenas herdou decisão do governo anterior.

"Nós temos velhinhos, pessoas queridas, que vão lá no ministério, 90, 92 anos, eles têm expectativa nos requerimentos que estão comigo. Pasmem, temos pessoas que morreram abandonadas, sem dinheiro e tendo direito", afirmou Damares.

11 indiciados
Em 2017, as obras do memorial foram alvo de uma operação conjunta da Controladoria-Geral da União (CGU), Tribunal de Contas da União (TCU) e Polícia Federal por suspeita de desvios. A investigação teve condução coercitiva de várias pessoas, entre elas o então reitor da UFMG, Jayme Ramires, a atual reitora, que ocupava cargo de vice, Sandra Goulart, e a professora Heloísa Starling.

A reportagem apurou que o inquérito da PF, que está pronto para ser relatado, indiciou 11 pessoas por crimes de associação criminosa, estelionato, falsidade ideológica, peculato, desvio, concussão e prevaricação.

No ano que a PF começou a investigação dos desvios, o Ministério Público Federal em Minas Gerais emitiu uma recomendação pedindo que a Comissão de Anistia evitasse retrocessos no projeto de implementação do memorial e adotasse medidas cabíveis "para a solução de todas as questões que envolvessem o projeto".

A estimativa do ministério é de que os custos da obra tenham passado dos R$ 28 milhões –o orçamento inicial previa custo de R$ 5,1 milhões. O projeto original teve seis aditivos.

Nesta terça, a pasta divulgou que o dinheiro encaminhado para as obras do memorial saiu do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), vinculado ao ministério da Justiça, como era a comissão da Anistia até a mudança do governo atual. Os valores, segundo o ministério, eram destinados à construção do quinto presídio federal e a investimentos em unidades estaduais.

Investigação interna 
Damares também autorizou a equipe de controle interno do ministério a iniciar um procedimento de tomada de contas especial. Na prática, significa que a pasta irá pedir o ressarcimento de valores a pessoas que a apuração interna identifique como responsáveis, independente do inquérito da PF.

O montante que pode ser pedido ainda não foi calculado. A assessoria do ministério estima que mais de cinco pessoas, ligadas à UFMG e à comissão da anistia na época das obras, podem ser apontadas e ter de pagar os custos.

A CGU também estuda a suspeita de desvios com foco no trabalho realizado pela universidade e entregue em um HD ao ministério.

Em maio, Damares questionou os gastos com o memorial na Câmara dos Deputados, citando o HD e afirmando que a pesquisa contida nele teria custado entre R$ 3 milhões e R$ 7 milhões.

Em slides apresentados na ocasião, a ministra apontou que o arquivo teria 3.700 imagens, 1.384 páginas de documentos impressos, 514 documentos sonoros, canções ou jingles, 658 minutos de trechos de documentos sonoros, 35 filmes encenados ou documentos em versão integral, 1.400 minutos de trechos de vídeos, 84 verbetes biográficos, 8 papers e 200 obras identificadas em pesquisa bibliográfica.

Entre as imagens de arquivo, estariam fotos antigas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quando foi preso durante a ditadura militar (1964-1985) e do cantor Chico Buarque de Holanda.

Na visita ao local do memorial, Damares foi questionada pelo fato de a decisão de suspender o projeto ter vindo menos de uma semana depois de o presidente Jair Bolsonaro (PSL) voltar a chamar o torturador condenado Carlos Alberto Brilhante Ustra de "herói nacional".

"Eu não vou falar sobre as declarações do meu extraordinário presidente. Eu estou preocupada com isso aqui, com o dinheiro dos anistiados", respondeu.

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