Estudo revela como pica-paus suportam impactos 400 vezes mais fortes que a gravidade
Pesquisa internacional mostra que aves sincronizam músculos e respiração para golpear madeira
Quem nunca ouviu o Pica-Pau bater o bico na árvore e pensou: “Como é que ele aguenta isso?”. A resposta, agora comprovada pela ciência, revela que esses pequenos “marreteiros” da natureza contam com um sistema corporal tão bem afinado que transforma cada bicada em um (quase) ato de engenharia.
A descoberta foi publicada no início de novembro no Journal of Experimental Biology, que detalha como os pica-paus conseguem perfurar madeira com força extraordinária sem sofrer danos internos.
O estudo, conduzido por Nicholas Antonson, Matthew Fuxjager, Stephen Ogunbiyi, Margot Champigneulle e Thomas Roberts, da Universidade Brown (EUA), em parceria com Franz Goller, da Universidade de Münster (Alemanha), analisou pica-paus da espécie Dryobates pubescens. Segundo os cientistas, essas aves sincronizam a contração dos músculos da cabeça, pescoço, quadris, abdômen e cauda com o ritmo da respiração, num processo comparável ao de atletas que grunhem para aumentar a potência do movimento.
As aves foram capturadas em Rhode Island e avaliadas em laboratório com técnicas de eletromiografia e medições de pressão e fluxo de ar. Após os experimentos, todos os espécimes foram devolvidos à natureza. Os resultados mostraram que, ao perfurar madeira, os pica-paus enfrentam desacelerações de até 400g — força muito superior à vivenciada por humanos em tarefas comuns.
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A capacidade de resistência vem de uma coordenação muscular extremamente precisa. Músculos da cabeça e do pescoço funcionam como uma alavanca rígida, enquanto o abdômen e os flexores do quadril impulsionam o corpo para frente. A cauda atua como ponto de apoio, estabilizando a ave no tronco no instante do impacto. O Journal of Experimental Biology aponta que essa sincronia permite transferir energia cinética do bico para a madeira sem comprometer tecidos internos.
Sincronização da respiração e ajuste de potência
Entre os achados mais intrigantes está o alinhamento entre respiração e movimento. Os pesquisadores observaram que os pica-paus expelem o ar exatamente no momento do golpe, um padrão semelhante aos grunhidos de tenistas ou levantadores de peso. “Esse tipo de padrão respiratório gera maior cocontração dos músculos do tronco”, disse Antonson ao Phys.org, destacando que o mecanismo aumenta a potência de cada impacto.
A análise da pressão nos sacos aéreos e do fluxo de ar pela siringe confirmou que a expiração acompanha com precisão cada batida — mesmo em sequências que chegam a 13 golpes por segundo, nas quais a ave dispõe de apenas 40 milissegundos para inspirar e expirar entre um movimento e outro.
Os cientistas também verificaram que os pica-paus modulam a intensidade da força conforme o objetivo. Ao perfurar madeira para cavar cavidades ou buscar alimento, os músculos do quadril trabalham com mais vigor, gerando golpes potentes. Já nos toques curtos usados para comunicação, a contração é mais suave, preservando energia e diminuindo o desgaste físico.
De acordo com o Journal of Experimental Biology, essa integração entre sistemas muscular e respiratório representa um exemplo extremo de especialização biomecânica na natureza. Os autores sugerem que mecanismos semelhantes podem existir em outros animais que executam tarefas de alta demanda motora, como o canto de aves ou a corrida de mamíferos. A pesquisa, afirmam, pode ainda inspirar aplicações em engenharia e robótica, onde eficiência energética e precisão mecânica são desafios constantes.

