Dom, 07 de Dezembro

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Religião

Fiéis relatam sua devoção à Nossa Senhora da Conceição

Nesta terça-feira, dia 8, é o Dia da Nossa Senhora da Conceição, padroeira afetiva do Recife. Mesmo em um ano marcado pela pandemia do novo coronavírus, católicos celebram a data e renovam seu votos

Morro da ConceiçãoMorro da Conceição - Foto: Alexandre Aroeira/Folha de Pernambuco

Fazer sacrifícios é uma forma de demonstrar devoção. A pé, de joelhos e até mesmo andando de costas embaixo de um sol escaldante são algumas das inúmeras formas encontradas pelos fiéis para homenagear Nossa Senhora da Conceição. Nesta época do ano, o coração de Casa Amarela, bairro da Zona Norte do Recife, se veste de azul e branco. Usando a fé como combustível, milhares de pessoas sobem as ladeiras e os intermináveis degraus das escadarias do Morro para pagar promessas, acender velas e simplesmente agradecer pelas graças alcançadas. Tem ainda aqueles que buscam um milagre, seja uma cura, um bem material, ou um reencontro com alguém que não se vê há anos. Em cada pedido fragmentos de histórias de fé. 

Quem tem história para contar e tem uma vivência religiosa exemplar é Severina Santana, a Dona Sevi, de 84 anos. Coordenadora da pastoral dos idosos e responsável pelo bazar do Santuário, ela é conhecida por entoar a canção de romaria "Lá vem a barra do dia" antes da proclamação do Evangelho, no dia dedicado à santa, 8 de dezembro. Nas contas de Severina já são quatro décadas recitando a ladainha da vinda de Jesus nas primeiras horas do dia ao nascer do sol.

Nos seus 69 anos de atuação religiosa, Dona Sevi conta que Nossa Senhora da Conceição, além de ser a mãe de todas as mães, tem uma representação muito forte em sua vida. “Maria, a mãe, representa tudo em minha vida. Ela é um exemplo de mulher sábia, que soube ouvir a palavra de Deus mais do que ninguém, que acreditou na humildade”, diz. Ela conta que costuma agradecer mais do que pedir. “Porque as misericórdias de Deus juntamente com a intercessão de Nossa Senhora são benéficas”, complementa Dona Sevi, que dedica sua vida a servir.

 

Nem mesmo a pandemia vai impedir Severina de participar das festividades no dia 8. Por fazer parte do grupo considerado de risco da Covid-19, ela tem na ponta da língua os cuidados que deve tomar ao sair de casa. "Lavar sempre as mãos e usar máscara é essencial. Além disso, sempre que saio de casa e retorno para casa tomo logo um banho e coloco as roupas para lavar", afirma. Ela ainda comenta que faz questão de orientar aquelas que pessoas que insistem em descumprir as medidas de prevenção do novo coronavírus.

"Sabemos que essa doença não é apenas para os mais velhos, ela atinge crianças, adolescentes, preto, branco, rico ou pobre, mas todas as pessoas precisam tomar cuidado, principalmente os idosos. A pandemia está aí, não passou e as atitudes de prenvenção de certa forma representam a vida cristã que devemo levar. A pandemia nos trouxe vários ensinamentos e entre eles estão o de cuidado, amor e respeito ao próximo", fala com a sabedoria que só a idade nos traz.

O Dia de Nossa Senhora da Conceição é na próxima terça-feira (8), mas tem muita gente que prefere antecipar as homenagens. De joelhos, respeitando o distanciamento entre os outros devotos, os fiéis fazem suas orações, como Helena Almeida, de 75 anos, que mora na rua ao lado do Santuário há quase seis décadas. “Eu digo que ela (a santa) é minha vizinha. Moro entre Deus e Nossa Senhora da Conceição. Ela é uma pessoa de coragem que sempre deu exemplo para todas as mulheres na sua luta, no seu amor, no seu carinho, sempre acompanhando seu filho e juntos transformam o mundo em um lugar melhor”, diz Helena, ressaltando que o maior milagre é a vida.

Evitando sair de casa por conta da pandemia, ela conta que este ano não participará da Festa do Morro na próxima terça-feira. Neste domingo ela vai para a granja de uma das irmãs. "Fico muito triste porque há mais ou menos 60 anos moro no Morro e sempre participei das celebrações no Dia de Nossa Senhora da Conceição, mas agora por conta do coronavírus tenho que me afastar. Quanto mais distante ficar de aglomeração é mais seguro. Estou fazendo minhas homenagens antecipadamente", afirma, acrescentando que para ir ao Santuário na última semana teve o cuidado de sempre higienizar as mãos e usar máscara. "Apesar de no Santuário ter álcool à disposição, medirem a temperatura e garantirem o distanciamento social preferi não entrar e fiquei do lado de fora por ter menos gente", comenta. 

Dona Sevi: Dona Sevi: "a pandemia nos trouxe o cuidado e o amor ao próximo"

Neste ano, a pandemia do coronavírus trouxe algumas mudanças no acesso ao monumento da santa. Durante os festejos, todos são obrigados a usar máscaras. De acordo com o coordenador do monumento, Jorge Gomes, no local só entram 100 pessoas por vez, respeitando a demarcação no chão para uma melhor distribuição dos devotos entorno da imagem. Duas entradas laterais permitem o controle de pessoas para rápida visitação, por cerca de cinco a dez minutos.

Devoto, ele diz que Nossa Senhora da Conceição é muito mais do que uma imagem. “Falar de Nossa Senhora me preenche. Ela me fez um homem e um pai melhor. Tenho muita fé e me dedico não apenas durante a festa. Aqui as pessoas trazem a gratidão e depositam em nossas mãos. Recebemos com muita dedicação cada vela, cada veste, cada buquê de flores, pois estamos recebendo a graça alcançada com uma intercessão de nossa senhora junto ao pai”, diz Gomes, emocionado por estar mais um ano à frente da coordenação do monumento.

Os jovens também marcam presença nas celebrações à santa. O digital influencer José França, 18, explica que desde os 12 anos de idade frequenta a Festa do Morro. Em um ano atípico por conta da Covid-19, a preocupação estará presente no meio dos fiéis. No entanto, para o jovem a fé é maior e está acima de qualquer pandemia. "Me preocupo e vejo que as pessoas também se preocupam, mas a fé está em primeiro lugar. A pandemia pode ter acabado com muita coisa, mas a fé leva as pessoas longe. Quando a colocamos em primeiro lugar creio que a gente chega onde quer”, avalia.

História
A Festa do Morro teve origem a partir da comemoração do cinquentenário do dogma da Imaculada Conceição, instituído pelo Papa Pio IX, em 1854. No dia 8 de dezembro de 1904 foi inaugurado o monumento com a imagem de Nossa Senhora da Conceição, pelo então bispo de Olinda, Dom Luiz Raymundo da Silva Britto. A partir desse dia, o Morro da Boa Vista ou Morro dos Oiteiros passou a ser denominado definitivamente como o Morro da Conceição.

No mesmo dia foi inaugurada uma capela em estilo gótico dedicada à santa que pertencia à comunidade de Poço de Panelas. Devido ao desenvolvimento urbano do local, houve o desmembramento da área do Morro da Conceição, para criação da nova Paróquia de Nossa Senhora da Conceição do Morro, instaurada em 8 de dezembro de 1974, pelo então arcebispo de Olinda e Recife, dom Hélder Câmara. No ano seguinte, a paróquia passou a denominação de Matriz do Morro da Conceição e em 2015 foi elevada à condição de Santuário Arquidiocesano. 

"Nossa Senhora da Conceição já era querida, mas a devoção em torno dela se torna mais forte quando é colocada a imagem no Morro. Subir o Morro passou a ser visto como uma ideia de peregrinação e sacrifício, que está muito presente na história da humanidade", comenta o coordenador do curso de Licenciatura em História da Unicap, Flávio Cabral. Trazida da França em um navio em 1904, a imagem mede três metros e meio de altura e pesa quase duas toneladas. Representando Maria Santíssima a imagem é toda vestida de branco e envolvida em um manto azul. 

A santa ganhou tanta força na Capital ao ponto de muitas pessoas acharem que ela é a padroeira da cidade. "Quando se olha o documento papal é bem visível quando ele diz que temos praticamente dois padroeiros. Um oficial, que é Santo Antônio, e uma secundária, Nossa Senhora do Carmo. A gente observa que ao longo dos anos o santo vai ficando desprestigiado, vai aumentando a comoção com Do Carmo e ela passa a ganhar uma força muito grande", disse o historiador.

Festa
Neste ano, o tema da 116ª Festa de Nossa Senhora da Conceição do Morro tem como tema "Maria, Modelo Eucarístico e Mãe da Esperança". Sem procissões de abertura e de encerramento, confissões e programação cultural, por conta das medidas de prevenção da Covid-19, os fiéis contam com cinco Santas Missas diárias até segunda-feira (7), às 6h, 9h, 12h, 14h e 16h, com duração média de 45 minutos. O Solene Novenário é realizado às 19h com a presidência de bispos, párocos e subtemas que vão ser explanados a cada noite.

No dia 8, data do encerramento,  oito Santas Missas vão ser realizadas: 0h, 2h, 4h, 6h, 9h, 12h, 14h e 16h. A Solene Missa de Encerramento vai ser presidida pelo arcebispo Metropolitano de Olinda e Recife, Dom Antônio Fernando Saburido, às 19h. 

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