'Muda essa política de atirar', pedem pais da menina Ágatha a Witzel
Para o casal, Witzel precisa entender que "nem todo mundo que está de moto, boné ou mochila é bandido"
Visivelmente abalados, os pais da menina Ágatha Félix, 8, morta ao ser atingida por uma bala perdida no Complexo do Alemão, no Rio, falaram nesta terça-feira (24) sobre a tragédia.
Vanessa Francisco Sales e Adegilson Félix pediram justiça e mandaram um recado ao governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC): "Muda essa política de atirar. O que aconteceu com a minha filha pode acontecer com a vida de outras pessoas também", disse Adegilson, segurando a mão da mulher, em entrevista ao programa "Encontro com Fátima Bernardes" (TV Globo).
Para o casal, Witzel precisa entender que "nem todo mundo que está de moto, boné ou mochila é bandido", disse o pai de Ágatha. A criança foi baleada nas costas quando estava dentro de uma Kombi com a mãe, a caminho de casa, na noite da última sexta (20), em uma localidade no alto do Complexo do Alemão.
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Parentes acusam a polícia de ter feito o disparo, com o objetivo de acertar um motociclista, mas o tiro atingiu a menina. A polícia diz que foi atacada por criminosos e houve troca de tiros.
O caso está sendo investigado pela Delegacia de Homicídios. Antes da tragédia, a família de Ágatha contou que pensava em deixar a parte mais alta do morro do Alemão por causa das constantes trocas de tiros entre criminosos e a polícia.
O plano do casal, segundo Vanessa Sales, era juntar dinheiro e comprar uma casa na parte baixa da comunidade. A mãe da menina se lembra que a família se refugiava no box do banheiro quando as rajadas de tiro irrompiam na comunidade.
Eram essas pausas forçadas na rotina que mais assustavam a criança. "Teve um dia que a gente se escondeu no box do banheiro. Eu peguei um edredom e um travesseiro. E duas vezes naquela semana ela ficou muito assustada e me abraçou muito forte", lembrou. "Nesses dias, ela ficava muito chateada porque não conseguia ir à escola, às aulas de xadrez."
Segurando nas mãos a boneca da Mônica, brinquedo predileto da filha, Vanessa disse que Ágatha era "uma menina inteligente, perfeita e de muito amor".
"Hoje eu estou aqui e sei que muitas mães estão chorando comigo. É isso que está me acalentando. E saber que meu anjinho foi pro céu e, de lá, está secando as minhas lágrimas agora", disse a mãe.
Witzel culpa tráfico
Witzel disse na sua primeira entrevista sobre a morte da menina Ágatha, na segunda (23), que o caso não pode ser utilizado como "palanque eleitoral" ou com o objetivo de obstruir votações importantes como o pacote anticrime do ministro da Justiça Sergio Moro.
"É indecente usar um caixão como palanque, especialmente de uma criança", afirmou Witzel, que permaneceu em silêncio a respeito do caso durante o fim de semana. O governador afirmou que passou os últimos dias conversando com autoridades como Moro, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e deputados.
Witzel atribuiu a morte de Ágatha ao tráfico de drogas, que, segundo ele, utiliza os moradores das comunidades como escudo contra a polícia, e os usuários dessas substâncias. "Quem fuma maconha e cheira cocaína ajudou a apertar este gatilho", disse.
O governador afirmou ainda que a polícia age sempre na legítima defesa da sociedade e que os traficantes provocam as forças de segurança. Com um discurso em defesa das polícias, Witzel não chegou a comentar espontaneamente a possibilidade de que um PM tenha sido responsável pela morte de Ágatha. Moradores e familiares dizem que a polícia tentou atingir um motociclista e acabou acertando a criança.
Confrontado pela imprensa sobre a questão, ele respondeu: "Em momento algum tenho tido discurso brando com quem quer que seja. Eu não tenho bandido de estimação, seja de distintivo, seja de farda. A lei é para todos."
Questionado sobre o que diria para a família da menina, Witzel respondeu que lamenta profundamente a perda. "O meu sentimento é o sentimento de pai, tenho filha de nove anos (...) Você acha que não penso? Eu não sou um desalmado, sou um cara de sentimentos."
Witzel voltou a defender que sua política de segurança é bem-sucedida, com base na redução do número de homicídios dolosos. De janeiro a agosto de 2019 foram 2.717, uma queda de 21% em relação ao mesmo período de 2018.
Alardeando a redução do número de homicídios, o governador não citou que as mortes por intervenção de agentes do estado subiram de 1.075, de janeiro a agosto de 2018, para 1.249 no mesmo período de 2019 -um aumento de 16%.
O secretário de estado da Polícia Militar Rogério Figueiredo, presente na entrevista, disse que a morte de Ágatha foi um evento isolado e que os policiais militares são heróis do Rio de Janeiro.