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Aliado de Guaidó diz que negociou plano para mercenários capturarem Maduro

Estrategista político, no entanto, disse que não havia dado sinal verde para a operação

Nicolás MaduroNicolás Maduro - Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Arquivo Agência Bras

Juan José Rendón, chefe do comitê de estratégia do líder opositor Juan Guaidó, revelou ter participado da negociação de uma operação militar estrangeira que buscava capturar o ditador Nicolás Maduro e retirá-lo do poder. Ele deu entrevistas para o jornal americano The Washington Post e para a CNN en Español.

No domingo (3), o regime venezuelano anunciou a interceptação de um grupo de mercenários, chamados por Maduro de terroristas, que tentava entrar no país a bordo de lanchas, vindas da Colômbia. Segundo as autoridades do país, oito pessoas morreram na operação e ao menos 19 foram presas.

Na quarta (6), Maduro foi à TV e exibiu o depoimento de um norte-americano, identificado como Luke Derman, que disse ter sido contratado para treinar grupos de venezuelanos na Colômbia, ir com eles para Caracas, capturar Maduro e levá-lo aos EUA.

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Segundo reportagem do Washington Post , que se baseia em conversas com mais de 20 pessoas, incluindo Rendón, o planejamento da suposta operação começou em setembro de 2019, em Miami. Ali, representantes de Guaidó se reuniram com Jordan Goudreau, 43, um ex-militar de uma das forças especiais do Exército dos EUA.

Goudreau, que criou a empresa de segurança privada Silvercorp, disse que teria 800 homens prontos para entrar na Venezuela e capturar Maduro e seus principaís líderes, com Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Constituinte.

Guaidó "disse que todas as opções estavam na mesa, e também embaixo da mesa", disse Rendón ao Washington Post. "Estávamos cumprindo esse propósito".

Rendón, que vive exilado em Miami, é chefe do comitê de estratégia de Guaidó e disse que foi representá-lo nos encontros para tratar da operação.

"O governo legítimo do presidente Guaidó não controla nenhuma força policial no país, portanto todos os cenários são analisados: alianças com outros países, militares que estão dentro [da Venezuela], uso eventual de atores que estão fora, como militares aposentados", disse Rendón, à CNN.

Segundo ele, advogados foram consultados sobre a operação. Eles disseram que o conceito jurídico de "inimigo universal", aplicado para processar piratas que atuam em alto mar, poderia ser usado contra o regime venezuelano.

Em outubro, foi assinado um contrato, que definia explicitamente o objetivo do acordo: "uma operação para capturar/deter/remover Maduro (...) e instalar o presidente reconhecido da Venezuela, Juan Guaidó".

Atual presidente da Assembleia Nacional, de maioria opositora, Guaidó foi reconhecido no início de 2019 como presidente interino da Venezuela por mais de 50 países, incluindo Estados Unidos e Brasil.

No entanto, não conseguiu assumir o controle da Venezuela. Acusado de fraudar as eleições de 2018, o ditador Nicolás Maduro segue no poder com apoio das Forças Armadas e de países como China e Rússia.

O Washington Post publicou em seu site uma íntegra do contrato, que exibe assinaturas de Rendón, Guaidó e mais duas pessoas. O documento foi fornecido por Goudreau.

O jornal relata ter tido acesso a uma gravação de uma conversa na qual Guaidó diz concordar com a ação. "Nós estamos fazendo a coisa certa por nosso país", teria dito o líder opositor.

Rendón, no entanto, afirma que Guaidó não assinou esse contrato e que o líder opositor tinha conhecimento apenas de um "plano exploratório", sem saber dos detalhes de como ele seria realizado.

Guaidó nega ter assinado o documento ou ter se envolvido na operação e acusa o regime de montar uma encenação para prejudicá-lo.

O aliado exilado em Miami, por sua vez, confirma ter firmado um contrato, mas que as ações previstas nele nunca foram realizadas. Segundo ele, após a assinatura, Goudreau passou a agir de forma errática e não foi capaz de provar que tinha a estrutura prometida.

A operação custaria em torno de US$ 500 milhões (R$ 2,9 bilhões), mas, segundo Rondón, houve uma negociação, que baixou o valor para US$ 219 milhões (R$ 1,2 bilhão).

O valor seria pago depois da queda de Maduro, com os ganhos de exportações de petróleo da Venezuela, sob o futuro governo de Guaidó, além de dinheiro a ser confiscado de membros do governo Maduro.

O ex-militar pediu US$ 1,5 milhão (R$ 8,7 milhões) adiantados. Rendón, porém, disse que deu apenas US$ 50 mil (R$ 291 mil), pagos do próprio bolso. "Antes do presidente Guaidó, estou nisso há 20 anos e sempre financiei esta luta. Quanto vale a liberdade da Venezuela?", afirmou.

Segundo o venezuelano, a confiança entre os dois lados se perdeu nessa época, em novembro, e a partir daí os opositores passaram a considerar que a ideia havia sido descartada. "Nunca demos luz verde", disse Rendón.

Goudreau, da Silvercorp, disse que decidiu seguir com a operação mesmo assim, por acreditar que era a coisa certa a fazer.

No final de abril, Rendón recebeu uma carta dos advogados de Goudreau cobrando US$ 1,45 milhão (R$ 8,44 milhões), que foi interpretada como uma tentativa de chantagem.

Há grandes suspeitas de que a operação foi infiltrada por agentes de Maduro ou que algum membro da oposição atuava como agente duplo.

Maduro disse na quarta que seus agentes sabiam de todos os detalhes da operação e que ficaram apenas esperando ela acontecer para então capturar os mercenários.

Agora, há temores de que a ditadura use essa operação como justificativa para prender Guaidó. A Procuradoria-Geral do país abriu inquérito para investigar sua participação.

O regime Maduro acusa o governo dos Estados Unidos de estar por trás dessa operação. "O presidente Donald Trump negou qualquer relacionamento entre a Silvercorp e seu governo, mas Jordan Goudreau está servindo de segurança para o presidente dos Estados Unidos", disse o ministro da Comunicação venezuelano, Jorge Rodríguez, ao divulgar uma fotografia de 18 de outubro de 2018 com Goudreau perto de Trump em um evento em Charlotte, na Carolina do Norte.

O governo Trump nega estar por trás destas ações. A Casa Branca "não tem nada a ver com o que aconteceu na Venezuela nos últimos dias", disse o secretário de Defesa dos EUA, Mark Esper.

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