Forças de Assad e Rússia bombardeiam regiões rebeldes na Síria
Cerca de 8,7 milhões de pessoas não dispõem de comida suficiente, segundo números da FAO e do PMA
A Rússia realizou nesta terça-feira (15) seus primeiros ataques aéreos sobre a Síria, partindo de seu porta-aviões no Mediterrâneo, enquanto a Aviação síria atingiu pela primeira vez em um mês bairros residenciais de Aleppo controlados pelos insurgentes - ações que, para Washington, violam as leis internacionais.
"Pela primeira vez na história da frota russa, o porta-aviões 'Almirante Kuznetsov' participou de operações armadas", fazendo decolar aviões Su-33, declarou o ministro russo da Defesa, Sergei Shoigu, durante uma reunião com o presidente Vladimir Putin e com o Estado-Maior.
Segundo ele, o Exército russo começou uma operação de magnitude contra posições da organização Estado Islâmico (EI) e da Frente Fateh al-Sham (ex-Frente al-Nusra, Al-Qaeda na Síria) nas regiões de Idleb e de Homs, no noroeste e centro do país, respectivamente. Essa operação também envolve a fragata russa "Almirante Grigorovich", que disparou mísseis de cruzeiro Kalibr.
De acordo com o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH), os ataques russos visaram as localidades de Saraqeb, Jisr al-Shughour, Ariha, Maaret al-Noomane, Kafar Nebbol, redutos da oposição, a qual controla quase toda a província.
O porta-aviões "Almirante Kuznetsov" chegou na semana passada ao largo da costa da Síria para reforçar a presença militar russa no país dilacerado pela guerra desde 2011 e onde Moscou realiza há mais de um ano uma operação em apoio às forças do governo do presidente Bashar al-Assad.
Enquanto isso, após uma pausa de um mês a pedido dos russos, o Exército sírio bombardeou áreas residenciais na parte leste da cidade de Aleppo, controladas por rebeldes, informou o OSDH.
Ainda segundo a ONG, nas últimas 24 horas, três hospitais situados em zonas rebeldes do norte da Síria foram atingidos pelos bombardeios. Vários médicos e pacientes ficaram feridos, acrescentou a fonte.
Os Estados Unidos condenaram os ataques aéreos russos e advertiram que bombardear alvos civis viola o Direito Internacional.
A porta-voz do Departamento de Estado americano, Elizabeth Trudeau, disse que Washington recebeu informes de que os últimos ataques de Moscou e do governo sírio tiveram como alvo clínicas e hospitais.
"Condenamos firmemente a retomada dos ataques aéreos da Rússia na Síria, assim como do regime sírio contra hospitais. Acreditamos que seja uma violação do Direito Internacional", afirmou Elizabeth Trudeau.
Essa declaração "demonstra mais uma vez a retórica do Departamento de Estado sobre a situação na Síria baseada em mentiras", reagiu o porta-voz do Ministério russo da Defesa, general Igor Konashenkov.
Os bombardeios são a primeira operação de grande envergadura na Síria desde a eleição de Donald Trump para suceder a Barack Obama na Casa Branca.
Em entrevista transmitida nesta terça-feira à noite (15) pela emissora pública portuguesa RTP, o presidente sírio declarou que Trump será "um aliado natural", se lutar contra o terrorismo.
"Não podemos dizer nada do que ele vai fazer, mas, vamos dizer que, se ele vai lutar contra o terrorismo, é claro que vamos ser aliados, aliados naturais da mesma maneira que somos dos russos, dos iranianos e de muitos outros países que querem derrotar o terrorismo", afirmou Assad na entrevista à RTP.
'Ataques aéreos e barris explosivos'
"As forças do regime realizaram ataques e lançaram barris de explosivos em vários bairros de Aleppo pela primeira vez desde 18 de outubro", disse o diretor do OSDH, Rami Abdel Rahman.
De acordo com um fotógrafo da AFP, os bairros de Sakhour e de Massaken Hanano foram alvos, com o OSDH evocando pelo menos cinco civis mortos e muitos feridos nos ataques.
O correspondente da AFP relatou seis ataques em Sakhour e dois barris de explosivos lançados sobre o bairro. Ele viu feridos sendo evacuados para hospitais e, pela primeira vez, aviões desviando para não serem atingidos por mísseis terra-ar.
As Forças Aéreas russa e síria tinham cessado seus ataques em 18 de outubro, três dias antes de uma trégua concebida por Moscou e Damasco.
Antiga capital econômica da Síria, Aleppo é um grande objetivo tanto para o governo do presidente Bashar al-Assad quanto para os insurgentes, que lutam desde 2011 em uma guerra cada vez mais complexa, que matou mais de 300.000 pessoas.
As forças governamentais tentam retomar o controle total desta que é a segunda maior cidade do país, dividida desde 2012 em setores rebeldes, a leste, e zonas sob o controle oficial, a oeste.
Produção alimentar em nível mais baixo
Após cinco anos de guerra, a produção de alimentos na Síria caiu a um mínimo histórico, alertaram nesta terça-feira a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e o Programa Mundial de Alimentos (PMA).
"A produção alimentar na Síria se encontra em um mínimo histórico (...), e o clima desfavorável em algumas regiões do país continua dificultando o acesso à terra, aos fornecimentos agrícolas e aos mercados", disseram as organizações.
Essas condições "tornam cada vez mais difícil para os agricultores manter seus meios de subsistência e alimentar em um país assolado pela guerra", acrescentaram.
Cerca de 8,7 milhões de pessoas - mais de um terço da população síria - não dispõem de comida suficiente, segundo números da FAO e do PMA divulgados em agosto.
De acordo com uma missão de avaliação conjunta da FAO e do PMA, na temporada 2015-2016, as áreas reservadas ao cultivo de cereais foram de 900 mil hectares, comparado ao 1,5 milhão de antes da guerra.
A produção mostra uma queda "ainda mais drástica", com 1,5 milhão de toneladas de trigo colhidas este ano, contra 3,4 milhões antes da guerra, ou 55% menos.