Putin diz apoiar a ideia de um cessar-fogo com a Ucrânia, mas quer discutir termos com os EUA
Ao lado do presidente da Bielorrússia, o líder russo diz concordar com proposta para encerrar as hostilidades no país vizinho, sem dar detalhes
Dois dias depois da Ucrânia declarar apoio a uma proposta de cessar-fogo por 30 dias no conflito que se arrasta há três anos em seu território, o presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que apoia a ideia da pausa temporária nos combates, embora tenha posto em xeque sua eficácia e declarado que são necessárias discussões antes da implementação.
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— A ideia é boa, e nós a apoiamos totalmente, mas há questões que precisamos discutir e acho que precisamos negociar com nossos colegas e parceiros americanos, talvez um telefonema com o presidente [Donald] Trump, mas a própria ideia de acabar com esse conflito por meios pacíficos nós apoiamos isso — afirmou o líder russo, ao lado do presidente da Bielorrússia, Alexander Lukashenko. — Concordamos com as propostas para interromper as ações militares. Mas partimos do fato de que essa cessação deve ser tal que leve à paz de longo prazo e elimine as causas iniciais desta crise.
Desde o anúncio do plano para um cessar-fogo de 30 dias para a Ucrânia, patrocinado pelos EUA e já aceito por Kiev, a Rússia vinha se esquivando de uma posição oficial: nas últimas semanas, o próprio Putin havia dito que não apoiava uma pausa temporária nos combates, por considerar que isso permitiria às forças ucranianas um reagrupamento, além de interromper os avanços em curso no leste da Ucrânia e na região de Kursk, parcialmente ocupada por Kiev.
Nesta quinta-feira, apesar de deixar a porta aberta para um acerto, o líder russo não deixou de lado o ceticismo que lhe é peculiar.
— Quem dará ordens para cessar as hostilidades? E quanto valerão essas ordens, ao longo de 2000 quilômetros (tamanho aproximado da fronteira entre os dois países)? Quem decidirá onde houve uma violação do possível acordo de cessar-fogo ao longo de toda a linha de 2000 quilômetros, e quem será culpado? Quem será responsabilizado pela violação do cessar-fogo? — questionou. — Como você sabe, as tropas russas estão avançando praticamente em todos os setores da linha de contato, e todas as condições estão lá para sitiarmos unidades razoavelmente grandes. Isso significaria que todos lá iriam embora?
O líder russo ainda elogiou as ações dos países do Brics para, segundo ele, chegar a uma solução para a guerra na Ucrânia.
— Todos nós temos o suficiente de nossos próprios assuntos atuais, mas muitos líderes de estados: o presidente da República Popular da China, o primeiro-ministro da Índia e os presidentes do Brasil e da República da África do Sul estão trabalhando nesta questão, dedicando muito tempo a ela. Somos gratos a todos eles por isso, porque esta atividade visa atingir uma missão nobre - acabar com as hostilidades e as perdas humanas — disse Putin
Pouco antes das declarações do presidente, um de seus conselheiros, Yuri Ushakov, afirmou à imprensa russa que Moscou não tinha interesse um cessar-fogo temporário, mas sim em um acordo que leve ao fim da guerra, de acordo com seus próprios termos.
Mais tarde, Ushakov amenizou suas posições, deixando aberta a porta para o diálogo, especialmente com os EUA.
Enquanto Putin conversava a portas fechadas com Lukashenko, um de seus principais aliados, o avião com uma delegação americana, capitaneada pelo enviado especial de Donald Trump, Steve Witkoff, chegava a Moscou para um diálogo com o alto escalão do governo russo, incluindo Putin.
Um eventual sinal verde da Rússia ao cessar-fogo, contrariando uma posição até agora contundente de Putin, não deixaria de ser interpretado como um gesto positivo para Trump, cujo governo o Kremlin vê como a principal chance para quebrar o isolamento enfrentado desde o início da guerra.
Os russos apostam que as negociações para o fim da guerra, a começar com a pausa temporária, possa levar a conquistas mais abrangentes, como o fim das sanções — são mais de 21 mil em vigor — e, a curto prazo, o retorno de diplomatas a Washington.
Na entrevista coletiva, Lukashenko, também alvo de sanções e chamado com frequência de "o último ditador da Europa", afirmou que um acerto entre as duas maiores potências nucleares do planeta acenderia um sinal de alerta entre os europeus.
— Se a Rússia concordar com os Estados Unidos, a Ucrânia e a Europa estarão acabadas. O processo de negociação entre a América e a Rússia mantém o destino da Europa em suas mãos — afirmou Lukashenko, no poder desde 1994.
— E, novamente, eles não vão nos enganar. Conhecemos nossos interesses. Conhecemos nossos objetivos.
Contudo, ele deu um aviso ao seu aliado.
— Eu apenas aconselho você: não caia nos truques do Donald — concluiu.
Durante as conversas, Rússia e Bielorrússia assinaram uma declaração conjunta na qual concordam em "continuar a coordenar suas posições em relação às atividades da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e seus países membros que visam criar desafios e ameaças à segurança", acusando a aliança militar de realizar "ações desestabilizadoras" na Europa.
O texto cita a União Europeia, acusada de ter uma "natureza agressiva e conflituosa", opera de forma "prejudicial ao desenvolvimento internacional e sustentável e consideram inaceitável a pressão política exercida sobre terceiros países por meio de mecanismos de sanções ilegítimos".