Saiba o que é Guantánamo, prisão militar que Trump transformou em centro de detenção de imigrantes
Primeiros voos como migrantes irregulares foram enviados pelo governo americano para a base naval em Cuba nesta terça-feira
Os Estados Unidos enviaram, nesta terça-feira, os primeiros voos com migrantes irregulares para a Baía de Guantánamo, em Cuba, onde Washington mantém uma base militar há mais de 20 anos.
O local é conhecido por já ter abrigado centenas de prisioneiros acusados de terrorismo, incluindo alguns membros da al-Qaeda, mas, segundo o New York Times, também tem sido usada há décadas para encarcerar alguns migrantes interceptados no mar.
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Na semana passada, em meio à ofensiva anti- imigração lançada desde sua chegada ao cargo, o presidente americano, Donald Trump, ordenou que a instalação se preparasse para receber 30 mil estrangeiros e disse que enviaria "criminosos" em situação irregular, o que o líder cubano, Miguel Díaz-Canel, chamou de "ato de brutalidade". De acordo com o NYT, os imigrantes e os prisioneiros acusados de terrorismo estão sendo mantidos em áreas separadas da instalação.
Décadas de prisões
O território cubano de Guantánamo passou a ser usado pelos Estados Unidos a partir de 1943, quando os países assinaram um acordo perpétuo em que o país americano aluga 72 quilômetros da Baía pela bagatela de US$4.085 por ano.
Nos primeiros anos, os americanos usaram Guantánamo para abrigar um centro de processamento de imigrantes, mas decidiram abrir uma prisão na região logo após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001. A prisão de Guantánamo foi inaugurada em janeiro do ano seguinte em uma base naval americana localizada na costa sudeste de Cuba.
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O centro de detenção foi habilitado após os ataques às Torres Gêmeas, durante o mandato do presidente George W. Bush, para receber prisioneiros chamados de "combatentes inimigos", a quem se negavam muitos dos direitos que um detido tem em solo americano.
Os presidentes democratas Barack Obama e Joe Biden tentaram fechar a instalação, mas enfrentaram a oposição do Congresso.
Imigrantes presos no passado
Em setembro passado, o jornal New York Times apontou que a base militar também havia sido usada por décadas pelos Estados Unidos para prender imigrantes interceptados no mar, mas em uma área separada daquela usada para abrigar acusados de terrorismo.
Um número relativamente pequeno de imigrantes foi enviado para essas instalações. Segundo o jornal, apenas 37 ficaram detidos ali entre 2020 e 2023, mas esse número pode subir drasticamente após o anúncio de Trump.
Em seu segundo mandato, o magnata republicano colocou em prática o que considera uma ofensiva contra a imigração irregular, com operações, prisões e deportações em aviões militares.
15 presos restantes
Das quase 800 pessoas detidas por suspeita de pertencer a grupos terrorista ou de praticar crimes relacionados ao terrorismo que estão em Guantánamo desde 2002, restam apenas 15 reclusos, cujas idades variam entre 45 e 63 anos. Eles são do Afeganistão, da Indonésia, do Iraque, da Líbia, do Paquistão, da Arábia Saudita, da Somália e do Iêmen. Um deles é um muçulmano rohingya apátrida; outro é palestino.
Três desses quinze reúnem as condições para serem transferidos, outros três podem ter seus casos revistos, sete enfrentam acusações e outros dois foram condenados e sentenciados, informou no começo do mês passado o Departamento de Defesa, ao anunciar a libertação de 11 iemenitas presos em Guantánamo.
Todos os prisioneiros, exceto três, foram transferidos para Guantánamo da rede secreta de prisões da CIA no exterior, onde o governo Bush escondeu pessoas que considerava as “piores das piores” até 2006.
O prisioneiro que está há mais tempo preso é Ali Hamza al-Bahlul, que foi trazido do Afeganistão para a base no dia em que a prisão foi inaugurada, quatro meses após os ataques de 11 de setembro de 2001. Ele é o único prisioneiro que atualmente cumpre pena de prisão perpétua.
Nos primeiros anos da operação de detenção, alguns dos prisioneiros mais jovens eram adolescentes. Hoje, o mais jovem é Walid bin Attash, de 45 anos, réu no caso do 11 de setembro, que fez um acordo para se declarar culpado em troca de prisão perpétua em vez de enfrentar um julgamento com pena de morte. O mais velho é Abd al-Hadi al-Iraqi, 63, que é o prisioneiro com maior deficiência física na Baía de Guantánamo. Ele foi condenado por ter cometido crimes de guerra no Afeganistão em 2003-04.
A prisão tem sido usada exclusivamente para suspeitos de pertencerem à al-Qaeda e ao Talibã ou a seus associados. Nenhum deles era mulher ou cidadão americano.
Presos famosos
Guantánamo é a prisão de vários dos acusados de conspirar para realizar os ataques do 11 de setembro, entre eles o autoproclamado cérebro dos atentados, Khalid Sheikh Mohammed. Entre os reclusos está o homem apontado como mentor do ataque contra o navio USS Cole no ano 2000, Abd al Rahim al Nashiri, capturado em 2002 e transferido para Guantánamo em 2006.
Preocupação com os direitos humanos
As condições em Guantánamo provocaram protestos de grupos de defesa dos direitos humanos. Especialistas das Nações Unidas condenaram a prisão.
Entre as polêmicas envolvendo o local está a prática de alimentar à força prisioneiros em greve de fome. Militares americanos defenderam a medida como um tratamento médico necessário, embora os críticos a comparem a tortura.
O processo é realizado inserindo uma sonda pelo nariz, até o estômago do réu, e bombeando um líquido contendo nutrientes.
Por que Guantánamo ainda não foi fechado?
O Congresso americano não permite. Todos os anos, ele adota uma legislação que proíbe a transferência de qualquer detento de Guantánamo para solo americano por qualquer motivo.
Além disso, é provável que a CIA se oponha às transferências para outros países de seus ex-prisioneiros que tenham conhecimento de informações confidenciais relacionadas à sua detenção, como as identidades das pessoas que, segundo eles, os torturaram.
Por enquanto, as agências de inteligência dos EUA monitoram todas as suas comunicações para garantir que eles não divulguem segredos de Estado.
Quanto custa manter Guantánamo aberta?
Não se sabe o valor exato. O último estudo abrangente sobre os custos de funcionamento da prisão, realizado pelo New York Times em 2019, estimou o valor em mais de US$ 13 milhões por ano para cada prisioneiro. A maior parte desse valor foi destinada a apoiar as operações do sistema judiciário e a equipe da prisão.
Na época, havia 40 prisioneiros e uma equipe do Pentágono de 1.800 forças americanas. Por esse cálculo, custaria US$ 36 milhões para manter cada prisioneiro lá em 2025. Mas os custos operacionais mudaram. O Pentágono reduziu a equipe em mais da metade e contratou mais prestadores de serviços, que podem ser mais caros do que os soldados que cumprem missões de nove meses.
Os procedimentos do tribunal de guerra custaram centenas de milhões de dólares em salários, infraestrutura e transporte. Desde 2019, o Escritório de Comissões Militares adicionou duas novas salas de audiência, novos escritórios e alojamentos temporários, mais advogados, mais pessoal de segurança e mais contratados.
Cada vez mais, os custos das operações dos tribunais são considerados segredos de segurança nacional e não estão sujeitos ao escrutínio público. Mas surgem alguns indícios. Os promotores pagaram a um psiquiatra forense US$ 1,4 milhão em honorários de consultoria no caso do 11 de setembro.