Sem papanicolau: exame do HPV com coleta em casa avança no Brasil
Embora bastante sensível e confiável, análises não substituem ida anual ao ginecologista para avaliar quadro geral de saúde
A Dasa anunciou que oferecerá, a partir da primeira semana de outubro, um novo tipo de teste para detectar papilomavírus humano (HPV) em que a própria paciente poderá coletar o material de análise em casa, sem a necessidade do uso de instrumentos desconfortáveis como espéculos, utilizados no exame de papanicolau no laboratório.
A amostra será colhida com uma pequena escova plástica que lembra o aplicador de máscara de cílios. Após a retirada do material, a coleta deve ser deixada em uma unidade da rede para a obtenção do resultado.
— O resultado que a paciente vai encontrar ao fazer esse teste é equivalente ao que ela teria a partir de uma coleta de consultório — diz Natalia Gonçalves, especialista na área de reprodução humana na rede de saúde. — Ele é recomendado para mulheres entre 25 e 64 anos, com vida sexual ativa. O exame é uma análise fundamental para os subtipos que estão associados ao HPV de alto risco, por sua vez ligado ao câncer de colo de útero.
O exame mira especialmente aos tipos 16 e 18 do vírus HPV, os mais perigosos por sua relação com casos de câncer de colo de útero e outras alterações do tipo.
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No mecanismo do exame ocorre a genotipagem — que é a busca pelo DNA do vírus. Dessa maneira é possível antecipar o diagnóstico da infecção antes mesmo que ela cause efeitos no organismo. O exame popularmente conhecido como papanicolau (que segue útil para outros tipos de análise) indica a doença em uma fase posterior, por meio de alteração nas células.
Não se trata da primeira solução do tipo no mercado, mas a chegada da nova marca pode ampliar mais o acesso, dizem especialistas. Com a autocoleta, os especialistas em saúde acreditam que mais pessoas que sentem-se constrangidas em procurar exames “íntimos” possam voltar a fazer as análises para rastreio do vírus.
— A autocoleta é importante para trazer, em primeiro lugar, o conforto pra quem não colhe por questões de mobilidade ou de religiosidade — pondera Claudia Cohn, diretora de negócios institucionais da Dasa.
Mudanças no SUS
A possibilidade da autocoleta surge na esteira de uma mudança de grande porte no sistema público de saúde. Neste ano, ano o Ministério da Saúde iniciou a implementação de um teste de biologia molecular DNA-HPV no Sistema Único de Saúde (SUS). Ou seja, usando o mesmo tipo de análise dos exames privados com autocoleta. O mecanismo, no SUS feito em ambiente hospitalar, poderá identificar 14 genótipos do HPV, indicando a presença do vírus no organismo antes da ocorrência de lesões ou câncer em estágios iniciais.
Um tipo de autocoleta, anunciou recentemente a pasta, deverá ser adotado pelo governo federal em cenários específicos. Em nota divulgada recentemente, a pasta afirmou que usará as autocoletas em “populações com dificuldade de acesso aos serviços de saúde ou resistência à realização do exame”.
Embora as autocoletas de testes para HPV figurem como um avanço no rastreio da infecção, elas não substituem a visita anual necessária ao ginecologista. É isso que diz Agnaldo Lopes da Silva Filho, diretor científico da Federação Brasileira das Associações em Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Há outros rastreios e aspectos da saúde da mulher, ele diz, que precisam ser avaliados com alguma periodicidade.
— Dá mais liberdade para as mulheres, mas não substitui as consultas — afirma. — A rotina é importante, assim é possível rastrear outras infecções para conversar sobre padrões menstruais, ver sangramentos pós-menopausa, avaliar terapias hormonais.
Alexandre Naime Barbosa, chefe do serviço de infectologia da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) afirma que os testes moleculares, em geral, permitem que o rastreio para HPV seja feito uma vez a cada cinco anos. Isso porque esse tipo de análise é bastante sensível e as infecções por HPV têm um longo período de latência até indicarem as primeiras manifestações.
— Mesmo que essa pessoa tenha contato com HPV não é imediatamente que terá lesões. Sem a positividade do teste molecular, o rastreio ocorre a cada cinco anos. Se o exame vir positivo, será preciso fazer colposcopia (exame para visualizar em detalhe a região ginecológica) — afirmou.
Os especialistas, por sua vez, concordam que o aumento de tecnologias em relação ao HPV podem ser trunfos no trabalho de rastrear e evitar casos de câncer.
— Precisamos disso, já sabemos tudo o que precisamo do HPV. E (os cânceres causados por eles) podem ser evitáveis. Todo o controle passa por exames de rastreio e vacinação — afirma Agnaldo Lopes da Silva Filho.

