STF pode determinar medidas após libertação de Bacellar, como uso de tornozeleira, diz especialista
Parlamentares avaliam que revogação da prisão de Bacellar ocorra pouco depois de STF receber comunicação formal de decisão da Alerj
Após a aprovação, pela Assembleia Legislativa (Alerj), da soltura do presidente afastado da Casa, Rodrigo Bacellar, os próximos passos são a publicação da decisão da Casa em Diário Oficial — prevista para a edição de hoje — e o envio imediato da deliberação ao Supremo Tribunal Federal (STF). Nos bastidores, parlamentares avaliam que a revogação da prisão de Bacellar deva ocorrer pouco depois de o STF receber a comunicação formal da Alerj. Embora não exista prazo definido, a expectativa é de que a análise seja rápida.
Deputados também apostam que o ministro Alexandre de Moraes, que determinou a prisão, deverá manter o afastamento de Bacellar do cargo como medida cautelar. A possibilidade, porém, ainda divide opiniões dentro da Casa, especialmente entre aliados mais próximos do presidente afastado.
Na sua decisão, Moraes destaca que há “fortes indícios” da participação de Bacellar em uma organização criminosa. O ministro afirma que o presidente da Alerj estaria atuando ativamente pela “obstrução de investigações envolvendo facção criminosa e ações contra o crime organizado, inclusive com influência no Poder Executivo estadual”. Bacellar foi preso por suspeita de vazamento da operação Zargun, que tinha como principal alvo o deputado Thiego Raimundo dos Santos, conhecido como TH Jóias, preso em setembro, sob suspeita de ligação com o Comando Vermelho (CV).
Leia também
• Alerj decide soltar Rodrigo Bacellar, preso por suspeita de vazar operação
• CCJ da Alerj aprova resolução para revogar prisão de Rodrigo Bacellar
• CCJ abrirá sessão que decide sobre prisão de Bacellar; decisão sobre afastamento do presidente segui
“Todos esses elementos descortinam a existência de um verdadeiro estado paralelo, capitaneado pelos capos da política fluminense que nos bastidores vazam informações que inviabilizam o sucesso de operações policiais relevantes contra facções criminosas violentas, a exemplo do Comando Vermelho”, diz um trecho da investigação da PF, que consta da decisão de Moraes.
Outras medidas
Especialista em Direito Administrativo e Constitucional, o advogado Tiago Francisco da Silva explica que, ao acatar a decisão de soltura da Alerj, o STF pode impor outras medidas cautelares, além da manutenção do afastamento do cargo:
— O Ministro Moraes pode determinar ainda condições como o uso de tornozeleira eletrônica; a proibição de contato com outros investigados ou testemunhas; e a proibição de frequentar determinados locais. Essas medidas visam a garantir o andamento da investigação sem cercear totalmente o mandato parlamentar, respeitando a decisão da Alerj pela soltura, mas mantendo a supervisão judicial sobre o caso.
Para respaldar a deliberação da Alerj, o especialista cita o artigo 53 da Constituição Federal que trata do princípio da imunidade parlamentar. Ou seja, diz, a prerrogativa de sustar a prisão “é uma garantia constitucional da Casa Legislativa, visando a preservar a independência do Poder e evitar interferências indevidas no mandato parlamentar”.
— Decorrente do princípio da imunidade parlamentar, o parágrafo 2º do artigo 53, prevê que “os membros do Congresso Nacional, desde a expedição do diploma, não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, resolva sobre a prisão”. A prisão preventiva do deputado Rodrigo Bacellar foi decretada por suspeita de obstrução de investigação sobre facção criminosa, o que se enquadra na exceção que permite a prisão cautelar de parlamentares — explica.
Segundo Tiago, legalmente a palavra final sobre a prisão cabe ao Parlamento — no caso em questão à Alerj —, cuja decisão “é soberana e de natureza política”.
Outro especialista em Direito Administrativo e Constitucional, Hermano Cabernite também cita o artigo 53 da Constituição Federal, Para ele, o dispositivo não se limita ao Congresso Nacional: — Em 8 de maio de 2019, o STF decidiu que as Assembleias Legislativas estaduais têm competência para rever ou sustar prisões e medidas cautelares impostas a deputados estaduais, estendendo a eles a imunidade relativa à prisão prevista para deputados federais e senadores. A decisão causou impacto em casos de prisões decretadas contra deputados estaduais, como por exemplo no Rio de Janeiro.
Cabernite, porém, entende que o dispositivo constitucional dispõe apenas sobre prisão. O que, no seu entender, “não abrange outras medidas restritivas”.
A reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) concentrou-se apenas na discussão sobre a constitucionalidade da prisão de Bacellar, não deliberando sobre o eventual afastamento do parlamentar, movimento que pode ser atribuído ao receio do presidente da CCJ, Rodrigo Amorim, de confrontar o ministro Moraes — algo que ele próprio admitiu.
Nova prisão
Para o jurista e professor Lenio Streck, como os deputados decidiram, por maioria, pela soltura de Bacellar, não caberia à Casa adotar medida que implicasse seu afastamento.
Em sua decisão, Moraes menciona a prisão preventiva e, consequentemente, o afastamento do deputado. Para Lenio, porém, a deliberação da Alerj encontra respaldo na Constituição do Estado do Rio de Janeiro: — A Alerj revogou a prisão e, ao fazê-lo, exerceu seu poder. Não me parece que caibam outras medidas restritivas.
Questionado se o ministro poderia impor novas cautelares caso a PF indiciasse Bacellar diante dos mais de R$ 90 mil encontrados em seu carro no momento da prisão, Lenio afirmou que isso seria possível: — A palavra mágica é “fatos novos”. Sobre os fatos velhos, já conhecidos, a Alerj já se manifestou. Moraes tem que cumprir o que a Assembleia decidiu. Daqui a pouco ele pode prender de novo.
Além disso, a PF já iniciou a extração dos dados dos três celulares de Bacellar. Caso surjam indícios de vínculo do parlamentar com o crime organizado, novas medidas cautelares — inclusive uma nova prisão — poderão ser solicitadas.

