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Tubarão, folia, cólera, vida, morte: o 29 de fevereiro nos últimos cem anos

Uma retrospectiva pelos últimos anos bissextos em Pernambuco

Ano bissextoAno bissexto - Foto: Arthur de Souza | Montagem: Paccelly Viana

O que têm em comum a morte de um homem em ataque de tubarão, show de Ivete Sangalo, cólera, enterro de um bispo assassinado pelo filho, fechamento do Hotel Castelinho e o sucesso estrondoso do jingle Davanira no Carnaval? Todos esses acontecimentos ocorreram em ano bissexto, numa data como este 29 de fevereiro. A despeito de previsões alarmistas ou alvissareiras, o fato é que, nestes cem anos, já somando este sábado, são 26 dias extras - ou seja, 624 horas a mais na contagem dos homens para imprevistos, alegrias, tragédias, morte e vida. 

Duvida? Vejamos: na quarta-feira 29 de fevereiro de 2012, 203 candidatos vibraram com a classificação no resultado do concurso do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que somou mais de 118 mil inscritos. Também em Pernambuco, Débora Bezerra era só emoção ao dar à luz, na madrugada daquele dia, Igor Mateus Souza. "Foi um parto tranquilo. Ele só vai envelhecer de quatro em quatro anos; assim vai ser sempre um jovem lindo", comentou, rindo. Mas foi também nesse dia que centenas de moradores se despediram do bispo da Igreja Anglicana dom Edward Robinson Cavalcanti e da eposa dele, Miriam Cavalcanti. O casal havia sido assassinado a facadas pelo filho Eduardo Cavalcanti, na casa da família, em Olinda, Região Metropolitana do Recife (RMR). O sepultamento, ao som do hino "Mensagem de amor", foi realizado no Cemitério Morada da Paz, em Paulista, também na RMR. A data ainda marcou o encerramento no Recife da Natan, famosa joalheria que funcionou por 35 anos no bairro de Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, e que chegou a ser representante no País das marcas Tiffany, Cartier e Bulgary.

Foi também num 29 de fevereiro que parou de funcionar o Hotel Castelinho, na Zona Sul do Recife. O prédio, um dos mais antigos da orla de Boa Viagem, já havia sido tombado pela Prefeitura do Recife naquele ano de 1996, mas foi nesse dia extra que diretores e funcionários tiraram os últimos documentos e móveis do local, até então ponto tradicional de eventos na beira-mar do Recife. O dia era uma quinta-feira e foi também numa quinta de um ano bissexto, porém de 1940 e em plena Segunda Guerra Mundial, que uma escola japonesa foi fechada em Marília, São Paulo. O endereço, onde antes havia duas escolas brasileiras, funcionava clandestinamente segundo a autoridade escolar da região, e de lá foram apreendidos 2 mil livros escritos em japonês.



Nesses últimos cem anos, o dia extra caiu num sábado outras três vezes - a última havia sido no Sábado de Zé Pereira de 1992, um Carnaval embalado pelo hit Davanira. Criado pelo publicitário Carol Fernandes para as Casas José Araújo e estrelado por Veruska Luna, então com 13 anos, o jingle caiu na boca dos foliões. Apesar da alegria do frevo, todos precisaram ser mais cautelosos naquela folia, que, a exemplo de 2020 com o novo coronavírus, foi em meio a temor de doença. Assolava o cólera em Pernambuco e, naquele dia, mais cinco pessoas eram internadas com suspeita da doença, que no dia seguinte virava epidemia no Estado, com 147 casos e três mortes.

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Outro 29 de fevereiro em pleno Carnaval ocorreu em 1960. Naquela segunda-feira de folia, houve um feminicídio - não com essa palavra, que é recente. Enquanto os foliões caíam no frevo, José Pereira Domingos matava a esposa a facadas. Segundo relato, em meio a uma discussão do casal, ele, que estava alcoolizado, esbofeteou a mulher e depois tirou a faca da cintura e a atacou. O crime foi um dos mais violentos da época, que teve ainda registros de arrombamento de casas, nos quais foram levados trancelins de ouro, relógio e calças de linho. Também aconteceu o arrombamento da Igreja do Espírito Santo, localizada na Praça 17, por trás do então Grande Hotel (hoje Fórum Thomaz de Aquino), em frente ao Rio Capibairbe, no bairro de Santo Antônio.

Ataque de tubarão em Piedade

Ataque de tubarão em Piedade - Foto: Arthur de Souza/Folha de Pernambuco

O domingo pós-Carnaval de 2004 teve Camburão da Alegria e Camburãozinho na avenida Boa Viagem, mas também ataque de tubarão na vizinha praia de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, na RMR. Ignorando aviso dos bombeiros para não avançar a linha de risco, quatro metros mar adentro, Edmilson Henrique dos Santos, 29 anos, nadava às 15h cerca de 30 metros distante da faixa de areia quando foi mordido. O homem teve parte da coxa direita arrancada, foi levado ao Hospital da Aeronáutica, mas já chegou sem vida. "Escutei um grito forte de mulher e corri para a janela. Vi quando o rapaz dava cambalhotas no mar. Achei que estivesse nadando. Depois o sangue tomou conta de grande parte das águas", contou o comerciante Mozart Soares, que viu a cena de horror do apartamento. O ataque, próximo à Igreja de Piedade, foi, à época, o 13º no local em 12 anos.

Não foi Carnaval, mas o 29 de fevereiro de 2000 transcorreu em clima de alegria para os foliões pernambucanos. No Recife, havia a semana pré-carnavalesca na avenida Boa Viagem e, naquela terça, a noite terminava com Ivete Sangalo animando o bloco Cerveja e Companhia. Antes, outra notícia boa para quem pretendia curtir o feriado nas praias do Litoral Sul pernambucano: o vice-presidente Marco Maciel havia autorizado que fosse liberado, durante o Carnaval, trecho de 7,8 km BR-101 Sul entre a rótula da Randon e a interssecção com a PE-37. Outro ano bissexto 'redondo', 1980 viu, nesse dia a mais, ser lançado o Projeto ProMorar no Recife, com a presença do ministro do Interior, Mário Andreazza, que colocou o primeiro tijolo do conjunto que seria erguido na Vila Redenção Apulso, no Engenho do Meio, na Zona Oeste da cidade. O programa visava a construir 38.200 moradias em substituição a 29 favelas na região.

Chuvas
O último 29 de fevereiro antes deste sábado, em 2016, foi marcado por chuvas, que levaram caos a São Paulo - como no início deste 2020. Naquela madrugada, um casal morreu soterrado em São Sebastião, no Litoral Norte. Em Pernambuco, uma das maiores tragédias em um ano com 366 dias aconteceu em 2008, quando uma tentativa de assalto a um ônibus deixou dois mortos e cinco feridos. Com cerca de 60 passageiros a bordo, o coletivo da Linha Curado II, da Borborema, trafegava pela BR-232, em Jaboatão, onde, por volta das 14h, uma dupla anunciou o assalto, mas um homem reagiu e atirou. No tiroteio, os dois suspeitos morreram e quatro passageiros e um cobrador ficaram feridos. "Um [dos suspeitos] ficou o tempo todo dizendo que atiraria na minha cabeça", contou, em entrevista, o motorista do ônibus Severino José dos Santos, 51 anos e que, até ali, passava pelo oitavo assalto.

Se em 2016 havia ônibus, em 1904 - primeiro ano bissexto do século 20 - o cenário no transporte era diferente. A madrugada daquela segunda-feira foi marcada pela greve dos cocheiros - que conduziam cavalos e carruagens - no bairro de São Cristóvão, no Rio de Janeiro. A paralisação, no entanto, só durou poucas horas depois da intervenção da polícia. No mundo, a novidade da data foi a assinatura, em Roma, do tratado comercial entre Itália e Alemanha, países que se envolveriam, dali a dez anos, na Primeira Guerra Mundial.

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