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Vida marcada pela violência

A equipe do Ceav bate palmas no portão e alguém diz que Maria Isis já está vindo.

Priscila Krause é deputada estadual pelo DEMPriscila Krause é deputada estadual pelo DEM - Foto: Cecilia Sá Pereira/Divulgação

A rua é de lama. A equipe do Ceav bate palmas no portão e alguém diz que Maria Isis já está vindo. Ela vem caminhando dos fundos do terreno. Tem cerca de 50 anos, usa camiseta e minissaia. A advogada Elaine explica o que estamos fazendo ali; além da matéria, uma nova visita para, quem sabe, levar Isis para a psicoterapia. Viúva há 11 anos, ela encuba ainda a morte de dois filhos. Um bandido e um “bom”. Ela chora pelos dois. Maria Isis até gostaria, mas não é amante de protagonista de novela: tem uma vida com muitos casos reais de violência. Além dos dois filhos mortos, há um preso, que ela mesmo denunciou. José fumava muita pedra, acabou com tudo. “Ele me deixou sem um copo pra tomar água. Sou proibida pela polícia de visitar ele. Mas me arrependi de ter denunciado. Não vou mentir, fiz na hora da raiva”, assume, com culpa de mãe.

O outro menino, João, saiu do presídio num dia 30 de outubro. Em 15 dias, foi assassinado na vizinhança. Ela tinha alugado uma parte da casa para um pastor evangélico. O culto estava acontecendo. Isis chama o filho para assistir a um testemunho de um rapaz, ex-traficante, que dizia ter largado tudo para abraçar a igreja. Dali, só o viu saindo com um amigo. Chamou de volta. “Ele olhou pra trás e disse: ‘daqui a pouco eu volto, mainha’. Só”. Morreu de tiro.

Quando o pastor achou outro lugar para os cultos, Isis abriu ali um bar. Foi o cenário da morte de Julio, o segundo filho. Ela já ia fechar, mas deu um tempo para uma cerveja para os filhos e uns amigos. “Ia dar meia noite e chegaram uns caras. Disseram que era um assalto. Mataram meu sobrinho e deixaram meus dois filhos baleados”. Julio foi socorrido e morreu dias depois. O outro sobreviveu, com sequelas.

Isis diz que entende o trabalho do Ceav, mas não sabe explicar. A assistente social Alexsandra ajuda: “o mais importante não é saber o que aconteceu com vocês, mas saber o que podemos fazer para amenizar essa dor”. Isis só balança a cabeça. Continuou negando que precisasse de terapia. “Só resolveria se os caras que fizeram isso morressem”, ela diz. Ninguém intervém no desabafo. “A dor que sinto me sufoca. Tem dia que tenho ódio de tudo e de todos. Entendeu? Só presto para estar em casa”. Ela me olha, esperando a próxima pergunta. - A senhora acha que errou em algo? Isis nega com a cabeça. “Se errei, eu não sei em quê. Criei eles aqui, estudando, mas acho que quando a pessoa não quer, não tem quem faça”.

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