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RIO DE JANEIRO

Bacellar x Reis: entenda como demissão feita pelo governador interino precipita guerra pela sucessão

Escalada do embate vai na contramão dos conselhos de auxiliares do chefe do Executivo estadual

Governador do Rio de Janeiro, Cláudio CastroGovernador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro - Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Sem ter passado pelo crivo do governador Cláudio Castro (PL), que está de licença em viagem internacional, a demissão do secretário estadual de Transportes, Washington Reis (MDB), deflagrou na quinta-feira uma cisão na base do Palácio Guanabara tendo como pivô o presidente da Assembleia Legislativa (Alerj), Rodrigo Bacellar (União). De olho na própria candidatura ao governo em 2026, Bacellar aproveitou o período como governador em exercício durante a ausência de Castro para publicar a exoneração de Reis, visto como concorrente na próxima corrida estadual.

A movimentação implodiu a tentativa do entorno de Castro de costurar uma “agenda positiva” para Bacellar nos seus períodos à frente do Executivo estadual. O plano original envolvia ações apadrinhadas pelo presidente da Alerj na área de transportes e um pacto de não agressão com Reis.

Bacellar, que busca o apoio do bolsonarismo para concorrer ao governo, referiu-se ao agora ex-secretário como “insubordinado” e procurou associá-lo ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ao prefeito da capital, Eduardo Paes (PSD), que são rivais de Castro. Reis, por sua vez, disse que a assinatura do governador em exercício na sua demissão “não vale nada” e garantiu ter respaldo de Castro.

No momento em que a demissão de Reis foi publicada em edição extra do Diário Oficial, Castro estava incomunicável em um voo rumo a Lisboa, onde participará de um fórum jurídico. Antes de viajar, o governador havia desmentido rumores de que anteciparia sua saída do governo para abrir espaço a Bacellar. Castro planeja se desincompatibilizar do Executivo estadual em março do ano que vem, no prazo exigido pela legislação, para concorrer ao Senado em 2026.

Bacellar, por sua vez, vinha pressionando o titular do Palácio Guanabara para assumir as rédeas do governo o quanto antes. Na quinta-feira, o governador em exercício confirmou ter tomado a decisão de demitir Reis sem consultar Castro.

— Tenho minha forma de fazer política e não posso ter no quadro de secretários, respondendo interinamente pelo governo, um político insubordinado, com quem não tenho diálogo. Ele já escolheu o lado dele: está com Lula e Paes. Eu estou com Bolsonaro — afirmou.

Reis ironizou a atuação do governador em exercício e acusou Bacellar de tentar pressioná-lo nas últimas semanas. O agora ex-secretário citou sua convocação para depor na CPI da Transparência da Alerj, em um movimento articulado por Bacellar no início da semana.

— Não considero a exoneração, a assinatura desse rapaz não vale nada. Não foi eleito governador. Não tem tamanho nem para ser síndico de prédio. O governador me ligou ontem (quarta-feira) dizendo para eu trabalhar tranquilo, que sou aliado dele. Aí o presidente da Alerj, que é uma vergonha, se comporta dessa maneira — disse Reis.

A escalada do embate entre Bacellar e Reis vai na contramão dos conselhos de auxiliares de Castro, que orientavam o presidente da Alerj a buscar uma pacificação com o cacique do MDB. A avaliação do entorno do governador é de que a rivalidade pode prejudicar não apenas uma candidatura de Bacellar ao governo, mas também a empreitada do próprio Castro ao Senado — já que uma das opções ventiladas por Reis é concorrer a uma das duas cadeiras de senador em 2026.

Articulação frustrada
Numa tentativa de neutralizar o “fator Reis”, aliados de Castro haviam estimulado Bacellar a propor um acordo para tirar o secretário de Transportes da corrida majoritária. As possibilidades envolviam a negociação de uma vaga no Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) para o próprio Reis — a mesma estratégia usada por Bacellar para tirar da linha sucessória o ex-vice-governador Thiago Pampolha, que aceitou esse posto — e um possível apoio para que o deputado estadual Rosenverg Reis (MDB), irmão do secretário, chegasse à presidência da Alerj.

Em outra frente, Castro vinha costurando uma estratégia para que Bacellar apadrinhasse uma medida de redução das tarifas de trem e metrô, de R$ 7,90 para R$ 4,70, que chegou a ser anunciada por Reis em maio. O então secretário, à época, foi desautorizado por Castro por causa do temor de que a medida virasse um trunfo eleitoral para o político do MDB.

O plano deu sinais de que cairia por terra quando Bacellar, na segunda-feira, travou uma dura discussão com Rosenverg Reis no plenário da Alerj, durante uma sessão em que os deputados estaduais aprovaram a convocação do secretário de Transportes para depor em uma CPI. Na ocasião, após Rosenverg dizer que Bacellar “é quem comanda o estado”, o presidente da Alerj rebateu dizendo que “o buraco é mais embaixo” e pediu para não ser “confundido” com Castro.

A demissão durante o período de interinidade de Bacellar pegou de surpresa o entorno de Castro e lideranças de partidos da base do governador. Reservadamente, personagens influentes no governo estadual avaliam que o estilo “imprevisível” de Bacellar pode dificultar a costura de alianças em torno de sua candidatura.

O episódio também se soma a uma crise interna no Palácio Guanabara, c omo mostrou na quarta-feira a newsletter Jogo Político, que envolve uma possível debandada de aliados de Castro diante da insatisfação com a condução política do governo. O marqueteiro Paulo Vasconcelos, que fez a campanha vitoriosa da reeleição de Castro em 2022, decidiu se afastar. Outro que ameaça deixar o barco é o chefe de gabinete, Rodrigo Abel.

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