CPI do Crime Organizado: relator quer 'mapa' de 70 facções e cobra mais verbas para segurança
Senador Alessandro Vieira diz que 'diagnóstico completo' é necessário para o enfrentamento
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Crime Organizado, instalada na terça-feira (4), começa os trabalhos com previsão para ouvir governadores e outras autoridades, incluindo o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.
O relator, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), tem entre os eixos de apuração o mapeamento de cerca de 70 grandes facções existentes no país e a elaboração de um plano de segurança pública.
A instalação da CPI, criada para investigar a atuação de facções e milícias em todo o país, ganhou força após a megaoperação no Rio de Janeiro contra o Comando Vermelho que deixou 121 mortos, incluindo quatro policiais.
A comissão será presidida pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES) e o vice será o senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
Apesar de a presidência ter ficado com um governista, o Planalto deve sofrer com uma série de críticas na CPI. Na terça-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, em entrevista a correspondentes internacionais, que a megaoperação foi uma “matança” e pediu uma investigação sobre o assunto.
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A fala deve ser usada por opositores para criticar a postura do governo federal. O próprio relator já fez críticas públicas a Lewandowski, afirmando que o ministro “não tem expertise, não entende nada de segurança”.
Uma das principais estratégias da comissão será regionalizar a apuração, mapeamento como se dá a atuação das facções nas diferentes regiões do país.
No Norte, por exemplo, a CPI deve se debruçar em como se dá a estrada da droga na fronteira e o escoamento para o restante do país e a exportação. Por lá, a droga entra principalmente pela tríplice fronteira do Amazonas com a Colômbia e o Peru, na região da cidade de Tabatinga (AM), e segue até o Pará e a estados do Nordeste.
"A gente quer ter esse retrato completo, o diagnóstico completo. Com base nisso, criar o consenso político de onde a gente vai fazer o ataque. Onde enfrentar? O pior lugar que vai enfrentar é nas comunidades, é mais difícil", disse Vieira ao jornal O Globo.
O relator quer ouvir moradores das comunidades, como dos complexos do Alemão e da Penha, palcos da megaoperação na semana passada, mas ainda está avaliando qual seria o melhor formato — uma das possibilidades é uma audiência sigilosa.
Um dos pontos sobre os quais a comissão deve se debruçar, e que consta no plano de trabalho do senador, é a questão orçamentária.
O texto diz que a comissão vai buscar “o aperfeiçoamento da legislação de regência, para conferir-lhe a estrutura e a força necessárias para melhor orientar os agentes públicos da área de segurança pública, além de dimensionar a real demanda orçamentária para o enfrentamento efetivo da criminalidade organizada”.
Vieira acredita que o país precisa priorizar o envio de recursos à área da segurança pública. Segundo ele, o investimento do governo federal é “baixíssimo”. O plano apresentado pelo senador propõe um diagnóstico detalhado da estrutura do crime organizado no país, com o objetivo de apontar falhas e propor mudanças na legislação e no orçamento da segurança pública.
"Esse ‘não ter dinheiro’ é uma escolha política. (...) Tudo custa dinheiro, e a gente tem que fazer a escolha política de priorizar ou não. E eventualmente a responsabilização de autoridades para as quais você constate uma omissão dolosa. Não me parece o cenário do momento. No momento não vejo nenhuma autoridade para quem eu possa atribuir omissão dolosa. Mas pode ser que com os fatos, depoimentos, vá acumulando conhecimento que leve neste sentido", frisou.
A estratégia tem, ainda, a previsão de criar um plano nacional de segurança pública. Durante a instalação da comissão, o senador afirmou que “o Brasil não precisa mudar a Constituição para ter integração entre as forças” e que a “integração já existe; ela é falha, ela é malfeita, mas ela já é totalmente viável”.
A fala ocorre em meio à discussão sobre a PEC de Segurança, apresentada em abril pelo governo. O texto propõe redefinir as competências da União, estados e municípios na política de segurança pública e busca consolidar o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), ampliar a integração entre forças policiais e dar mais clareza sobre responsabilidades na repressão ao crime organizado.
A comissão deve discutir até o financiamento de campanhas eleitorais por parte do crime organizado. O relator afirmou que a Justiça eleitoral precisa fiscalizar melhor as doações de campanha para evitar que o crime organizado financie candidatos. No próximo ano, o país terá eleição de deputados, senadores, governadores e do presidente da República.
A CPI deve analisar, ainda, exemplos de países que têm um sistema mais ágil para processar pessoas que cometeram determinados tipos de crime, chamado de "fast tracking". A ideia é observar se algo pode ser adaptado para o Brasil.

