Dom, 07 de Dezembro

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Meio Ambiente

Justiça manda governo Lula criar plano de desintrusão para Terra Indígena Tenharim na Amazônia

Ação alega que área tradicionalmente ocupada pelo Povo Indígena Tenharim tem sido alvo de invasões organizadas, desmatamento constante, grilagem de terras, mineração ilegal e exploração madeireira

Assembleia Geral dos Tenharin Assembleia Geral dos Tenharin  - Foto: Acervo IEB, 2023

A Justiça Federal ordenou nesta segunda-feira que o governo federal apresente, no prazo de 90 dias, um Plano Emergencial de Desintrusão da Terra Indígena Tenharim Marmelos.

A decisão da juíza Mara Elisa Andrade ocorre após uma associação que representa o povo originário ingressar com uma ação civil pública com pedido urgente de adoção de medidas para retirar invasores do território, localizado no sul do Amazonas.

A medida ocorre dois dias após o fim da COP30, quando lideranças indígenas foram a Belém reivindicar por respeito aos direitos das comunidades.

A Associação do Povo Indígena Tenharim Morogitá (Apitem) afirma que a área tradicionalmente ocupada pelo Povo Indígena Tenharim tem sido alvo de invasões organizadas, desmatamento constante, grilagem de terras, mineração ilegal e exploração madeireira.

Atualmente, o território — localizado entre os Municípios de Humaitá e Manicoré — abriga 741 pessoas e está localizado às margens do Rio Marmelos, um afluente do Rio Madeira.

Segundo o coletivo, a atuação do crime organizado no território ocasiona profunda degradação ambiental, ameaça a sobrevivência cultural e física da comunidade e compromete os serviços ecossistêmicos prestados pela floresta.

Os indígenas alegam a ocorrência de omissão da União, da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e do Estado do Amazonas, o que contribui para a perpetuação de violações aos direitos constitucionais dos povos originários, como a posse das terras tradicionalmente ocupadas e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

— Durante a COP, ficou evidente que os povos indígenas desempenham um papel estratégico na manutenção das florestas tropicais e na mitigação da mudança do clima. Esta decisão liminar representa uma incidência qualificada do movimento indígena brasileiro, demonstrando que a cobrança pelo cumprimento dos compromissos climáticos integra, de forma estruturante, a agenda de reivindicações e de monitoramento dos povos indígenas — afirma Mauricio Terena, advogado indígena responsável pela ação.

A associação também destaca que as atividades ilícitas se intensificaram na terra indígena nas últimas décadas, sobretudo após a abertura da Rodovia Transamazônica, e enfatiza que, até 2024, mais de quatro mil hectares já foram desmatados na área. Também cita que aproximadamente 200 famílias se encontram instaladas ilegalmente no local. Tenharim Marmelos

Para a juíza, a "proteção constitucional conferida às terras indígenas impõe às autoridades públicas o dever de adotar medidas céleres, eficazes e proporcionais à gravidade da lesão, a fim de assegurar a integridade territorial e cultural dos povos indígenas, nos termos de recentes entendimentos do Supremo Tribunal Federal".

“Não há dúvidas de que os povos indígenas assumem a condição de verdadeiros defensores da Floresta (...) A defesa dos povos indígenas e seus territórios também assume importância singular na preservação da Floresta e, por consequência, no enfrentamento das crises climática e de perda de biodiversidade”, diz Andrade.

Segundo a magistrada, “cada dia em que as instituições de Estado atrasam tais medidas de efetiva aplicação de normas constitucionais e infraconstitucionais, contribui e incentiva o avanço do desmatamento ilegal, a deterioração florestal progressiva nestes territórios, em razão da sensação de impunidade que o déficit de implementação normativa gera”.

No documento, Andrade também destaca que a ameaça crescente de queimadas e incêndios florestais, para a consolidação de áreas de desmatamento, agrave secas extremas que já castigam a região amazônica.

“Esses eventos extremos se retroalimentam e não apenas contribuem para a destruição dos ecossistemas locais, mas também elevam substancialmente o risco à saúde e à segurança alimentar das comunidades indígenas”, aponta.

Para Day Tenharim, presidente da Apitem, a decisão "mostra que a voz indígena está chegando onde sempre deveria ter chegado".

— Há anos denunciamos o avanço do desmatamento e das ilegalidades dentro do nosso território, e agora a Justiça reconhece que o Estado brasileiro não pode mais fechar os olhos. Na COP, vimos o planeta inteiro dizendo que precisa das florestas, mas nós dizemos há séculos que a floresta precisa ser respeitada. Esta decisão é um recado claro: o movimento indígena está organizado, atento e seguirá cobrando que os compromissos climáticos saiam do discurso e se tornem ação real dentro dos nossos territórios.

O Globo questionou a Funai e o governo do Amazonas sobre a decisão. A reportagem será atualizada em caso de resposta.

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