Moraes defende responsabilização de big techs: "Têm posição política, religiosa e ideológica"
Ministro disse que redes sociais passaram a se organizar de forma a atacar pilares das democracias ocidentais
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal ( STF), defendeu nesta terça-feira a responsabilização das big techs por conteúdos veiculados em suas plataformas e criticou a postura que classificou de "imperialista" das empresas de tecnologia que não querem estar sujeitas a regras de funcionamento impostas por países e blocos econômicos.
— Enquanto não houver lei, eu entendo que se deve aplicar o que já existe. Não se deve acreditar que as big techs são neutras, que os algoritmos são randômicos. As big techs têm posição política, religiosa, ideológica, e programa seus algoritmos para isso — afirmou o ministro.
Para Moraes, é preciso usar a legislação atual para coibir o que segundo ele são abusos por parte dessas empresas de tecnologia. Isso porque, para ele, o Brasil não vive uma "anomia", ou seja, uma ausência de leis.
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— Não é uma anomia. Basta uma simples interpretação. É um meio de comunicação, leva vídeos, notícias às pessoas. E com isso a gente consegue equilibrar o jogo.
Moraes participou de uma aula inaugural de um curso de defesa da democracia da FGV, em uma turma onde participarão também integrantes da Advocacia-Geral da União (AGU).
— As duas palavras mais postadas pelos chefes das big techs são "liberdade" e "democracia". Liberdade para fazerem o que bem entenderem contra as chamadas minorias e democracia que eles se elejam e se mantenham no poder. É essa a ideia — disse.
O ministro afirmou que as redes sociais, para terem mais engajamento e mais monetização, passaram a se organizar de forma a atacar "de forma extremamente organizada e competente os três pilares das democracias ocidentais". Segundo o ministro, esses pilares são liberdade de imprensa, eleições livres e periódicas e a independência do Judiciário.
— O ataque à mídia tradicional foi justamente para embaralhar as notícias e para que as pessoas já cativadas anteriormente e catalogadas em bolhas pudessem ser mais facilmente captadas. E para isso foi necessário não ter regulamentação. E aí dizem que estão querendo tirar a liberdade de expressão. E isso de tão repetido virou bandeira da extrema direita em todo o mundo — disse.
Ainda de acordo com Moraes, não há uma atividade econômica na história da humanidade que tenha impactado a sociedade que não tenha sofrido regulamentação.
— Essa clausula de imunidade total que as big techs querem cheira a imperialismo total. Conseguiram esmagar a mídia tradicional porque a mídia tradicional tem responsabilidade. As redes sociais não têm responsabilidade. O que não pode na vida real não pode no mundo virtual, nós não estamos num universo paralelo — ressaltou.
O ministro do STF também falou sobre os ataques sofridos pelo Judiciário por meio das redes sociais, o que chamou de estratégia de descredibilização por parte de radicais. Segundo ele, esses ataques ao Supremo fazem parte de "algo com método e é algo que ainda não acabou".
— Por enquanto, nós conseguimos manter a nossa soberania e a nossa jurisdição, porque as big techs necessitam dos nossos sistemas, as nossas antenas. Não é à toa que a Starlink quer colocar satélites de baixa órbita, para não precisar das antenas de nenhum país. Se nós não tivermos instrumentos para isso, não vai adiantar. É um jogo de conquista de poder,. E se a reação não for forte agora, vai ser muito difícil conter depois — afirmou, em referência à empresa do bilionário Elon Musk, com quem travou uma série de embates.
Além de Moraes, também participaram do evento o advogado-geral da União, Jorge Messias, a ministra substituta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Edilene Lobo e o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues. No início da aula, Moraes elogiou a atuação da PF nas investigações sobre uma trama golpista após as eleições de 2022.