No mesmo evento, Alckmin e Derrite defendem projetos diferentes para a segurança pública
Fórum paulista evidencia interesses divergentes na pauta por parte do governo e da oposição, enquanto Kassab fica em cima do muro
A megaoperação da polícia do Rio nos complexos da Penha e do Alemão na semana passada, que deixou 121 mortos, deu gás a projetos de segurança pública que tramitam na Câmara dos Deputados e prometem revisar penas e redefinir a classificação do Comando Vermelho (CV) e de outras organizações criminosas no ordenamento jurídico brasileiro.
Ainda assim, governo e oposição discordam dos termos, como ficou evidente em um fórum de desenvolvimento realizado nesta segunda-feira, 3, em Itu, no interior paulista.
O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), por exemplo, levou na manga o “projeto antifacção” encaminhado pelo governo Lula (PT) ao Congresso na esteira dos acontecimentos do Rio.
Ele não quis comentar outro projeto, apoiado pela bancada da bala e por outros políticos de direita, que pretende equiparar algumas ações típicas do CV e do Primeiro Comando da Capital (PCC) a atos terroristas, como intimidação coletiva e domínio territorial para promoção de violência e tráfico de drogas e de armas.
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— Olha, primeiro, organização criminosa deve ser enfrentada por terra, mar e ar. Todo o empenho nesse trabalho — desconversou Alckmin. — Eu queria destacar que o presidente Lula sancionou a lei estabelecendo penas mais duras para o crime organizado e encaminhou ao Poder Legislativo uma proposta de combate às facções. Nós precisamos unir os três níveis de governo, municipal, estadual e nacional, no combate ao crime.
O governo federal tem apostado ainda em um ambiente favorável para a aprovação da PEC da Segurança Pública, proposta de emenda à Constituição que fortalece o papel da União na formulação de políticas públicas na área.
Governadores de oposição, como Ronaldo Caiado (União Brasil), e o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite (PP), são contrários ao texto por alegar que este interfere na autonomia dos estados, a quem as polícias Civil e Militar estão subordinadas.
Derrite ataca "cultura marxista"
Derrite esteve no mesmo evento e, adotando figurino de candidato ao Senado, afirmou que é preciso acabar com a “cultura marxista que trata o bandido como vítima da sociedade”.
Ele se licenciará do cargo para retornar nesta terça-feira, 4, à Câmara a fim de relatar o projeto do terrorismo, que justifica como forma de inibir condutas como utilização de armamento de guerra, barreiras humanas e veículos blindados para assaltos e controle de áreas.
— O que está acontecendo em alguns locais do país, como no Rio de Janeiro, onde há um domínio de território e exploração de outras atividades que não deveriam ser exploradas pelo crime, como distribuição de energia, internet, água, gás e mototáxi, é uma questão que extrapola a segurança pública e que já entra na questão da soberania — afirmou Derrite.
Ele disse desconhecer o teor do projeto antimáfia, cujos principais pontos envolvem a definição de facção criminosa como uma organização criminosa qualificada na legislação penal e o estabelecimento de penas maiores para crimes cometidos nessas circunstâncias, como homicídio, que passa a ser tratado como hediondo. O secretário paulista adiantou, porém, que “qualquer iniciativa que venha a encarecer o custo do crime vai ter o nosso apoio”.
Pelo “Centrão”, a resposta de quem terá o apoio na empreitada ainda está em aberto. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, que faz parte do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), em São Paulo, como secretário estadual de Governo, disse que o partido deve “participar dessa discussão trazendo a incorporação de benefícios e aperfeiçoamentos que a gente entenda adequado”, sem entrar no mérito de cada um deles. Segundo ele, a profusão de projetos mostram que o tema da segurança pública “realmente está merecendo a atenção dos parlamentares”.
— O Congresso não pode se omitir e, neste momento, não se omitir é discutir e votar esses projetos. Fica claro, inclusive pelas pesquisas que estão sendo apresentadas, que a sociedade brasileira quer efetivamente ações, projetos, políticas públicas que deem uma solução, que deem uma resposta à questão de segurança no país.
Outro convidado do fórum paulista, Augusto Aras, ex-procurador-geral da República entre 2019 e 2023, nomeado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), não quis comentar com o Globoo que pensava sobre os projetos na saída do evento. O ex-chefe do Ministério Público fez um aceno aos gestores municipais presentes dizendo que, muitas vezes, o Poder Judiciário extrapola as suas prerrogativas ao julgar a responsabilidade dos gestores sobre a administração pública a partir de “nexos de causalidade que vão do gari ao prefeito”.

