Partidos declaram despesas genéricas com verba pública
No ano passado, o fundo partidário, custeado pelo Orçamento federal e por multas eleitorais arrecadadas, distribuiu entre as agremiações políticas R$ 889 milhões
Financiados majoritariamente com dinheiro público, os partidos políticos brasileiros destinaram dezenas de milhões de reais a itens pouco transparentes ou que não têm dados divulgados de maneira detalhada pela Justiça Eleitoral. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) divulgou apenas no fim de setembro passado o detalhamento dos gastos de 2018 das mais de 30 siglas constituídas no país.
No ano passado, o fundo partidário, custeado pelo Orçamento federal e por multas eleitorais arrecadadas, distribuiu entre as agremiações políticas R$ 889 milhões. Para este ano, a previsão é de R$ 927 milhões -quantia quase equivalente a todas as despesas anuais de uma prefeitura como a de Palmas.
Em 2018, mais de R$ 66 milhões foram destinados pelos partidos a itens pouco específicos, como o pagamento de pessoal com "outros serviços técnicos e profissionais". Pelas normas da Justiça Eleitoral, o gasto dos partidos precisa ter vínculo com atividade partidária.
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O item "serviços de consultoria jurídica" também está entre os que mais receberam recursos, com aproximadamente R$ 50 milhões. Em 2018, ainda segundo as contas divulgadas pelo TSE, foram aplicados R$ 157,6 milhões nas fundações partidárias para promoção de educação política. As agremiações são obrigadas a destinar ao menos 20% das verbas do fundo partidário a essas entidades voltadas para a doutrinação política.
Diferentemente do que ocorre com os gastos das direções partidárias, porém, as despesas com essas fundações não estão compiladas em uma única base de dados no site da Justiça Eleitoral, embora as notas fiscais e comprovantes sejam anexados eletronicamente nos processos de prestação de contas. Isso dificulta o acompanhamento público dessas despesas.
Além do fundo partidário, as legendas se mantêm com receitas vindas de contribuições de filiados e de doações de pessoas físicas. As contas publicadas no site do TSE no fim de setembro também mostram que os partidos gastaram no ano passado R$ 715 mil com o pagamento de multas impostas pela Justiça Eleitoral. Resolução publicada pelo tribunal eleitoral em 2017 proíbe que os partidos usem recursos do fundo partidário para quitar essas obrigações.
No quesito multas, o MDB foi o partido que mais desembolsou recursos, R$ 288 mil, seguido por PDT e PT. As informações da Justiça Eleitoral relativas a 2018 apontam ainda que os partidos devolveram mais de R$ 1,5 milhão gasto de maneira considerada irregular -mas a quantia inclui em sua maior parte valor que o MDB afirma que foi lançado no sistema de modo equivocado.
Se houver falhas na apresentação dos dados, como ausência de documentos de comprovação, informações genéricas ou algum desvio de finalidade da despesa, o partido pode ser obrigado a devolver recursos aos cofres públicos.
Para o diretor-executivo da ONG Transparência Partidária, Marcelo Issa, um dos principais problemas na gestão desses recursos é a escassa periodicidade de divulgação das contas dos partidos.
Hoje, os dados com receitas e despesas das direções partidárias são publicados pelo TSE apenas uma vez ao ano, com meses de atraso em relação à movimentação financeira praticada. Os partidos precisam entregar suas prestações anuais de contas até 30 de abril, e só então a Justiça Eleitoral começa a publicar parte das informações do ano anterior na internet.
Issa defende que o tribunal adote o mesmo modelo de transparência em vigor desde 2016 nas eleições, em que os partidos abastecem o sistema online à medida que as despesas são feitas, dia a dia.
"O caso das candidaturas de laranjas [do PSL, em que recursos públicos foram usados em empresas fantasmas] é emblemático disso. A imprensa, a Folha de S.Paulo, só conseguiu detectar os indícios porque o tratamento das contas eleitorais tem mais transparência do que as partidárias", afirma. A organização reivindica que o TSE publique uma resolução estabelecendo esse padrão mais rigoroso.
Nos últimos anos, em meio à proibição de doação de empresas à atividade política, estabelecida em 2015, houve uma explosão dos gastos públicos com partidos, que culminou no bilionário fundo eleitoral distribuído entre as legendas para financiar os gastos da campanha do ano passado.
Essa fórmula será reeditada na eleição municipal de 2020, com a articulação de um fundo eleitoral com valor que ainda será definido no próximo Orçamento federal. Questionada sobre o assunto, a corte eleitoral, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que "preza pela transparência e sempre aprimora seus sistemas". "Não há omissão de dados e todas as publicações são feitas com base nas previsões legais."