Dia Nacional da Adoção: ato é sinônimo de amor

Neste sábado (25), no Dia Nacional da Adoção, Pernambuco pode comemorar sucesso na quantidade de adoções, mas ainda precisa de candidatos a adotar crianças mais velhas e adolescentes.

Ubiratan adotou Victor quando ele tinha 7 anos - Arthur de Souza/Folha de Pernambuco

Ao se voluntariar para ajudar a fazer uma festa em uma Casa de Acolhimento de crianças e adolescentes para adoção, o aposentado José Ubiratan Vieira Cavalcanti, não imaginava que sua vida iria mudar completamente.

Em 2009, conheceu Victor Emanoel, que na época tinha 7 anos, e o carinho entre eles foi imediato. “Na realidade foi um encontro de almas gêmeas”, descreve Ubiratan, com orgulho. A partir de então, a relação entre os dois passou a se estreitar cada vez mais.

Ele se tornou padrinho do menino e, apenas três meses depois, deu início ao processo de adoção. “Durante o apadrinhamento eu não quis mais ficar longe dele. Eu já o considerava meu filho”, recorda.

Basta uma troca de olhar entre pai e filho para ambos estamparem um sorriso contagiante no rosto. Hoje com 60 anos, Ubiratan afirma que sempre pensou em adotar um filho, mas a ideia perdia força com o tempo. Porém, depois que se encontrou com Victor, a vontade renasceu. O fato de o menino ter paralisia cerebral nunca foi uma questão para o ex-enfermeiro. Levam uma vida normal, como qualquer outra família. Caminhar ao sol e tomar banho de piscina estão entre as atividades favoritas dos dois.

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“Victor é extremamente feliz hoje em dia. Apesar de ser cego e não falar, ele escuta e entende tudo que se fala e é muito sensível à minha presença. Quando se ama de verdade, nada é problema. Adoção é um ato de amor incondicional. Independentemente das dificuldades, existem milhares de crianças à espera de de afeto. Não existe diferença entre biológico e adotado. A diferença quem faz é o amor, que é a base da vida, da paz interior.”

Após cerca de nove anos de relacionamento, o desejo de aumentar a família se tornou mais latente no casal Francisco Lacerda, 41, e João Gomes de Andrade, 46. No final de 2015, eles deram início ao processo de adoção e passaram cerca de um ano acompanhando reuniões e grupos de apoio indicados pela Justiça. Até que em novembro de 2016 entraram no Cadastro Nacional de Adoção (CNA) e, em fevereiro do ano seguinte, receberam a notícia que havia duas crianças aptas para entrar na família deles. Eram João Henrique e Isaac, hoje com 8 e 11 anos, respectivamente. “Desde o começo era como se houvesse uma vontade mútua entre as crianças e a gente para fazer dar certo”, comenta Francisco.

Para os meninos serem adotados havia uma condição. Eles teriam que manter o vínculo com as outras duas irmãs. Estavam inscritos no projeto Famílias Solidárias. Implantada pela 2ª Vara da Infância e Juventude da Capital, a ação se pauta no compromisso assumido pelos adotantes de manter o vínculo entre os irmãos biológicos adotados por diferentes famílias.

“O fato de eles não cortarem os laços com os irmãos e com os amigos do abrigo ajudou na adaptação”, avalia Francisco. A irmã mais nova dos meninos foi adotada por um casal da Zona Norte do Recife. Já a irmã mais velha foi acolhida pela avó paterna. “Sempre que podemos reunimos os quatro. Um frequenta a casa do outro. Passamos o fim de semana em Itamaracá juntos. Manter esse vínculo entre eles é fundamental e faz a diferença”, acrescenta.

Francisco confessa que sempre considerou a adoção como única possibilidade para ser pai. “No mundo em que a gente vive já tem muitas crianças sem pais e eu trazer uma nova não faria muito sentido. Se existem essas crianças que precisam de pais e você quer ser um deles, se resolve dois problemas de uma vez só com a adoção.” Ele conta que durante o processo de adoção tentou não criar expectativas, para evitar frustrações. “Assim como quando você gera um filho biológico e não pode escolher como será a criança física e psicologicamente, também fiquei aberto para receber e aceitar as crianças do jeito que elas fossem.”

O mesmo sentimento era partilhado pelos recifenses Liria Rochana Lopes Ferreira Silva, 33, e David Monteiro Silva, 35. Após algumas tentativas frustradas de terem filhos biológicos, em 2016, eles resolveram iniciar o processo de adoção, sem restrições de sexo, idade ou raça e abertos a receber até grupo de três irmãos. Ainda assim, foram três anos de espera no CNA até o casal finalmente realizar o desejo de aumentar a família. Eles não contavam que, quando a oportunidade surgisse, seria multiplicada. Foram trazidos à possibilidade de adotar cinco irmãos com idades entre 3 e 12 anos. A Justiça estava prestes a separar as crianças, pois não havia ninguém que quisesse adotar o grupo. Rochana e David não deixaram que se separassem.

“Inicialmente, nos tornamos padrinhos sócio-afetivo deles, mas com o tempo o carinho só foi aumentando. Eles ficaram tão à vontade com a gente que acabaram nos escolhendo para sermos seus pais”, lembra Rochana, que após receber a guarda provisória dos meninos foi demitida da empresa que trabalhava há cerca de dois anos. “No começo, foi difícil, porque precisei lidar com a falta de dinheiro, mas ganhei mais tempo com eles, o que ajudou na adaptação”, avalia. Com o aumento da família, eles precisaram trocar o carro por outro com sete lugares. Para ajudar no pagamento, os amigos do casal abriram uma campanha na internet para arrecadar dinheiro.

“Adoção é sinônimo de amor e vai muito além das necessidades materiais. A responsabilidade como pai e mãe é a mesma. Hoje temos a rotina de uma família como outra qualquer. Eu imaginava que não conseguir ser mãe biológica seria frustrante, mas depois que adotei me sinto uma mulher completa”, comenta Rochana.

A conta não fecha
Para alguns, uma possibilidade. Para outros, destino. Mas pais e filhos são unânimes ao dizer que adoção é sinônimo de amor incondicional. Neste sábado, em que se comemora o Dia Nacional da Adoção, Pernambuco tem bons motivos para festejar. O Estado permanece entre os que mais promovem adoções no país. Ocupa o quarto lugar no ranking do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ficando atrás apenas de Paraná, São Paulo e Minas Gerais. Do total de 2.183 crianças e adolescentes adotados no Brasil, em 2018, 127 foram de Pernambuco.

De acordo com o Tribunal de Justiça de Pernambuco, o destaque continua sendo o percentual de adoções tardias, ou seja, de pessoas de 3 a 17 anos. Dos 127 adotados, 93 pertencem a essa faixa etária, equivalente a 73,2% do total. Apesar de o aumento percentual de adoções tardia, o perfil preferido pelos pretendentes em todo o país continua sendo o principal entrave para que mais crianças e adolescentes consigam uma família. A maioria ainda prefere bebês, contribuindo para que o número de quem quer se tornar pai ou mãe tenha uma absurda diferença em relação ao quantitativo de crianças à espera de um novo lar no Brasil. Atualmente, Pernambuco possui 1.191 pretendentes disponíveis para adoção e 218 crianças e adolescentes inseridas no cadastro, aptas ao processo.

De acordo com a juíza da Comissão Judiciária de Adoção do Estado, Hélia Viegas, cada ano amais vivido numa instituição de acolhimento diminui a chance de a criança encontrar um novo lar, principalmente a partir dos sete anos de idade. Quanto menor a exigência (de cor, idade, ou se aceita grupos de irmãos, por exemplo), mais rápido é possível completar o processo. Em Pernambuco, as famílias que se habilitam para crianças mais velhas, acima de 12 anos, têm o processo da adoção concluído em cerca de 48 horas.

Perto de completar 18 anos, as chances de conseguir uma nova família são quase nulas. No país, apenas 157 pessoas adotariam meninos e meninas com 17 anos de idade. No Estado, quatro cadastrados aceitariam.

Dentre iniciativas para abreviar a permanência da criança e do adolescente em instituições de acolhimento, está o projeto Conhecer Virtual, que tem como objetivo favorecer um contato inicial, através de videoconferência, entre adotante e adotado.