450 anos da Batalha de Lepanto
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No último dia 7 de outubro foram comemorados os 450 anos da Batalha de Lepanto, acontecida no mar Mediterrâneo, ao largo de Lepanto, diante da cidade de mesmo nome, na Grécia. Foi a maior batalha naval do século XVI, uma das maiores e mais ferozes da história.
Na época, o entorno do Mediterrâneo, dividido pela fé e modos de vida, estava sendo sacudido pelo avanço do Império Otomano (Turquia), no intuito da expansão do domínio político e do islamismo para o sul. A pirataria berbere, que assustava a navegação e as fronteiras marítimas, também contribuía para a crise. Assim, sentindo-se ameaçadas, as nações católicas resolveram tomar uma ação em defesa do seu futuro.
A partir da união liderada pelos Estados Pontifícios, à frente o Papa Pio V, com o Reino da Espanha, as Repúblicas de Veneza e Genova, a Ordem dos Cavaleiros de Malta e os Ducados de Saboya e Toscana, foi constituída a “Santa Liga”, uma força militar naval para combater a intenção otomana.
Após alguns meses de mobilização e preparação estratégica, em 16 de setembro a frota partiu de Messina (península itálica), para o titânico desafio de derrotar os otomanos, sob o comando do príncipe Juan de Áustria, irmão do Rei Filipe II da Espanha. Outros comandantes dividiam tarefas. Na sacra expedição, a luta, pela vida e pela vitória, será transcendental. Eram 212 navios (galeras), equipados com canhões, e em torno de 80.000 infantes (marinheiros e soldados), caminhando para o tudo ou nada.
A tensão entre as tropas cristãs crescia a cada dia que passava, exigindo um intenso trabalho motivacional dos líderes militares e do grupo de sacerdotes embarcados. Com informações obtidas (a espionagem já existia) de que a forte esquadra otomana, superior em navios e soldados, comandada por Ali-Pachá, estava ancorada em Lepanto, resolveu o comandante Juan de Áustria fazer aproximação para abrir o combate. No instante em que içou o estandarte da Santa Liga, com a imagem do Cristo crucificado, recebido de Pio V, seus emocionantes brados de incentivo colocaram os guerreiros soldados em ponto de luta.
Podemos sentir o clímax desta batalha através do relato do jornalista e escritor catalão Sebastián Juan Arbó, no livro Cervantes: “Era dia 7 de outubro, um domingo, meio-dia, e o mar estendia-se liso sob o azul dos céus da Grécia, testemunha de tantas grandezas e de tantos feitos gloriosos. O pendão de Santa Cruz, içado por Dom Juan de Áustria, tinha sido saudado com uma alta e unanime exclamação, por gritos saídos
de inúmeros lábios trêmulos, por milhares de peitos ardentes de coragem, ao qual respondia como um eco o longínquo clamor que vinha das naves inimigas e que enchia o mar”.
Acontece a iminente conflagração, com o furor que causas deste tipo demandam. Os soldados de Juan de Áustria, destemidos, superam, com valentia e estratégia militar, a inferioridade numérica de recursos e vencem os inimigos otomanos, após dez horas de sangrento combate, com milhares de mortes dos dois lados; conquistam uma vitória iluminada, de valor incomensurável para os destinos do ocidente, incluindo o Novo Mundo.
Voltemos ao escritor Arbó e seu comentário final: “Mal terminou a batalha, ao escurecer, começou uma furiosa tempestade. Um vento de furacão, com chuva, trovões e relâmpagos, soprou durante toda a noite, sobre os restos das galeras destroçadas, sobre os cadáveres desfeitos, os membros quebrados e o sangue que enchiam grande espaço do mar e que a noite cobria piedosamente com o seu manto”.
À medida que a notícia da vitória da Santa Liga ia circulando, o júbilo tomava conta das nações unidas e das agregadas por pensamentos. Desde então, o dia 7 de outubro ficou consagrado a N. S. do Rosário, por uma possível interseção ao sucesso da expedição católica. Entre os soldados sobreviventes deste magnífico episódio encontrava-se Miguel de Cervantes Saavedra, o futuro escritor, autor de Dom Quixote de la Mancha. Ferido em combate, com tiros de arcabuz, perdeu os movimentos da mão esquerda, marca que sempre levou com orgulho. Apelidado de “Manco de Lepanto”, sobre esta batalha ele escreveu: “Foi a mais memorável e alta ocasião que viram os séculos passados, nem esperam ver os porvir”.
A lembrança desta parte da história é importante à liberdade e aos limites da intolerância.