A arte de curar as “contusões” da bola

Nem só jogadores de futebol dependem da bola para sobreviver. Há também os profissionais que cuidam da mesma com muito carinho

Juca aprendeu com o pai, Inácio, o ofício de consertar as bolas para ganhar a vida. Atividade que ele desenvolve desde criança - Felipe Ribeiro/Folha de Pernambuco

Protagonista nos campos de grama ou terra, seja em peladas de várzea ou em grandes campeonatos, a bola sempre foi instrumento de propagação do futebol, aquele que é jogado com talento, ousadia, alegria, e amor à camisa. Por outro lado, há quem a utilize como forma de sobrevivência. É o caso de José Menezes, mais conhecido como Juca, de 54 anos, morador de Jaboatão dos Guararapes, e seu Antônio Pereira, 64, do Recife. Há mais de 20 anos na profissão, ambos consertam e dão vida a esse objeto tão mágico, responsável pelo surgimento de novos craques e por despertar sentimentos distintos dentro e fora das quatro linhas.

Pronto Socorro, é assim que é chamado o ponto no bairro de Prazeres, em Jaboatão dos Guararapes, onde Juca ganha a vida no conserto de bolas e chuteiras. Vocação passada de geração para geração, a história começou com o patriarca da família, seu Inácio Menezes. “Tudo começou através do meu pai. Aos poucos, fomos nos aperfeiçoando. Um dos meus irmãos conserta sapatos, o outro conserta bolas e chuteiras, assim como eu. A minha motivação veio dos meus pais, fomos criados nisso aqui. O tempo passa e a gente vai andando, daqui a pouco eu fico no escoramento e os filhos vão assumindo a carga e assim por diante”, comentou Juca.

Nascido em São Joaquim do Monte, no interior do Estado, aos 80 anos - 55 vivendo em Recife - e já aposentado, seu Inácio carrega uma bagagem de muita experiência passada para os filhos, que desde então assumem seu papel. Saudoso, ele conta do orgulho que sente deles seguirem seus passos. “Eu vim de Caruaru pra cá, fiz a barraca com a ajuda da Prefeitura e comecei a trabalhar com conserto de calçados. Trazia minha esposa e meus filhos pequenos. Depois a idade foi avançando, ela foi adoecendo e começou a ir embora para casa. Eu fiquei sozinho e ensinei todos os meus meninos a trabalhar. Eu me sinto feliz porque eles só fazem as coisas que eu ensinei e dá pra eles irem vivendo, graças a Deus”, disse. 

Um de seus instrumentos de trabalho é uma sovela, peça formada por uma espécie de agulha reta ou curva, com cabo, com que os sapateiros e correeiros furam o couro para o costurar. Além disso, ele utiliza a cola de remendo e o couro sintético, principais instrumentos do trabalho manual.

O consertador de pelotas falou sobre a clientela e a importância do futebol na sua vida. “Sempre aparece gente aqui porque não é toda hora que a pessoa tem dinheiro pra comprar uma bola nova, se uma bola furou e dá pra consertar, a gente conserta, a pessoa não vai ter que gastar dinheiro comprando outra. Nós trocamos câmara de ar, remendamos, ela fica normal como era antes”, afirmou.

“Eu nunca fui aqueles grandes jogadores, fui peladeiro de escola, mas não me dediquei muito a isso não. Eu gosto do futebol porque é o ramo que a gente trabalha, convive, então se tem futebol, tem a manutenção e o conserto dos materiais”, ressaltou.
Além de fazer o que gosta, Juca trabalha em família, ao lado dos irmãos Jailson Menezes, o Tata, e o mais novo, Jair Francisco Menezes, ele faz a alegria de muitos apaixonados pelo futebol com seu serviço de “boleiro-cirurgião”.

“Eu aprendi criança, comecei a trabalhar nesse ponto aqui aos meus 12 anos e até agora eu nunca trabalhei em outro canto, a não ser nessa atividade. Fazemos costura, remendo de bolas, troca de câmara de ar, de tampo, é o serviço específico que eu faço. Trabalhar com meus irmãos é muito bom, estamos na terceira geração, os netos do meu pai também já trabalham aqui. E graças a Deus está dando para sobreviver desse trabalho”, finalizou Jair.

Desde 1997 no ofício, seu Antônio Pereira, de 64 anos, divide sua rotina com seu irmão Cícero Pereira, de 60. Não tem quem não passe pela Rua do Riachuelo, por trás da Faculdade de Direito da UFPE UFPE, no Centro do Recife, e não encontre o famoso Fura Couro Conserto de Bolas & Calçados. 

Morador do bairro dos Coelhos e pai de três filhos, seu Antônio trabalhou como pedreiro durante 10 anos, depois largou a profissão para dar início ao conserto de bolas e chuteiras. “Já trabalhei como pedreiro. Parei o serviço e passei a trabalhar com isso aqui. Eu sempre me dediquei muito ao trabalho, hoje em dia não estou mais em condições. Minha profissão é essa mesmo, eu vivo disso”, garantiu seu Antônio.

O pontapé inicial veio do irmão mais velho, Manoel Silva. “Tudo começou na Sete de Setembro em frente ao 100% Brasil, o antigo China Brasil. Em 87 eu morava no Jordão, trabalhava em uma firma de Engenharia e meu irmão Manoel, que faleceu no Rio de Janeiro há pouco tempo, me trouxe pra cá e desde então eu estou aqui”, contou o irmão Cícero.

No batente de segunda à sábado, Antônio e Cícero consertam cerca de 10 bolas e chuteiras por dia, 150 por mês e 1.000 peças por ano. Os preços variam de 15,00 à 30,00.

Com a camisa do seu time de coração, Cícero traz no rosto o cansaço dos anos de dedicação ao trabalho e a satisfação em consertar sonhos. “A coisa mais importante disso que eu faço é a minha dedicação pelo trabalho sabe, enquanto tem muita gente que tem várias profissões e não exerce nenhuma. Tudo aquilo que a gente faz com amor é sempre gratificante. Eu tenho orgulho do que eu faço porque o conserto das bolas está quase extinto, não existem muitos consertadores de bolas, dificilmente se vê”, ressaltou.

Serviço:

Pronto Socorro dos Calçados N 1
Conserto de Bolsas, Bolas, Chuteiras e Sapatos - Prazeres, Jaboatão dos Guararapes.

Conserto de bola furada: 12,00
Troca de câmara de ar: 20,00
Chuteira Ponteada: 15,00 (o par)
Troca de solado: 25,00
troca de zíper ou bolsa varia de acordo com o tamanho.

Tel: 9 8414-1578 / 9 8793-9392
Fura Couro Conserto de Bolas & Calçados
Rua do Riachuelo, por trás da Faculdade de Direito da UFPE, Centro do Recife.
Preços: 15,00 à 30,00
Tel: 9 8841-4345