Jorge Farjalla seleciona elenco para montar peça no Recife
“Jamais ou Calabar” tem previsão de estreia no segundo semestre
Farjalla se ressente da falta de referências a Calabar na cidade - Ed Machado/Folha de Pernambuco
Um dos mais elogiados diretores da cena teatral contemporânea, Jorge Farjalla, de 38 anos, está vivendo um tórrido romance com o Recife. A paixão nasceu logo na primeira visita do encenador à capital pernambucana, em agosto do ano passado. Na época, ele estava trazendo à cidade sua adaptação de “Dorotéia”, clássico de Nelson Rodrigues, que foi sucesso de público e crítica em 2016. “Cheguei quatro dias antes da equipe. Fiquei, imediatamente, encantado com o lugar. Andava pelas ruas como se estivesse em casa. Parece coisa de outras vidas”, relembra o diretor, que nasceu no interior de Goiás e vive no Rio de Janeiro há dez anos.
Essa repentina conexão com a “Manguetown” de Chico Science fez brotar em Farjalla a vontade de montar por aqui um espetáculo. O desejo, confidenciado à amiga e atriz pernambucana Laís Vieira, chegou aos ouvidos dos produtores Andréa Cohim e André George Medeiros, da Art&Sonho Produções. Há tempos, a dupla procurava alguém com predicados suficientes para dirigir “Jamais ou Calabar”, texto inédito do dramaturgo carioca Doc Comparato. Ambientada durante a invasão holandesa ao Brasil, a peça retrata uma das figuras mais controversas da história pernambucana: Domingos Fernandes Calabar, acusado de trair os portugueses na disputa por parte do território tupiniquim.
Farjalla resolveu abraçar o projeto e, desde então, tem visitado frequentemente a capital pernambucana. Entre idas e vindas, o artista detectou a falta de referências à figura de Calabar na cidade. Para o diretor, a trajetória do personagem retrata uma realidade que ainda vivemos. “A peça é um soco na cara da sociedade brasileira. O maior pecado do Calabar foi querer mais e mais. Ele passou por cima de tudo e de todos em busca de poder. Nada diferente do que ocorre nos dias de hoje”, defende.
A última visita do encenador ao Estado ocorreu no início deste mês, quando realizou uma série de testes para escolher parte do elenco do espetáculo, que será formado por atores locais e de outros estados. “Durante as entrevistas, fiquei muito feliz com os resultados dos candidatos oriundos do curso de artes cênica da Universidade Federal de Pernambuco. São atores que se entregam e mergulham no olhar”, conta o encenador, que diz estar à procura de artistas que “pulem do precipício” para o processo criativo.
“Não sou um diretor que fica sentado na cadeira, apenas dizendo o que os outros devem fazer. Eu participo, vou pra cima do ator, trabalho o corpo junto com ele”, detalha.
Os intérpretes selecionados se juntarão aos já anunciados, como Laís Vieira, que dará vida a uma escrava. André George Medeiros será Xesc, holandês que se apaixona por uma índia. Outro nome confirmado é o do mineiro Petrônio Gontijo. Ele interpretará Willen, um dos antagonistas. Já o protagonista fica a cargo do recifense Allan Souza Lima, que participou do filme “Aquarius”, na pele de um garoto de programa. A modelo indígena maranhense Zahy Guajajara, que também estaria na equipe, precisou desistir do projeto após descobrir que está grávida.
A montagem deve ficar pronta apenas no segundo semestre. Embora nada esteja definido ainda, Farjalla sonha estrear sua obra dentro de um dos galpões do Cais José Estelita. “A história acontece na região portuária. Então, a plateia precisa vivenciar isso. Imagino os apitos dos navios chegando. Consigo visualizar vários contêineres, cada um servindo de palco para uma cena. Seria um acontecimento histórico, para ficar na memória dos espectadores”, vislumbra.