Opinião

Corte orçamentário de 95% significa o desmonte completo da assistência social no Brasil

O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) enviado pelo Governo Federal para o Congresso Nacional no último mês de agosto gera preocupação em todos nós que militamos pelas políticas sociais no Brasil. O texto prevê um corte de 95% nos recursos do Sistema Único de Assistência Social (Suas) em 2023, o que vai afetar em cheio a operação de equipamentos que são a porta de entrada para benefícios sociais, como Centros de Referência de Assistência Social (Cras), Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) e centrais de atendimento do Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico).

Em 2014, no Governo Dilma, R$ 3,06 bilhões chegaram a ser orçados para a assistência social. Ao longo do Governo Temer, os recursos para esse setor começaram a entrar em queda livre. No Governo Bolsonaro, não tem sido diferente. Em 2022, por exemplo, o Orçamento da União previu R$ 967,3 milhões para o Suas. Essa já foi uma redução incômoda. Contudo, em 2023, com o corte de 95%, o valor estipulado chegará ao nível mais perverso: serão só R$ 48,3 milhões para custear mais de cinco mil Cras e quase três mil Creas em todo o país, o que não dá nem R$ 6 mil para cada equipamento custear suas operações o ano todo.

Outras ações da assistência social também serão seriamente afetadas. O programa Criança Feliz, que atua no acompanhamento a gestantes e crianças inseridas no CadÚnico ou no Benefício de Prestação Continuada (BPC), teve o orçamento reduzido pela metade. Já o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar, que dispunha de R$ 101 milhões orçados para 2022, passará a contar com apenas R$ 2,7 milhões. Para se ter ideia do tamanho do corte, podemos fazer a comparação com a versão local desse programa, que implantamos com o nome de Pernambuco que Alimenta por meio da Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude em parceria com a Secretaria de Desenvolvimento Agrário. O Governo do Estado destinou R$ 10 milhões para essa ação em 2022, três vezes mais do que o Governo Federal pretende aportar, para todo o país, no ano que vem.

Determinar esse corte para o Suas no momento em que a população mais precisa do braço do Estado é muito sintomático de como o Governo Federal olha para as pessoas em vulnerabilidade social. O Brasil está de volta ao Mapa da Fome, com mais de 30 milhões de pessoas sem saber se terão acesso às três refeições hoje.
Por óbvio, seria o momento não de reduzir orçamento, mas de reforçar as políticas sociais, ampliando investimentos e desafogando estados e municípios, que estão se desdobrando para manter serviços funcionando, para administrar incontáveis filas em centros de atendimento e para manter assessorias técnicas junto às equipes de assistência social. Se esse corte de 95% não for revertido, cabe uma avaliação taxativa: o Suas, da forma como o conhecemos, terá sido completamente desmontado simplesmente porque não terá condições de funcionar.

É urgente que todos nós atuemos pela mudança desse quadro. O primeiro passo, no próximo dia 2 de outubro, além de eleger um governo voltado para as demandas sociais, é preencher o Parlamento com deputados e senadores que tenham compromisso com a assistência social e que possam, ao longo do ano que vem, atenuar a escassez de recursos para esse setor, por meio da destinação de emendas, como já têm feito alguns valorosos parlamentares. Outro passo importante é seguir pressionando o Congresso pela aprovação da PEC 383/17, de iniciativa do deputado federal Danilo Cabral, que já deveria ter entrado em pauta, mas segue sendo protelada por iniciativa de aliados do atual governo.

O cenário para 2023 é desafiador, mas é unidos mais do que nunca, neste momento de previsão de cortes e de agravamento das demandas sociais, que vamos virar esse jogo e garantir a operação do Suas, um sistema que chegou para ficar na garantia de direitos de toda a população.



*Secretário de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude de Pernambuco



- Os artigos publicados nesta seção não refletem necessariamente a opinião do jornal. Os textos para este espaço devem ser enviados para o e-mail cartas@folhape.com.br e passam por uma curadoria para possível publicação.