Entenda em 7 pontos as mudanças na lei orgânica das PMs aprovada pelo Senado
Texto aprovado no Senado segue agora para a análise do presidente, que pode sancionar ou vetar o projeto de lei
O projeto de lei que cria a Lei Orgânica da Polícia Militar e dos Corpos de Bombeiros, aprovado nessa terça-feira (7) pelo Senado, atualiza o regimento atual das corporações, elaborado ainda na ditadura militar. Por outro lado, especialistas avaliam que o texto abre brecha para retrocessos no sistema de segurança pública e prevê menor controle civil sobre as polícias. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda precisa sancionar o projeto para que ele passe a valer.
Embora tenha dividido opinião entre ministros, o texto teve apoio do governo e foi relatado pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES), líder do partido no Senado. A proposta pouco foi alterada em relação ao que havia sido aprovado na Câmara, em 2022, com apoio de bolsonaristas.
Hoje as polícias militares seguem o regimento de seu respectivo estado. O projeto cria um modelo federativo para padronizar o funcionamento e atuação das corporações.
O comando das PM’s foi um ponto importante na tramitação do projeto de lei. Durante o governo Bolsonaro, parlamentares tentaram incluir artigo que exigia que o comandante das corporações fosse escolhido a partir de uma lista tríplice elaborada pelos próprios policiais. No entanto, o trecho foi retirado antes de ser enviado ao Senado, pois houve críticas sobre o esvaziamento do poder dos chefes dos Executivos locais.
Já no texto aprovado, o artigo 29 do PL indica que os comandantes da PM responderão diretamente ao governador. Para o presidente do Fórum de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, este ponto do projeto de lei abre espaço para a extinção das secretarias de Segurança Pública.
"Esse trecho dá brecha para que os comandantes das PMs falem que o secretário de Segurança não pode mandar neles. A partir daí é fácil criar pressão para que as secretarias deixem de existir" observa.
A proposta também estabelece que as ouvidorias das corporações sejam subordinadas diretamente ao comandante-geral das corporações. Segundo a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, o modelo de ouvidoria indicado no projeto pode diminuir o controle civil sob o órgão que apura ações de policiais.
"As ouvidorias seriam criadas no próprio âmbito da PM, não é um dispositivo muito claro. Então a gente fica sem saber se isso não vai matar a ideia de um controle externo sob as ouvidorias" diz a especialista.
Outro ponto do projeto de lei exige que oficiais da Polícia Militar tenham bacharelado em direito ou curso de formação reconhecido pelas corporações, ou estados. Com isso, Sério de Lima aponta que as academias de formação de policiais poderiam passar a formar profissionais de direito para suas corporações.
"O texto vincula o sistema de ensino militar e diz que as academias de polícia vão formar estes bacharéis de direito. Então estão transformando as academias em faculdades de direito. É um retrocesso que não faz sentido" diz
Para Carolina, a exigência do curso de direito não cabe às polícias, pois a atuação do policial é muito mais ampla do que os conhecimentos proporcionados por este curso
"Não faz sentido, o policial militar que está na rua precisa saber muito mais de gestão de pessoas, de criminologia, de gestão de dados, análise situacional e outras atribuições" avalia.
Especialistas também apontam problemas no trecho do projeto que trata do acesso de mulheres nas corporações. A proposta estabelece um mínimo de 20% das vagas serão destinadas a candidatas do sexo feminino e que apenas "na área da saúde" elas também concorrem à totalidade ofertada em cada concurso.
"Na prática, é uma cota de 20% de vagas para mulheres. O que era para ser piso um piso na realidade é um teto", diz a presidente do Instituto Sou da Paz.
Confira alguns dos principais pontos do projeto:
Regulamentação
A proposta padroniza a legislação relativa às Polícias Militares e aos Corpos de Bombeiro dos estados. O texto lista 37 garantias para que profissionais das corporações ocupem cargos na ativa, reserva remunerada ou como reformados (aposentados). Entre elas, foram definidas regras sobre o uso privativo dos uniformes, insígnias, distintivos e porte de arma.
Além disso, o projeto garante que cônjuge ou dependente de PM’s e bombeiros recebam pensão militar do ativo, da reserva ou reformado correspondente ao posto ou patente que era ocupado. O valor será proporcional ao tempo de serviço. Um auxílio-funeral por morte do cônjuge ou dependente também está previsto no texto.
Competências
O texto também define as competências de órgãos e instituições municipais de segurança pública. É especificado, por exemplo, o Corpo de Bombeiros Militar fará a perícia após o local de incêndio ser liberado pelo perito criminal. Além disso, subsídios devem ser fornecidos subsídios para o sistema de segurança contra incêndio e verificar o cumprimento ou não das normas técnicas vigentes.
Uso da força
Segundo o projeto, agentes de segurança pública devem praticar uso comedido e proporcional da força, conforme definido por documentos internacionais de proteção aos direitos humanos que o Brasil assinou. O texto prevê que este ponto seja incluído como princípio da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social.
Manifestações políticas
Mesmo que proibidos de se filiarem a partidos políticos e sindicatos, policiais militares poderão ir armados à eventos político-partidários, desde que estejam fora do horário de serviço
No entanto, apesar de liberar eventos, o texto da proposta veta a participação em manifestações públicas portando arma ou uniforme, mesmo que no horário de folga.
Os policiais e bombeiros também não poderão manifestar publicamente ou em suas redes sociais opiniões sobre política, usando a farda, a patente, graduação ou o símbolo da instituição. Também serão vedados os usos de imagens que mostrem qualquer recurso que identifique vínculo com a instituição militar.
Militares na reserva remunerada continuarão podendo manifestar suas opiniões políticas livremente, conforme definido na Lei 7.524, de 1986.
Requisitos
O texto ainda define requisitos para que profissionais ingressem nestas carreiras. O candidato não pode ter antecedentes penais dolosos incompatíveis com a atividade, definidos pela legislação de cada unidade federativa.
Além disso, o interessado deverá ser aprovado em exame de saúde e toxicológico e não pode ter tatuagens visíveis que façam alusão de suásticas, obscenidades, ideologias terroristas, que façam apologia à violência ou às drogas ilícitas, ou à discriminação de raça, credo, sexo ou origem.
Mulheres
As corporações deverão reservar um mínimo de 20% das vagas dos concursos públicos para mulheres.
Registro de armas
Segundo o projeto, as armas de fogo institucionais das polícias militares e corpos de bombeiros militares deverão ser cadastradas no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma). As armas particulares de policiais militares e bombeiros que constem dos seus registros próprios também serão registradas no Sigma.