Livro de Amara Moira fala sobre prostituição e readequação de gênero

Travesti e escritora terá conteúdo da publicação debatido nesta quarta-feira (28), no clube de leitura Leia Mulheres

Amara Moira, escritora - Guilherme Santana/Divulgação

“E se eu fosse puta” é um tapa na cara só por existir. Ao tirar este livro da bolsa, especialmente em locais públicos, como no ônibus, é possível sentir um rebuliço entre aqueles que lêem o título. Comentários e olhares mal disfarçados surgem só com a referência à prostituição. A profissão mais antiga do mundo nunca encontrou consenso. O que se pode fazer com esta realidade que tentam o tempo todo ocultar?

Durante toda a narrativa, a travesti doutoranda e escritora Amara Moira dirige seus relatos ao pronome você, estabelecendo um diálogo, lembrando que escreve para ser lida, escreve para quem a lê, para o você que olha através das cortinas das páginas o mundo à margem da prostituição e da readequação de gênero.

Temas que sozinhos são problemáticos e, combinados, se potencializam. O livro será debatido hoje, no Edifício Texas, no bairro da Boa Vista (Rua Rosário da Boa Vista, 163), às 19h30 em mais uma edição do clube de leitura Leia Mulheres.

Amara não escreve ficção. Militante assumida, elas nos conduz por suas memórias desde sua primeira experiência nas ruas, seus momentos de indecisão em aceitar a profissão que lhe parecia uma das poucas possíveis após se assumir travesti. Em palestra num dos eventos livres do TED em Volta Redonda (RJ), ela aprofunda ainda mais essa questão. Estudante de Letras, com dois anos de curso ela foi contratada por um colégio enquanto ainda se identificava como homem perante a sociedade.

Dez anos depois, dois anos e meio após pedir para ser chamada de Amara, em curso de doutorado na Universidade de Campinas (Unicamp), as portas das salas de aula lhe parecem vedadas. “A forma como a sociedade entende travestis e transexuais que faz com que a gente seja reduzida a nada, que faz com que a gente só possa ocupar as margens, ocupar esses lugares que a gente não considera nem lugares”, afirma. Amara encontrou a possibilidade de dar aulas em cursinhos pré-vestibulares, único local atualmente aberto mais a capacidade que aos padrões.

Na narrativa ela remonta o tratamento dado a ela pelos clientes antes e depois do programa. As promessas de amor e como elas se transformam após o gozo. Ela descreve os abusos, a pechincha pelos preços, os locais de trabalho. Vai além, mergulha nos próprios preconceitos, nas origens do prazer e nos padrões sociais e de beleza, sua percepção sobre o sexo, o amor, e o respeito. Três elementos desvinculados que desejamos unificar. Vai construindo com o leitor que se permitir a viagem crua e carregada de gírias.

Escrita em meio a própria vivência do fato, no auge da memória, o livro também faz a vez de diário, inicialmente online. O processo analítico traz as mudanças da própria personagem, pessoa verídica que se autodesconhece, que muda e se reencontra, numa dança inebriante ao olhar. Nem tudo será entendido de primeira, mas o convite a reflexão é bem feito. “Quanto vocês saberiam da vida por trás dos panos da profissão mais malfalada do mundo não fosse por mim?”, questiona no texto.

Serviço:

"E se eu fosse puta?", de Amara Moira
Hoo Editora; 210 páginas
R$ 35

Debate sobre o livro:
Hoje, às 19h30
Edifício Texas (Rua Rosário da Boa Vista, 163, Boa Vista)