O Emplasto Brasil!

 

 

 

 

 

 

 

 

Sempre que a melancolia, ou a tristeza, resolvem fazer visita, socorro-me de livros, ou ao menos de pequenas partes deles, para tentar buscar alguma espécie de cura. A leitura termina por diminuir o peso desses pensamentos, mas, depois carregam-me outros, que se fixam, e numa espécie de mimetismo com a angústia anterior, tornam-se belas “Crisálidas” em busca de alçar voo.

O Brasil tem me deixado assim, faz tempo. Somos um conto machadiano, um breve conto, que a cada quatro anos afigura-se como novo, a despeito da recorrência temática, enfadonha e bolorenta. Nesse conto não há distinção de jovem e velho, há, de fato, um único “etarismo” no homúnculo que assombra o país. Todos eles, além de “calçar quarenta”, têm a mesma estatura. A estatura da conveniência. Se o “pórtico” é alto, todos chegam a dois metros de altura; se é muito baixo, um metro e cinquenta é suficiente.

O pior é que essa configuração vai se tornando a régua da Nação. Conheço poucos, muito pouco mesmo, nesse rincão, que conseguem ser o que são, sem abrigar-se apenas em suas “convicções” de ocasião para sugerir algo “particular” ou “sincero” a todos. Não há, acreditem. Esse lastro está abrigando todo sos poderes da nação; se antes afeto somente aos políticos, agora, do porteiro do prédio ao mais alto “scholar”, do bedel ao bacharel, do réu ao juiz, do goleiro ao centroavante, do ponta-esquerda ao direita, do feirante ao megaempresário, do coaching ao empreendedor, do ateu ao místico, do privado ao público, do estudante ao professor, do cachacista ao maconhista, do abstêmio ao boêmio, todos, absolutamente todos, estão medindo a mesma altura e calçando o mesmo sapato.

A falta de indignação do povo brasileiro é algo “bovino”. É como se todos, em torpor de éter, continuassem acrescentando “sulcos” de novas histórias às histórias anteriores, e esses mesmos sulcos fossem desfazendo o que antes se firmou, no que vai tornando a existência uma espécie de mesmice de um “eterno novo”, que de novidade só tem o esquecimento do passado como técnica de sobrevivência. A melhor delas, diga-se de passagem, pois não se trata do esquecimento puro e simples, mas, no mais das vezes, da reconfiguração do passado como estratagema de modelar a conveniência do presente é imputar sempre a algum outro, o problema que é seu. Diante disso, resolvi empreender! Virei empreendedor para tentar quitar minhas dívidas, que não são poucas, envolvendo até amigos! Como Brás Cubas, e na onda da inovação que assola a grande salvação nacional, estou patenteando o “Emplasto Brasil”.

O “Emplasto Brasil” não somente vai permitir que afastemos essa nossa melancolia, mas permitirá que você consiga, meu caro brasileiro, ganhar imediatamente o mesmo que qualquer alto funcionário público brasileiro ganha! Sim, a ideia é revolucionária. Se o seu problema é renda, não se incomode, o “Emplasto Brasil” vai lhes permitir, quase que instantaneamente, obter renda para aquisição de casa própria, viagens ao exterior, vinhos das melhores cepas, além, claro, de sua boa cerveja. Escola de qualidade, ora pois, absolutamente todos estarão com a formação e a escolaridade garantidas. Uma simples aplicação do “Emplasto Brasil” vai diminuir os juros bancários, um dos maiores do mundo, mas que depois do “Emplasto Brasil” serão quase negativos, e você poderá empreender livremente.

Com o “Emplasto Brasil”, político corrupto faz a “autodelação” “não premiada”. É algo divino e maravilhoso; bastam duas aplicações para que o cidadão confesse publicamente o ato, sendo que, neste caso, deve ser aplicado também aos que oferecem a denúncia e aos que julgam, para que não possam rever o mesmo ato necessário para a aplicação do Emplasto e, compulsoriamente, soltar a pessoa “autodenunciada”. Com o Emplasto Brasil, todos amam a democracia sem defender qualquer ditadura, e político, quando entende que não está conseguindo gerir bem, pede automaticamente exoneração do cargo e solicita sua própria inelegibilidade.

E não para por aí! O “Emplasto Brasil” tem efeitos colaterais positivamente surpreendentes: elimina filas em hospitais, converte jeitinhos em meritocracia, e transforma até os famigerados “gatos” na rede elétrica em generosos descontos na conta de luz. Uma aplicação e puf! Todos se tornam pontuais, honestos e, veja só, produtivos!

Portanto, caro leitor, se a tristeza e a melancolia resolverem fazer-lhe uma visita, não se desespere. Lembre-se do Emplasto Brasil, essa panaceia moderna e disruptiva que transformará a melancolia nacional em um arco-íris de oportunidades, conveniências e amenidades. Afinal, se é para viver em um eterno conto machadiano, que seja com um toque de humor e a certeza de que, ao menos no papel, seremos todos gigantes – ainda que seja no tamanho do sapato e na estatura da conveniência.

*Advogado e Especialista em Transformação Digital.