Voos comerciais desviam percurso após China realizar exercício militar de última hora em mares
Operação marca raro caso em que tais exercícios são relatados longe do território chinês
Ao menos três voos comerciais desviaram seu curso nesta sexta-feira depois que navios de guerra da Marinha chinesa realizaram um aparente exercício com munição real no Mar da Tanzânia, entre Austrália e Nova Zelândia.
As manobras aconteceram em águas internacionais e dentro da lei, mas causaram uma "perturbação significativa" porque foram avisadas em cima da hora, segundo autoridades militares australianas. A operação marca um raro caso em que tais exercícios são relatados longe do território chinês, em um sinal de que Pequim está projetando seu poder militar mais profundamente na região do Indo-Pacífico.
De acordo com o jornal britânico Guardian, a Marinha chinesa notificou o Departamento de Defesa australiano pouco antes do exercício nesta sexta-feira.
O grupo de embarcações conhecido como Taskgroup 107 — do qual fazem parte a fragata Hengyang da classe Jiangkai, o cruzador Zunyi da classe Renhai e o navio de reabastecimento Weishanhu da classe Fuchi — estavam a cerca de 340 milhas náuticas de Eden, na costa sul de Nova Gales do Sul, em águas internacionais.
A flotilha estava sendo acompanhada por um navio da Marinha da Nova Zelândia, que observou o exercício. Os navios mudaram de formação e colocaram um alvo na água, manobraram novamente e, em seguida, recuperaram o alvo. Não foi observado fogo real, mas a mudança de formação foi consistente com um exercício envolvendo munição verdadeira. Entende-se que não houve disparos terra-ar.
O primeiro-ministro da Austrália, Anthony Albanese, foi questionado sobre seu nível de preocupação, mas disse que a atividade era consistente com a lei internacional e que os chineses haviam avisado sobre o exercício e sobre o uso potencial de munições reais.
— Está fora da zona econômica exclusiva da Austrália — afirmou. — Os navios e aeronaves da Austrália e da Nova Zelândia têm monitorado a frota chinesa enquanto ela viaja pela costa da Austrália, como seria de se esperar que fizéssemos.
As Forças Armadas da China mantêm em segredo o local de seus exercícios de fogo real, com um relatório militar chinês na quinta-feira dizendo que o Exército de Libertação Popular estava realizando essa operação em “uma determinada área marítima”.
A Austrália solicitou à China, por meio dos adidos de Defesa em Canberra e Pequim, mais informações sobre as manobras e planos para outras iniciativas do tipo, depois que suas Forças Armadas australianas consideraram que o exercícios causou uma "perturbação significativa" por ter sido realizado em cima da hora, embora tenham admitido que não representou um risco elevado para os usuários do espaço aéreo.
Os exercícios parecem estar em desacordo com os esforços recentes do presidente chinês, Xi Jinping, para diminuir as tensões diplomáticas com os aliados dos EUA a fim de se proteger contra a turbulência econômica trazida pelo retorno de Donald Trump. Os laços entre Camberra e Pequim se aqueceram nos últimos três anos, levando a China a remover as restrições comerciais impostas após uma disputa sobre o apoio da Austrália a uma investigação sobre as origens da Covid.
Os motivos da China podem estar ligados às repetidas operações de livre navegação realizadas pela Austrália no Mar do Sul da China, bem como à navegação pelo Estreito de Taiwan em 2024, disse Euan Graham, diretor interino de Estratégia de Defesa e Segurança Nacional do Instituto Australiano de Política Estratégica, à Bloomberg.
— Um elemento será demonstrar à Austrália que, se vocês se aproximarem de nós, também poderemos nos aproximar de vocês e em maior número — acrescentou, chamando as ações de “deliberadamente perturbadoras”.
No início deste mês, a Austrália acusou a força aérea chinesa de uma “interação insegura e não profissional” com uma de suas aeronaves militares sobre o Mar do Sul da China, onde Pequim tem disputas territoriais. O Ministério das Relações Exteriores da China rejeitou essa acusação, dizendo que o avião australiano “invadiu deliberadamente o espaço aéreo da China”.
Um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China disse em uma reunião regular em Pequim nesta sexta-feira que os exercícios militares desta semana foram realizados de forma segura, de acordo com o direito internacional, informou a Agence France-Press.
A Airservices Australia, principal provedor de serviços de navegação aérea civil do país, estava fornecendo orientações diretamente aos pilotos no Mar da Tanzânia por rádio nesta sexta-feira.
“A Autoridade de Aviação Civil e a Airservices Australia estão cientes de relatos de disparos em águas internacionais”, disse um porta-voz. “Como precaução, avisamos as companhias aéreas com voos planejados na área. Também estamos trabalhando juntos para coordenar as orientações aos operadores e pilotos.”
A zona de proteção do espaço aéreo — 18 km ao redor das embarcações chinesas e até 45 mil pés — permaneceu inalterada.
O ex-presidente dos EUA, Joe Biden, garantiu uma convergência entre os Estados Unidos e seus aliados na região da Ásia-Pacífico nos últimos anos ao considerar a China como uma questão de segurança, deixando Pequim isolada regionalmente. As ameaças de Trump de reivindicar território dos principais parceiros de segurança dos EUA e impor tarifas sobre eles correm o risco de fraturar essas parcerias.
A ministra das Relações Exteriores da Austrália, Penny Wong, disse que conversaria com autoridades chinesas, inclusive com seu homólogo, o ministro das Relações Exteriores Wang Yi, sobre o “aviso prévio e a transparência” em torno dos exercícios realizados na costa da Austrália, “particularmente os exercícios de fogo real”.
A força-tarefa militar chinesa nas proximidades da Austrália notificou na manhã desta sexta-feira que pretendia realizar um exercício de fogo real, de acordo com uma autoridade que pediu para não ser identificada, pois a pessoa não estava autorizada a falar publicamente. Não está claro se a Austrália foi informada diretamente ou se foi um aviso geral aos navios e aviões próximos.