CINEMA

Pierce Brosnan diz que "sexo e amor" explicam sucesso de James Bond e comenta venda da franquia

Ator, que estrela a série 'Mobland', do Paramount+, e o novo filme de espionagem de Steven Soderbergh, 'Black Bag', esbanja carisma e não se importa ao ser chamado pelo nome do personagem de '007'

Pierce Brosnan - Reprodução/Instagram @piercebrosnan

No último dia de março, no Museu Solomon R. Guggenheim, em Manhattan, fãs abordavam o ator Pierce Brosnan a cada poucos minutos. Alguns o chamavam de Sr. Brosnan, outros de Sr. Bond, referência aos quatro filmes de James Bond que ele fez nos anos 1990 e início dos anos 2000. (Brosnan tem um rosto que exige tratamento formal.)

Vestido com um monocromático chique — sobretudo marinho, calça marinho, um ascot marinho no pescoço sobre uma camisa marinho —, ele foi gentil com todos, embora levemente evasivo. (E sim, ele é um dos raros homens que ficam plausíveis com um ascot.) Aos 71 anos, ele raramente se mostra por completo. As pessoas veem o que querem. Na maioria das vezes, veem Bond.

— Elas perdem muita coisa — disse ele. — Mas não cabe a mim mostrar muita coisa. Não cabe a mim fazer nada além de ser agradável.

 

Sempre houve mais em Brosnan do que o que se vê à primeira vista, embora o que se vê à primeira vista seja obviamente muito bonito.

— Ele é muito sortudo no departamento genético — disse Tom Hardy, seu colega de elenco na nova série de gângsteres da Paramount+, “MobLand”. Brosnan se refere a tudo isso como “a alquimia celta”.

Pintor de longa data e entusiasta das artes, Brosnan considera “Thomas Crown – A arte do crime”, um filme de roubo de arte de 1999, como seu filme favorito, principalmente porque pôde ficar com as pinturas. Então, quando compromissos promocionais o trouxeram a Nova York — ele divide seu tempo entre Malibu e Havaí —, ele aproveitou para visitar um museu.

Ao chegar, descobriu que a espiral do Guggenheim estava fechada para montagem. (“Isso é chato,” disse ele suavemente no balcão de ingressos.) Ele se contentou com as obras em exibição. “Adoro cor,” disse Brosnan, admirando algumas telas da pintora brasileira Beatriz Milhazes. “Exaltante. Cativante.” Sua fala tem um lirismo casual — ele raramente usa um adjetivo quando pode usar dois ou três —, mas parecia sincero.

Em sua carreira de ator, a paleta de Brosnan tem sido bastante específica.

— Isso tem feito parte da minha história como ator — disse ele. — Ao interpretar o herói, o homem misterioso, o homem em quem se confia.

Mas seus papéis mais recentes (e alguns anteriores: “Matador em conflito”, “O alfaiate do Panamá”) complicam essa persona. Conrad, o chefe do crime que ele interpreta em “MobLand”, esconde brutalidade sob seu figurino cavalheiresco. Arthur, o chefe de espionagem britânico que ele encarna no elegante thriller de espionagem de Steven Soderbergh, “Black bag”, atualmente nos cinemas, também tem suas complicações. E ainda assim, Brosnan é e sempre será Bond.

— Você realmente não pode fugir disso — disse ele.

O que explica, ao menos em parte, por que, meia hora após sua chegada, Naomi Beckwith, curadora-chefe do Guggenheim, apareceu para lhe oferecer um tour pela montagem em andamento. Em seguida, ela o apresentou ao artista por trás da exposição, Rashid Johnson.

— Sou seu fã — disse Johnson. — Você foi o meu Bond.

Eles conversaram sobre arte por um tempo. Em 2023, Brosnan, que trabalhou como artista comercial na adolescência, teve sua primeira exposição, “So many dreams”, em uma galeria de Los Angeles. Ele disse a Johnson o que gostava na pintura em comparação com a atuação:

— A inocência de tudo e a ausência de expectativas — disse ele, que se despediu. — Seja ousado — incentivou Johnson.

Ao sair, Brosnan admirou um Pierre Bonnard, um Paul Cézanne, vários Picassos. Identificou um Wassily Kandinsky do outro lado da sala. “Dá vontade de pintar,” disse. Ele tem fantasias de se mudar para Paris e ser aprendiz de algum artista em um ateliê. Mas ainda não está pronto para abandonar a atuação.

— É uma droga agora — disse ele. — Eu preciso disso.

Embora Brosnan seja frequentemente muito engraçado (“Ele tem um senso de humor afiado”, disse Hardy), não ficou claro se ele estava brincando.

Certamente ele ainda não parou. Filmou seu papel em “Black bag” durante uma breve pausa de outro filme, “Giant”. Começou a trabalhar em “MobLand”, no qual contracena com Helen Mirren, logo após terminar o longa “The thursday murder club”, também com Mirren.

“Black Bag” o leva de volta ao serviço secreto. Seu personagem é um mestre-espião de motivação oblíqua. O filme presta homenagem aos clássicos da espionagem, o que tornou Brosnan uma escolha atraente para o papel.

— Há uma cumplicidade compartilhada com o público que é muito prazerosa, um segredo em comum — disse Soderbergh.

Brosnan também sabe disso.

— Confiaram em mim para atrair o público, envolver o público e depois desmontar essa persona — disse ele. (Uma desconstrução a mais: ele pediu a Soderbergh uma leve prótese para o nariz, que deixa seu rosto mais anguloso.)

Ele faz um jogo parecido em “MobLand”, criada por Ronan Bennett (“Top boy”) e dirigida em parte por Guy Ritchie. Conrad parece o cavalheiro consumado, mas não hesita em chutar um homem caído — ferido e sangrando pela boca. Como diz sua esposa, Maeve (Mirren), ele é, sob seus tweeds elegantes e Barbour, “um assassino irlandês frio como pedra.”

A interpretação de Brosnan torna essa brutalidade envolvente.

— Ele tem o que chamam de ‘encanto’ — disse Hardy. — Ele enfeitiça o ambiente.

Isso também é verdade fora das telas. Sua gentileza é pródiga, sem esforço. Durante nosso tempo juntos, ele segurou portas; ajudou-me com o casaco; me chamou de querida. Eu sabia que estava sendo encantada. Estava indefesa diante disso. Passar essas horas com ele foi como ser atropelada por um caminhão de carisma puro.

E claro, eu também amo Bond. Quando me perguntei em voz alta por que alguém como eu, que geralmente não gosta de filmes cheios de armas, se sentia tão atraída pelo personagem, Brosnan me olhou com ironia.

— Sexo — disse ele. — Sexo. Sexo. Sexo. Amor. Luxúria. Desejo. Sexo. É só isso. Aceite. Aproveite. Não se preocupe.

(Perguntado sobre a venda da franquia Bond para a Amazon, no início deste ano, ele foi mais cauteloso: “Desejo-lhes o melhor.”)

Essa versão de Brosnan — o figurino bem cuidado, o modo como pediu educadamente que esfriassem seu Chablis do almoço (“Coloque um bom gelo, por favor,” disse ele) — parecia autêntica.

— Adoro roupas; adoro estilo — disse ele. — Adoro a beleza da vida, dos homens, das mulheres. A arte da vida, isso me alimenta.

Mas também é uma pose que ele aperfeiçoou ao longo dos anos, enraizada ao menos em parte em uma infância na Irlanda que incluiu o abandono do pai e uma longa separação da mãe.

— Eu queria ser artista; queria ser pintor — disse ele. — Não tinha qualificações. Estava realmente em desvantagem, sem mãe, sem pai.

Mas essa liberdade lhe permitiu criar, disse ele, “essa persona para mim chamado Pierce”, que ficou ainda mais refinada com a riqueza, a fama e a realização de suas aspirações artísticas.

Pierce é, talvez, seu maior papel, e ele tem pouca ambivalência em relação a isso ou à celebridade que isso lhe proporcionou.

— Eu desejei isso; eu quis isso — disse ele. — Então eu sigo com isso.

Ainda assim, ele admitiu, estava ansioso pelo fim da semana, quando poderia ser ele mesmo, sem se mostrar. Mas o que ele mostra, pessoalmente e nas telas, é o suficiente. Para ele, e talvez para todos nós.

— Vou continuar interpretando enquanto durar — afirmou. — Isso me trouxe até aqui. Vou seguir em frente.