Greve geral contra Milei tem adesão parcial na Argentina
Paralisação é a terceira que o governo enfrenta
O governo do presidente Javier Milei enfrenta uma batalha contra os sindicatos argentinos, com mais uma greve geral convocada pela Confederação Geral do Trabalho (CGT) nesta quinta-feira, enquanto seu governo aguarda um crédito do Fundo Monetário Internacional (FMI) para sustentar seu plano econômico.
A paralisação é a terceira desde que o líder ultraliberal assumiu a Casa Rosada em dezembro de 2023 e marca uma deterioração no clima social após dezenas de milhares de demissões e 15 meses consecutivos de queda no consumo. Sua adesão, porém, foi parcial.
Bancos, escolas públicas e privadas, hospitais e todas as repartições públicas amanheceram fechados. Mais de 250 voos nacionais e internacionais também foram cancelados, devido à adesão do pessoas de terra nos aeroportos. Mas muitas empresas abriram suas portas e trabalhadores autônomos saíram de suas casas para ganhar o dinheiro do dia.
Sem trens ou metrôs operando, a paralisação está sendo fortemente sentida nas ruas, onde longas filas para pegar ônibus se formaram logo pela manhã e carros e motos particulares encheram as avenidas. Ao contrário das greves de janeiro e maio do ano passado, o principal sindicato dos motoristas de ônibus não aderiu à medida, pois foi obrigado a trabalhar devido a uma conciliação obrigatória emitida pelo Ministério do Trabalho em uma ameaça de greve anterior.
— Este será o terceiro ônibus que pegamos hoje, e todos para chegar [ao bairro] La Boca — disseram a faxineira Natalia Aranda e o pedreiro Juan Molinari ao jornal argentino La Nación. — Entendemos que há coisas erradas no país, mas não temos dinheiro suficiente para sustentar isso. Não podemos parar. Hoje já gastamos mais do que havíamos planejado. O café da manhã será um sanduíche compartilhado no ônibus, para que tenhamos dinheiro para o almoço.
Uma mulher de cabelos curtos e jaqueta preta levantou a voz enquanto atravessava a fila no ponto de ônibus:
— Essas pessoas são preguiçosas! É sempre a mesma coisa! Eu tenho que ir trabalhar, quem me paga o dia se eu não chegar? Ninguém! — declarou ao La Nación. — Eu nunca paro, sabe? Eu trabalho na limpeza de uma casa a partir das cinco da manhã. Levanto às três horas todos os dias, e agora? Por que tenho que ficar aqui na chuva esperando um ônibus que nem sei se vai passar? Aqui há pessoas que não têm alternativa. Se não trabalharem, não comem. E eles, os que fazem greve, vão para casa tranquilamente. Ninguém pensa em nós que não temos um salário fixo ou um sindicato.
A ação sindical de 36 horas começou na quarta-feira com uma manifestação em frente ao Congresso para acompanhar a marcha semanal dos aposentados, os mais atingidos pelos cortes de Milei, e continuou com a greve que durará até a meia-noite de sexta-feira.
— A greve é maciça, todos os escritórios estão fechados — disse Rodolfo Aguiar, secretário geral da Associação dos Trabalhadores do Estado, à estação de rádio La Red. — É a medida de força mais consensual em rejeição às políticas do governo nacional.
A estatal Aerolíneas Argentinas, a principal companhia aérea do país, informou que 20 mil passageiros foram afetados pelo cancelamento de 258 voos, 17 deles para rotas internacionais, o que representa um custo estimado de US$ 3 milhões para a empresa.
— Essa greve foi na quarta-feira, mas esse presidente deveria sair imediatamente, a verdade é que é uma vergonha — disse à AFP Gustavo Cortez, de 48 anos, que teve que viajar duas horas de ônibus para chegar ao trabalho.
Na quarta-feira, a Casa Rosada minimizou a greve, que descreveu como “política” e que acredita que “exporá a casta”, o termo usado por Milei para rotular aqueles que se opõem às suas políticas. O chefe de Gabinete, Guillermo Francos, fez uma ameaça velada aos sindicatos ao antecipar uma reforma da lei trabalhista para tornar o mercado de trabalho mais flexível:
— Temos certeza de que as pequenas reformas trabalhistas que fizemos ainda não são suficientes para resolver as dificuldades geradas pela lei de contratos de trabalho na Argentina — afirmou.
A greve deixa o governo na expectativa depois que o Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou na terça-feira que o acordo técnico com a Argentina, no valor de US$ 20 bilhões (R$ 121 bilhões), está pronto para ser examinado pela diretoria do organismo multilateral “nos próximos dias”.
Por meio da contenção dos gastos públicos, o presidente reduziu a inflação de 211% em 2023 para 118% no ano passado, o que contribuiu para que a pobreza voltasse aos níveis de 2023 (38%), depois de tê-la levado a 52,9% na primeira metade de seu governo.