ressurreição

Páscoa: veja como a celebração é tratada em diferentes religiões

Festa tem origem judaica e surgimento anterior ao Cristianismo

Gilbraz Aragão, coordenador do Observatório das Religiões da Unicap - David de Queiroz/Folha de Pernambuco

A Páscoa é uma comemoração religiosa, de origem judaica e surgimento anterior ao Cristianismo, que retrata a data da ressurreição de Jesus Cristo, três dias após a crucificação. Uma celebração com diferentes interpretações ao redor do mundo, desde festividades específicas até adaptações culturais com um olhar único para o marco histórico.
 

Cristianismo
A Páscoa é comemorada no primeiro domingo após a primeira lua cheia que ocorre no início da primavera (no Hemisfério Norte) ou outono (no Hemisfério Sul)
, estabelecida pelo cálculo do Concílio de Niceia (325 d.C.). Não há uma data específica, mas ela é celebrada normalmente entre os dias 22 de março e 25 de abril. Em 2025, é neste dia 20 de abril.

“A celebração lembra libertação e ressurreição, crenças que unem judaísmo, cristianismo e islamismo, que são as religiões mais novas e que se tornaram as maiores do mundo, desenvolvidas no Oriente Médio a partir do Êxodo, do movimento de Moisés”, afirmou Gilbraz Aragão, coordenador do Observatório das Religiões da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap).

No Cristianismo, a Páscoa é precedida pela Semana Santa, que relembra os últimos dias de Jesus, incluindo a Última Ceia, a Crucificação (Sexta-feira Santa) e a ressurreição, no domingo.

Dom Paulo Jackson, arcebispo da arquidiocese de Olinda e Recife

"Os judeus celebravam a libertação da escravidão do Egito. Nós celebramos Jesus Cristo, que passou pela morte. Sendo o Deus da Cruz, é também o Deus da Ressurreição. Por suas chagas fomos curados, libertos do pecado. Ele desceu à mansão dos mortos, mas o sepulcro está vazio, com os lençois de linho revoltos ao chão porque Ele ressuscitou. É esta experiência que os católicos têm na Semana Santa, na Páscoa: uma nova vida, para um mundo novo e melhor", frisou Dom Paulo Jackson, arcebispo da arquidiocese de Olinda e Recife.

No catolicismo há tradições litúrgicas com missas e procissões, contando desde o período da Quaresma (40 dias antes da Páscoa). Já a Igreja Ortodoxa celebra a festa em uma data diferente - ela não segue o calendário Gregoriano, mas sim o Juliano (com diferença de 13 dias para o outro). A Páscoa ortodoxa deve sempre ocorrer depois da Páscoa judaica.

Para comunidades evangélicas neopentecostais e para os protestantes, a Páscoa é uma “história de redenção”, celebrando a ressurreição. Diferente dos católicos, por exemplo, não há restrição ao consumo de carne, tampouco celebração da Quaresma.

Judaísmo
A Páscoa tem origem na religião judaica. A tradição rabínica lembra uma antiga festa de primavera, em que os pastores ofertavam a Deus um cordeiro como agradecimento pelo rebanho. Ao se tornarem também agricultores, os descendentes de Abraão consumiam toda farinha e fermento em festa no dia anterior à colheita do trigo, porque acumular alimentos é sempre começo de injustiça. Daí o primeiro pão de trigo novo não era fermentado”, citou Aragão.

“Quando o povo judeu foi libertado da escravidão no Egito, guiado por Moisés, esses rituais se uniram na ceia familiar de Pessach (Páscoa Judaica), cujos pratos principais são o cordeiro e o pão sem fermento, lembrando agora a pressa na fuga e a proteção divina na passagem para a liberdade”, completou.

Islamismo e Espiritismo
Os muçulmanos não comemoram a Páscoa por não acreditarem na ressurreição de Jesus como um “evento divino”
. Por mais que seja citado em diversas passagens do Alcorão, Cristo não é considerado filho de Deus no Islamismo, apontando que ele, chamado de Isa, foi elevado aos céus por Alá, para retornar no fim dos tempos.

Para o Islamismo, o período mais sagrado é o Ramadã, no nono mês do calendário lunar, durando 29 ou 30 dias. Os muçulmanos se abstêm de comer, beber, fumar e manter relações sexuais desde antes do nascer do sol até o pôr do sol, celebrando o momento em que na visão deles o profeta Muhammad recebeu a revelação do Alcorão do anjo Gabriel. Ocasionalmente, a Páscoa cristã pode coincidir com o Ramadã.

“Trata-se de uma fé vinculada à luta histórica pela terra (com a sedentarização deflagrada pela agricultura) e à experiência de Deus como uma ‘Força dos Céus’ que promete a ‘terra onde corre leite e mel’ e faz aliança para dar justiça ao povo e a pessoa que cumpre a sua lei de misericórdia. No Dia de sua Ira, então, Deus virá julgar os vivos e os mortos - que terão a sua ‘carne’ pessoal ressuscitada”, explicou o coordenador.

Doutrina religiosa, filosófica e científica que surgiu na França no século XIX, por meio do pedagogo francês Allan Kardec, o espiritismo não comemora a Páscoa. A Bíblia, no espiritismo, por exemplo, é considerada uma obra que registra o fundamental da passagem de Jesus Cristo, mas quem segue a religião não acredita em profecias, vendo a ressurreição de forma espiritual e não física.

Testemunhas de Jeová e Budismo
As Testemunhas de Jeová não celebram a Páscoa, considerando que “Jesus mandou relembrar seu falecimento, não sua ressurreição”
. Em compensação, comemoram a “Ceia do Senhor”, chamada também de "Refeição Noturna do Senhor" ou "Memorial da Morte de Cristo". Acontece uma vez por ano, seguindo o calendário judaico, geralmente no dia correspondente ao 14 de Nisã (data bíblica que comemora a Páscoa judaica e a instituição da Ceia do Senhor por Jesus).

Apenas os "ungidos" (que receberam unção com óleo, simbolizando a presença de Deus e o seu favor) podem consumir pão e vinho. Esses (que na visão são 144 mil ao todo) governarão com Cristo no céu. Os demais (a “grande multidão”, que viveria na Terra após o Armagedom) assistem à cerimônia como observadores, que ocorre em locais sem imagens ou decorações religiosas.

No budismo, não há também celebração da Páscoa. A religião comemora o Vesak, o nascimento, a iluminação e a morte de Sidarta Gautama (Buda). A data varia conforme o calendário lunar, geralmente caindo entre os meses de abril e maio. Os budistas fazem meditações e cerimônias nos templos, além de procissões e rituais de iluminação com lanternas.

Matriz Africana
As religiões de matriz africana não possuem uma celebração específica para a Páscoa.
Ainda assim, há certo sincretismo religioso, com uma associação entre Jesus Cristo e Oxalá, orixá cultuado como o mais respeitado de todos do panteão africano. Ele é ligado à criação do mundo, paz e equilíbrio.

Algumas casas de Candomblé podem fazer rituais no período que os cristão chamam de Sexta-feira Santa. A Umbanda vê a celebração como um momento de reflexão e caridade. Há tradições que também associam elementos da Páscoa a Nanã, orixá ligada à sabedoria e ciclo da existência.

"As religiões do povos originários colocam a fé no reencontro com os antepassados pela orientação das forças da natureza ou orixás, enquanto as religiões mais orientais, como budismo e até mesmo o espiritismo, apostam na evolução através da meditação, passando por reencarnações. São matrizes religiosas diferentes daquelas religiões proféticas (judeu-cristianismo e islamismo)", apontou Aragão.